Mauricio Ruiz procurou ajuda do Movilh (Movimento de Integração e Libertação Homossexual) antes de assumir homossexualidade em frente às câmeras
Victor Farinelli
Visivelmente nervoso, Mauricio Ruiz caminhou entre uma multidão de jornalistas concentrados em uma pequena sala para romper um tabu no Chile. Com apenas 24 anos, ele assumiu em frente às câmeras sua homossexualidade – feito inédito no país.
Ruiz tomou a decisão em abril, enquanto trabalhava ao lado dos companheiros na ajuda aos afetados pelo incêndio que abalou Valparaíso. Antes de procurar seus superiores, foi até a sede do Movilh (Movimento de Integração e Libertação Homossexual), onde recebeu apoio. “Precisava de ajuda, porque meu namorado não quis me apoiar, pois tinha medo das consequências. Mas acabou saindo tudo bem, e eu vou poder continuar na instituição”, contou.
Segundo os dirigentes do Movilh, a Marinha chilena não colocou nenhuma barreira para a permanência de Ruiz em suas fileiras. Apenas pediu que fizesse o anúncio na sede do movimento, e não em uma instalação militar. E sem uniforme. “São detalhes menores, com o tempo esperamos mudar isso também, mas foi gratificante ir com Mauricio à sede da Marinha e sentir que eles o aceitaram sem maiores resistências. Sequer precisamos insistir com a Lei Antidiscriminação”, afirmou Óscar Rementería, porta-voz do Movilh.
A reação da cúpula militar contrastou, porém, com a de alguns parlamentares chilenos. O deputado Ignacio Urrutia, do ultraconservador partido UDI (União Democrata Independente), declarou em nome da legenda seu descontentamento. “Sempre houve homossexuais nas Forças Armadas, mas não há problema quando isso é mantido em segredo”, disse. Segundo ele, agora que o caso veio à tona, “tenho certeza que gerará um grande incômodo para os seus companheiros”.
Não é a primeira vez que Urrutia gera polêmica com suas opiniões sobre a homossexualidade nas instituições militares. Em outubro de 2013, ele disse que “o dia em que tivermos batalhões de homossexuais no Exército, a Bolívia vai nos invadir e recuperar o mar”, em referência à reivindicação histórica de La Paz.
Ruiz reagiu às declarações do parlamentar. O marinheiro lembrou que seus amigos mais próximos e colegas de quartos aceitaram sem problemas sua homossexualidade.
[O deputado Ignacio Urrutia, do UDI, criticou atitude de Ruiz]
Poucos foram os casos de rechaço. Ele ressaltou que não recebeu agressões físicas, mas disse não saber se as demonstrações de homofobia foram punidas pela instituição.
Sobre a ideia de que a presença de homossexuais nas Forças Armadas seriam um sinal de debilidade, Ruiz ironizou: “um batalhão inteiro de homossexuais talvez seja um fetiche do deputado Urrutia. Um gay pode defender a soberania nacional com a mesma força e a mesma dignidade que um heterossexual”.
A história de Ruiz
Ruiz entrou na Marinha aos 18 anos, e namorava uma mulher em sua cidade natal, Chillán (400 km ao sul de Santiago). “Eu sempre senti que era homossexual, a gente sempre sente. O problema é reconhecer isso internamente. Quando eu decidi ser militar, ainda não tinha dado esse passo”, recordou.
A aceitação aconteceu quando ele já era marinheiro. Segundo Ruiz, sua ex-namorada foi a primeira a saber. “Ela chorou muito. Foi um momento muito difícil, mas também muito bonito, porque ela me disse que porque me amava muito, me aceitaria tal como sou e até hoje é uma das amigas que mais me apoia, inclusive na decisão de revelar isso para o país”, contou.
Seu namorado, o estudante Jorge Velásquez, também o apoiou, mas depois de muita resistência. “Ele tem medo de que algo aconteça comigo e eu o entendo, porque também tenho esse temor – acho que ainda tenho. Mas decidi enfrentá-lo. Ele precisou de mais tempo, mas também decidiu seguir”, explicou.
O passo final para a aceitação de Ruiz dentro da instituição será o tradicional baile que as Forças Armadas realizam em setembro, para celebrar as festas pátrias no país. “Sempre fui sozinho ao baile, mas este ano pretendo ir com meu namorado”, contou, sorrindo.
Fonte: Opera Mundi