O Brasil na contramão

Avanços nos países nórdicos partiram de consensos

Por Oded Grajew, da Folha de S.Paulo 

Oded Grajew, presidente emérito do Instituto Ethos – Reinaldo Canato – 4.set.18/Folhapress

Vários países atingiram um grau de desenvolvimento que, certamente, provocam a inveja dos que acreditam que o nível de desenvolvimento de uma nação se mede pelo bem-estar de seu povo. Os escandinavos (Finlândia, Noruega, Dinamarca e Suécia), por exemplo, estão sempre entre os primeiros colocados em todas as classificações sociais, ambientais e econômicas mundiais. Eram os países mais pobres da Europa no começo do século passado. Acredito que seria bastante útil saber o que fizeram para chegar onde chegaram. Isso nos daria uma ideia se estamos no caminho certo.

Fui convidado recentemente para visitar a Suécia, quando pude entender o processo que levou o país ao estado atual. O caminho começou a ser trilhado a partir do momento em que chegaram a alguns consensos. Em primeiro lugar, acordaram que para que o país desse certo é fundamental que haja relações harmoniosas entre os cidadãos. E que, para isso, seria fundamental que houvesse sentimento de justiça, solidariedade e confiança entre as pessoas.

Todos deveriam ser incluídos na sociedade; nenhuma pessoa ou grupo deveria ser marginalizado ou discriminado. Tolerância e respeito entre os diferentes deveriam ser praticados, e a diversidade, valorizada.

O sentimento de justiça depende dos menores índices de desigualdades possíveis. Para isso, é fundamental oferecer educação púbica gratuita e de qualidade para todos —e isso vale para educação básica, superior, pesquisa e desenvolvimento científico. Seria uma maneira de dar oportunidades iguais de crescimento para todos, e o conhecimento ofereceria melhores condições de competitividade.

As políticas públicas deveriam ser instrumentos para reduzir as desigualdades. A participação da sociedade, incentivada e apoiada. É fundamental que organizações e entidades sociais participem em inúmeros conselhos temáticos e institucionais junto aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e em nível municipal, estadual e nacional.

Seria uma maneira de aperfeiçoar as políticas públicas, garantir a transparência e assegurar que as decisões possam promover a justiça social e atender ao interesse público.

A composição dos quadros políticos também deve ser um espelho da própria sociedade para que as decisões possam beneficiar a todos e, principalmente, os mais necessitados. A participação de 50% das mulheres nos cargos públicos e a criação de um órgão técnico independente, com autonomia para dar parecer sobre todas as decisões do governo do ponto de vista das desigualdades, são exemplos de regras e políticas públicas que visam contribuir para uma sociedade mais justa e sustentável.

Para estabelecer relações de confiança, a regra é transparência total. Todos os dados e informações governamentais e de empresas e indivíduos que são de interesse da sociedade são públicos. Os salários e benefícios dos políticos e dos servidores dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário são transparentes e absolutamente modestos, compatíveis com a renda da população e com as verdadeiras necessidades do exercício dos cargos.

Finalmente, os cuidados e a valorização do meio ambiente garantiriam a preservação dos recursos naturais e da vida, evitando escassez, conflitos, mitigando os efeitos das mudanças climáticas e em solidariedade às futuras gerações.

A partir desses consensos, o desenvolvimento gerou países onde, do nascimento até a morte do indivíduo, o Estado garante saúde, licença-maternidade, educação, renda mínima, seguro-desemprego, aposentadoria e outros direitos.

Os indicadores de desigualdade e criminalidade dos nórdicos são os menores do mundo. A Noruega é o país líder mundial em prosperidade e com melhor IDH do planeta; a Dinamarca é considerada a nação menos corrupta e líder mundial em performance ambiental; e a Suécia é um dos líderes globais em inovação e competitividade.

Você, leitora e leitor, acha que o Brasil está no caminho certo?

Oded Grajew
Presidente do Conselho Deliberativo da Oxfam Brasil, presidente emérito do Instituto Ethos e conselheiro da Rede Nossa São Paulo e do programa Cidades Sustentáveis

+ sobre o tema

É bem-vinda, e algo tardia, a preocupação de Lula com a inflação dos alimentos

Convém a Luiz Inácio Lula da Silva lembrar que foi levado,...

Trump suspende participação dos EUA no Conselho de Direitos Humanos da ONU

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou nesta...

Fim do trabalho escravo exige novas políticas, dizem especialistas

O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) admite que...

para lembrar

Indígenas e gays: jovens contam como é ser LGBT dentro e fora das aldeias

Grupo se reúne na UnB para debater o tema;...

A lente do comum

Ciclo aborda o tema do comum a partir de...

Quem tem medo da sociedade civil?

Quem tem poder para escrever uma declaração universal de...

Políticas antidiversidade nos EUA reacendem o alerta no Brasil

Não é mais ameaça ou especulação do campo progressista, agora é realidade. Os efeitos imediatos atingem o radicalismo máximo da extrema direita naquele que...

Protesto contra a extrema direita leva 160 mil às ruas de Berlim

"Nein, Friedrich", dizia de forma direta o cartaz. Em um fim de semana de protestos na Alemanha, o alvo preferido dos manifestantes foi Friedrich Merz, o...

Milhares protestam a favor da diversidade na Argentina

Milhares de pessoas se manifestaram neste sábado em Buenos Aires, na Argentina, em defesa da diversidade e contra o presidente Javier Milei, economista e líder da ultradireita...
-+=