O movimento negro garante humanidade para todos

Meta é construção de projeto para a sociedade, não apenas para pessoas negras e indígenas

O antirracismo é a compreensão da estrutura racista e da escravidão como uma forma de organizar as relações humanas, o acúmulo desigual e o Estado com objetivo de controlar. É a compreensão de que há um compromisso coletivo: combater o racismo e garantir humanidade para não-brancos. A questão racial é uma lente de interpretação da realidade e o antirracismo, uma responsabilidade de todos.

Esse debate é a possibilidade da construção de um projeto para todo o conjunto da sociedade e não apenas para pessoas negras e indígenas. É a possibilidade de um projeto que defenda valores de igualdade e combata os que excluem e exploram.


Em protesto contra a ação violenta da polícia na comunidade do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, o movimento negro se reúne em frente ao MASP para protestar – Bruno Santos/Folhapress

Quem deseja transformar a realidade para todas as pessoas precisa se organizar coletivamente e isso é inegável. Mas alguns modelos de organização social estão em crise, pois foram forjados para uma disputa política institucional contaminada por uma lógica de interesses econômicos para poucos.

É necessário e urgente, portanto, alterações concretas nessa estrutura institucional, que também passem por uma mudança cultural e filosófica das formas ontológicas relacionais. Mudanças essas que sejam baseadas numa lógica pautada na defesa da vida e suas diversidades.

E por falar em transformação, precisamos reverenciar os movimentos negros. Pontas de lança em reflexões fundamentais e profundas. Os maiores atacados por essas lógicas, os negros, querem falar em primeira pessoa e romper com o etnocídio. Esses sujeitos querem o que a eles pertence por direito: assumir a liderança desses processos de transformação social. Querem colocar luz sobre sua cultura, produções acadêmicas, midiáticas e visões religiosas. Querem falar por si e reverenciar suas histórias e potências.

Já a supremacia é a lógica que nos olha de cima. Uma lógica que nega inclusive que no Brasil somos a maioria e, portanto, a partir dessa negação, veta a nossa participação nos mais diversos espaços, como a mídia, política e tantas instituições. É uma lógica que nos tira o direito à voz e à vida. Mas chegou o momento de falarmos por nós, contarmos nossas histórias, recuperá-las, recriá-las. Falar por nós nos coloca no patamar de humanidade. O que é o mínimo, pois é isso que sempre fomos: humanos.

Para alcançar o protagonismo queremos unidade, alianças. Neste momento de crise civilizatória, queremos avançar nas alianças e negociações sinceras e necessárias para a construção desse projeto de garantia de humanidade, voz, direitos e vida.

Como construir esse novo projeto de sociedade baseado no protagonismo e na diversidade? Não tenho as respostas exatas, mas apostaria em algumas: vivência dos territórios e respeito às pluralidades. Aprendi com Edson Cardoso, professor, jornalista e militante do Movimento Negro desde os anos 70, que se retirarmos uma fatia de bolo, encontramos misturado todos os ingredientes das outras fatias. Por isso mantenho o pé firme no chão, sem parar de olhar para o horizonte. Como a árvore que se enraíza, se espalha, cresce em direção ao céu, dá fruto e deixa sementes.


PerifaConnection

PerifaConnection, uma plataforma de disputa de narrativa das periferias, é feito por Raull Santiago, Wesley Teixeira, Salvino Oliveira, Jefferson Barbosa e Thuane Nascimento

Wesley Teixeira

Morador da Baixada Fluminense, integrante do PerifaConnection, da Coalizão Negra por Direitos e da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito

+ sobre o tema

para lembrar

Sérgio Martins – Direito e Reverso do Direito: Uma Jornada pela Dignidade

Quando na cabeça do indivíduo brota a rejeição por...

História recente dez anos dos movimentos negros

Hamilton Cardoso Há uma década, apenas, em 1978 os movimentos...

“Não se faz revolução no conforto”, diz Antonieta Luísa Costa

Antonieta Luísa Costa, presidente do Instituto de Mulheres Negras...
spot_imgspot_img

Agentes de Pastorais Negros: entidade nacional do movimento negro brasileiro completa 41 anos

Março é o mês do aniversário dos Agentes de Pastorais Negros (APNs), entidade nacional do movimento negro brasileiro que completa 41 anos. Esse mês constitui, para os...

Jornal pioneiro contra racismo deu voz a movimento negro há 100 anos

Há 100 anos, a criação de um jornal na cidade de São Paulo deixava marcas com o pioneirismo em relatos contra o racismo e a ampliação...

Morte de jovem que marcou movimento negro ainda tem questões em aberto

Até os dias de hoje, depois de 45 anos, não se sabe o local exato em que Robson Luz foi torturado pela polícia. O...
-+=