Organizações sociais, sindicatos e pesquisadores lançam carta-denúncia do caos criado por projeto de Eike Batista

Atingidos de Conceição de Mato Dentro/MG e do Porto do Açu/SJB/RJ, pesquisadores de diversas Instituições de Ensino Superior nos Estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro, e representantes de Movimentos Sociais realizaram, nos meses de maio e agosto de 2013, o intercâmbio das resistências ao Projeto Minas-Rio, organizado pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), o Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais da Universidade Federal de Minas Gerais (Gesta/UFMG), a Universidade Federal Fluminense em Campos dos Goytacazes e Associação dos Produtores Rurais e Imóveis Município de São João da Barra – ASPRIM.

O intercâmbio possibilitou a visitados atingidos do Açu às comunidades atingidas pela mineração em Conceição do Mato Dentro e Alvorada de Minas e, em um segundo momento, a visita de representantes das comunidades mineiras às comunidades atingidas pelo Porto do Açu e demais estruturas localizadas no 5º Distrito de São João da Barra – Açu/RJ.

Após este intercâmbio, nós, atingidos, pesquisadores e lideranças dos Movimentos Sociais, na defesa da dignidade da pessoa humana, e, em especial, da garantia dos bens essenciais à vida como a água e o território, vimos a público, pela presente, denunciar os seguintes e inaceitáveis danos e violações de direitos ocorridos tanto nos municípios mineiros quanto na região do Norte Fluminense, promovida pelo empreendedor – Anglo American e LLX, – com a participação dos respectivos Governos Estaduais.

Violação do direito de liberdade de reunião, associação e expressão: durante a realização do intercâmbio, no Rio de Janeiro e em Minas Gerais, os veículos que transportavam os atingidos foram seguidos e monitorados pelos empreendedores;

Mascaramento dos impactos socioambientais: os danos e impactos ambientais provocados pelo empreendimentonos estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro foram subdimensionados ao longo dos processos de licenciamento, fracionados de forma indevida. Não constam dos EIA-RIMAs os impactos conexos mina-mineroduto-porto e os efeitos do empreendimento no estado vizinho do Espírito Santo – área costeira, poluição, óleo, poluição sonora marinha, erosão do solo marinho;

Degradação dos mananciais e cursos d’água, tornando-os impróprios para uso humano, dessedentação de animais, a pesca, e para os usos sociais, tais como plantios da agricultura familiar e recreação. No Açu, a gravíssima salinização nas águas e nas terras ameaça transformar o 5o Distrito/SJB e toda a Baixada Campista, em um verdadeiro deserto;

Não reconhecimento dos Atingidos: em Minas Gerais, empreendedor e Estado se recusam a reconhecer a amplitude do universo de comunidades atingidas, que resta indefinido no licenciamento, apesar da existência de estudo independente realizado para esse fim; no Rio de Janeiro, tampouco são reconhecidas as famílias atingidas pelos impactos gerados pela salinização;

Violação do direito de propriedade: os atingidos denunciam as pressões e formas diversas de coação a que vem sendo submetidos. Em Minas Gerais, o violento assédio a herdeiros de terras familiares deflagrou processos conflituosos e desagregadores nas famílias, agravados por práticas comointervenções não autorizadas nos terrenos. No Rio de Janeiro, são recorrentes os despejos violentos de agricultores familiares e pescadores, sem indenização e aviso prévios. Em ambos os Estados, o empreendedor derruba cercas, casas, fecha caminhos, finca placas, forçando o abandono das terras, das criações e lavouras.

Tais pressões inviabilizam o direito à justa negociação e ao tratamento isonômico, conforme critérios transparentes e coletivamente acordados;

Violação do direito de ir e vir – Em Minas Gerais e no Rio de Janeiro, caminhos seculares que interligavam comunidades foram fechados; no Açu, os pescadores se encontram impedidos de acessarem as lagoas e realizarem suas pescas durante a semana;

Violação dos direitos das comunidades tradicionais em MG e RJ: a reprodução de práticas e modos de vida tradicionais foi inviabilizada pelo empreendimento, assim como o acesso e a preservação de bens culturais. Em Minas Gerais, territórios familiares e lugares de memória foram fragmentados ou tornaram-se inacessíveis às comunidades locais; a mineração inviabilizou o turismo cultural. No Rio de Janeiro, conhecimentos tradicionais acumulados pelas famílias no cultivo da restinga foram desconsiderados, e inviabilizou-se a pesca artesanal;

Violação do direito de proteção à família e aos laços de solidariedade social e comunitária: procedimentos de negociação fundiária obscuros e violentos fragmentam as famílias, enquanto os reassentamentos já realizados não atendem à necessidade de manter os laços de solidariedade preexistentes;

Violação da dignidade e bem estar de grupos vulneráveis, com direito à proteção especial: idosos vêm sendo alvo de pressão e sujeitados a reassentamentos compulsórios que não permitem a reprodução de seus modos de vida.

Os protestos, as diversas denúncias, as sérias objeções ao Projeto Minas-Rio, já relatadas em órgãos e audiências públicas e nas instâncias administrativas responsáveis pelos licenciamentos,não têm sido suficientes para barrar a implantação desse empreendimento, que se sustenta pelo uso da violência e pela afronta às leis, aos direitos e à dignidade da pessoa humana.

Chamamos a sociedade brasileira a se indignar com essa situação de arbítrio e a aprofundar a solidariedade ativa com os agricultores e pescadores, de modo a impedir a continuação de todos esses crimes.

Assinam esta carta:

Associação dos Produtores Rurais e Imóveis do Município de São João da Barra – ASPRIM;

Atingidos pelo Projeto Minas – Rio;

Brigadas Populares;

Coletivo Margarida Alves – Assessoria Popular;

Comissão Pastoral da Terra – CPT;

Comitê Popular de Erradicação do Trabalho Escravo/NF.

Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais da Universidade Federal de Minas Gerais – GESTA/UFMG;

Grupo de Trabalho em Assuntos Agrários

Associação dos Geógrafos Brasileiros/AGB, Seção Rio de Janeiro e Niterói;

Grupo Políticas, Economia, Mineração,
Ambiente e Sociedade da Universidade Federal de Juiz de Fora – PoEMAS/UFJF;

Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas – IBASE;

Laboratório de Cenários Socioambientais da Pontifícia Universidade Católica /PUC Minas Gerais;

Mariana Criola – Centro de Assessoria Popular

Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas – MLB;

Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST

Núcleo de Estudos Rurais e Urbanos da Universidade Federal Fluminense – NERU/UFF;

Núcleo de Estudos em Estratégias e Desenvolvimento do Instituto Federal Fluminense – NEED/IFF;

Núcleo de Estudos Socioambientais da Universidade Federal Fluminense – NESA/UFF;

Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Formação Humana da Universidade do Estado do Rio de janeiro – PPFH/UERJ;

Rede Nacional de Advogado/as Populares – RENAP;

Associação dos Docentes da Universidade Estadual do Norte Fluminense – Aduenf.

 

Fonte: Brasil de Fato 

+ sobre o tema

Saúde das mulheres negras: entrevista com Maria Luisa Oliveira

Texto de Ana Rita Dutra. Realizamos este mês uma...

Onde o poder da grande mídia não chega

O acesso às novas tecnologias e as facilidades de...

O contraditório discurso da TV sobre a periferia

Fonte: PANORAMA arte na periferia -       A periferia está na...

Nota de Repúdio contra a Portaria Nº 68 que muda os procedimentos de demarcação

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) atendendo...

para lembrar

Defensoria Pública quer sede fixa no Alemão

Os recentes casos de assassinatos no Alemão, que teve...

Jovem vítima de abuso sexual recebe autorização para eutanásia

Estuprada dos 5 aos 15 anos, holandesa tinha estresse...

Violência e tensão antes da ocupação militar das favelas da Maré

O Coletivo Vinhetando publicou reportagem que ilustra como foi...

Inocente preso 19 anos por engano morre após saber que seria indenizado

Morreu no Recife, na noite desta terça-feira (22), o...
spot_imgspot_img

Notas do ‘Enem dos concursos’ saem nesta terça-feira; saiba como funciona cálculo

As notas do Concurso Público Nacional Unificado (CNU) — tanto da prova de múltipla escolha, quanto da parte escrita — estão previstas para serem...

Mulheres negras e homens brancos: as desigualdades de candidaturas e bens nas eleições

Homens brancos declararam, em média, R$ 7,3 milhões, enquanto mulheres pretas declaram R$ 848 mil em média. Apenas 4,5% das candidaturas às prefeituras de...

Outubro Rosa: mulheres têm exames gratuitos na rodoviária de Brasília

A chegada do décimo mês do ano, nesta terça-feira (1°), marca o início do Outubro Rosa, mês dedicado à conscientização da sociedade e dos...
-+=