Pesquisadora relaciona cantoras de samba a lutas do movimento de mulheres negras

A luta atual das mulheres negras contra o racismo e o sexismo deve levar em conta o que foi conquistado ao longo do tempo por outras mulheres negras ativistas, defendeu hoje (25) a coordenadora da organização não governamental (ONG) Criola, médica e doutora em Comunicação e Cultura, Jurema Werneck.

Chamadas de ialodês, essas mulheres, segundo Jurema, sempre existiram e transcendem o chamado feminismo negro – protagonizado por mulheres negras. “Hoje está difícil, mas não se compara”, disse, ressaltando que chegou ao doutorado, mas a avó dela era analfabeta e a mãe estudou apenas até o ensino fundamental.

Segundo Jurema, a luta de mulheres negras sempre existiu e as demandas foram se transformando. Nos anos 1930, 1940 e 1950, as lutas eram por educação, creches, demandas do Estado. A geração posterior, a dela, deu continuidade a essas reivindicações e conquistou leis que garantiram a igualdade de direitos. Agora, na avaliação da coordenadora, é preciso continuar lutando para que essas normas conquistadas sejam cumpridas. “O racismo não desaparece por decreto, desaparece na luta cotidiana”, argumentou.

No doutorado, a pesquisadora buscou no samba referências de luta de mulheres negras. Alcione, Elza Soares, Leci Brandão, Jovelina Pérola Negra e Mart’nalia foram algumas das citadas por ela em conferência no Festival Latinidades 2014: Griôs da Diáspora Negra. “Se se pensar em nome de mulher negra que não é anônima, vai-se pensar em nomes que estão na cultura popular”, disse. “Se o racismo é essa coisa horrível, imagina a conquista dessas mulheres para aparecerem na cena pública”, comparou.

Uma a uma, Jurema destacou na obra e na vida das sambistas aspectos que enalteciam a mulher negra e mostravam o contexto em que estavam inseridas. Elza Soares, por exemplo, surgiu como cantora em um show de calouros do programa de Ary Barroso na Rádio Tupi. Ela cantou para conseguir dinheiro para alimentar o filho e deixou claro “o planeta do qual vinha: o planeta fome”

“Se forem ler uma entrevista com a Elza Soares, todo mundo quer que ela conte essa história e sempre dizem em seguida, ‘apesar disso, ela tem força, foi longe’. Como se o problema estivesse resolvido e só ela tivesse nascido neste contexto. Tentam isolar ela da comunidade, mas todo mundo sabe que têm pessoas que tem esta carga de desafios”, diz Jurema.

De Alcione, ela destaca as letras, que falam para mulheres. Jovelina Pérola Negra colocou o próprio rosto em close, sem maquiagem e com um pano na cabeça na capa do primeiro disco, com o próprio nome. “Com quem se parece? Com minha tia, minha mãe, minha vizinha”, explicou a pesquisadora. Segundo ela, a intenção de Jovelina foi mostrar que cada uma dessas mulheres é como ela, uma pérola negra.

O Festival Latinidades 2014: Griôs da Diáspora Negra vai até o dia 28 de julho, em Brasília. Na programação estão previstos conferências, debates, lançamentos de livros, feiras, saraus e shows, além de outras atividades. A programação completa pode ser acessada no site do evento, no endereço www.latinidades.com.

Fonte: Jornal do Brasil

+ sobre o tema

Mulheres negras enfrentam barreira maior no mercado de tecnologia

O Brasil tem mais negros (56%) e mulheres (52%),...

Marina: Paradoxos

 Há algo perturbador na performance eleitoral de Marina da...

para lembrar

‘Não vamos desistir porque fascistas estão vencendo agora’, diz Jurema Werneck

Para ativista do movimento feminista e negro, a luta...

“Ainda há vidas para salvar”: diretora da Anistia falará na CPI da Covid

Médica e diretora-executiva da Anistia Internacional Brasil, Jurema Werneck,...

Elza Soares sobre festa da diretora da Vogue: “escravizar, nem de brincadeira”

A compositora Elza Soares fez um post no seu Instagram oficial...
spot_imgspot_img

Homenageada em enredo, Alcione lembra ajuda de outras escolas na criação da Mangueira do Amanhã e início do projeto: ‘Chamado espiritual’

A Estação Primeira de Mangueira homenageia a cantora Alcione em seu desfile do carnaval deste ano. A trajetória da Marrom que se se mistura, em parte,...

Alcione visita barracão da Mangueira, na Cidade do Samba

A cantora Alcione e baluarte da escola de samba Estação Primeira de Mangueira visitou nesta terça-feira o barracão da escola na Cidade do Samba...

Enredo e Samba: Mangueira vai homenagear vida e obra de Alcione

A Estação Primeira de Mangueira virá para o carnaval de 2024 com um enredo que vai homenagear uma das torcedoras mais ilustres da escola: a cantora e compositora Alcione. Com...
-+=