Os antropólogos olham para a obra de Picasso. Até que enfim!

O Museu do Quai Branly, em Paris, investiga a relação do pintor com a arte não ocidental.

Por Isabel Salema Do Publico

Depois da exposição dedicada às suas esculturas, pensávamos já ter visto todo o Picasso a que tínhamos direito. Mas ainda há mais a descobrir sobre o artista espanhol. E não se trata de explorar um pormenor qualquer para conseguir milhares de visitantes nas bilheteiras. O Museu do Quai Branly, em Paris, investiga a relação do pintor com a arte não ocidental que o levou a caminhos nunca antes explorados pela arte europeia e ao nascimento daquilo que hoje conhecemos como arte moderna.

Picasso Primitivo, até finais de Julho, oferece “um olhar totalmente inédito”, diz o comunicado de imprensa da instituição, “sobre a estreita relação que une Picasso e as artes de África, Oceânia, Américas e Ásia”. Não se trata de procurar apenas “as provas de inspiração”, como se fez no passado, mas de construir uma exposição que “se apoia no ambiente criativo do artista, para depois confrontar as suas obras com as dos criadores das artes primeiras”, outro nome dado em França às colecções de arte tradicional não ocidental com origem nas ex-colónias.

Na primeira parte, a exposição monta uma cronologia de todas as relações de Picasso com este tipo de arte, mesmo antes da criação de Les Demoiselles d’Avignon, em 1906-1907, data-chave para a invenção do cubismo e da pintura abstracta. Objectos, cartas, fotografias e outros documentos, “ao longo de toda a sua vida”, compõem “uma cronologia rigorosa” daquilo que o artista pôde admirar: desde os círculos de marchands e coleccionadores até às exposições visitadas ou àquelas para onde emprestou obras.

Aos 25 anos, Picasso encontra uma máscara Fang, do Gabão, no atelier de André Derain, que a tinha comprado a Maurice de Vlaminck, um dos artistas que introduziram a arte africana na vanguarda de Paris. A máscara mostra uma simplificação do rosto humano, uma forma oval vertical com dois orifícios no lugar dos olhos e um corte no da boca.

Uma das primeiras obras compradas por Picasso é uma imagem do deus Tiki, das ilhas Marquesas (Polinésia Francesa), em 1907. É famosa a fotografia deste totem em madeira exibido ao lado de Guillaume Apollinaire, sentado no atelier de Picasso. O comissário da exposição, Yves Le Fur, conta ao L’Express como em 1963 o artista comprou, antes da inauguração, uma exposição inteira com peças da Costa do Marfim organizada por uma galeria de Cannes.

Peça a peça, “corpo a corpo” continua o comunicado, a exposição faz dialogar as obras de Picasso com as dos artistas não ocidentais. “A permanência de obras do mundo inteiro nos seus diferentes ateliers mostra como, através de uma companhia por vezes escondida, o artista manteve sempre um diálogo com elas, numa troca feita de admiração e respeito.”

Esta segunda parte, a maior da exposição, “apoia-se mais numa antropologia da arte” do que “na constatação das relações estéticas”. Apresenta-se em três partes, Aechaïsmes, Métamorphoses e Ça, os universais que Picasso tratou com respostas plásticas convergentes com as dos artistas não ocidentais. Na primeira, onde emerge a arte africana mas também a arte românica catalã, trata-se do corpo, na sua geometria e posições arquétipas, cruzado com temas como a nudez, a estilização e a verticalidade e ainda o corpo-signo. Já na que se intitula Le Ça, desenvolve-se a desfiguração, a destruição, as múltiplas aparições da máscara, as figuras híbridas e ambivalentes.

Na exposição, podemos ver o Gardien de Reliquaire, arte Fang (África) do século XIX, a virar-se para o Nu Debout de Profil, feito em 1908, ou uma estátua antropomórfica da Nigéria a enfrentar o Jeune Garçon Nu, de 1906. São centenas de peças, vindas na sua maioria do Musée Picasso, em Paris, e do próprio Quai Branly, que expõe algumas obras pela primeira vez.

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