Parte significativa da sociedade brasileira parece ter sido capturada pelo obscurantismo de maneira que a indolência tem conseguido se sobrepor à busca pela verdade. Por mais aterrorizantes, contundentes e ameaçadores que sejam os fatos e as declarações, na maioria das vezes a retórica e a apatia têm prevalecido diante de versões e desmentidos que não se sustentam nem se justificam.
Coisa que lembra —e reveste de atualidade perturbadora— um dos textos filosóficos mais conhecidos da humanidade: O Mito da Caverna ou a Caverna de Platão. A metáfora criada pelo filósofo grego pode ser entendida como uma crítica a quem aceita tudo o que é posto pelo grupo dominante sem questionar a realidade. A filosofia, segundo autores clássicos, é o “amor pela sabedoria, experimentado apenas pelo ser humano consciente de sua própria ignorância”.
Considerando que a verdade muitas vezes é dolorosa, até dá para entender certos comportamentos das massas num ambiente dominado pela pós-verdade. O que não dá é para aceitar placidamente o apoio e a complacência de algumas instituições e de setores ditos esclarecidos. Temos acompanhado a falta de compromisso público com direitos constitucionais como a vida, a saúde, a educação, a cultura, a alimentação, a segurança, a moradia —que vêm sendo tratados sem a devida diligência.
O que dizer das acusações infundadas acerca da higidez do processo eletrônico de votação? Das contestações sem embasamento científico para desacreditar as vacinas em plena pandemia? Ou da intolerância religiosa, das violações ao meio ambiente, da violência exacerbada, da insensibilidade em relação aos milhares que morreram de Covid-19, da indiferença com a fome, do descaso com o racismo?
O brasileiro está diante da oportunidade de deixar a caverna. Resta saber se por medo, indiferença, egoísmo, preconceito ou ignorância (tal qual os prisioneiros do Mito de Platão) vai optar por permanecer nas sombras.