Pixinguinha ganha disco com inéditas para celebrar os 50 anos de sua morte

Pixinguinha ganha disco com inéditas para celebrar os 50 anos de sua morte

No dia 17 de fevereiro de 1973, Pixinguinha morreu durante uma cerimônia de batismo em Ipanema na qual era padrinho —”Só quem morre dentro de uma igreja/ Vira orixá, louvado seja/ Senhor/ Meu santo Pixinguinha”, já escreveu Paulo César Pinheiro para melodia de Moacyr Luz no samba-homenagem “Som de Prata”.

Agora, quando se completam 50 anos da despedida, o compositor, como orixá, segue se mostrando vivo e, mais do que isso, novo. A série de discos “Pixinguinha Como Nunca”, da gravadora Deck, traz 50 composições inéditas do artista, garimpadas em seu acervo.

Algumas delas ganharam versos de letristas como Arnaldo Antunes, autor de “Poética (Chuvisco na Telha)”, que este jornal antecipa com exclusividade. O projeto será lançado nesta quinta-feira (16) com um show no Theatro Municipal do Rio de Janeiro.

“A certa altura de sua vida, Pixinguinha foi passado da vanguarda para velha guarda sem escalas, e ali ficou. Uma imagem passadista que não condiz com a modernidade de sua música”, diz o cavaquinista e pesquisador Henrique Cazes, diretor musical do projeto.

“Em ‘Pixinguinha Como Nunca’ buscamos olhar o artista com esse viés moderno. Pixinguinha inédito, mas não no passado e sim no século 21”, completa. O próprio título “Pixinguinha Como Nunca” traz esse sentido, de uma perspectiva contemporânea. “Além disso, refere-se também ao fato de juntar um time de músicos que nunca tocou junto. E, claro, de ser de músicas que nunca foram editadas ou gravadas”.

O time de músicos que o diretor menciona é formado por Carlos Malta (flauta e sax), Silvério Pontes (trompete), Marcelo Caldi (sanfona), Marcos Suzano (percussão), João Camarero (violão de 7 cordas) e o próprio Cazes (arranjos e cavaquinho).

Todos instrumentistas que, de diferentes formas, têm na tradição um ponto de partida, não de chegada —desde Silvério, um mestre afeito às rodas de choro, até Suzano, que reinventou o pandeiro brasileiro bebendo de fontes como a música eletrônica.

O ator e cantor Marcelo Vianna, neto de Pixinguinha e pesquisador da obra de seu avô, assina a curadoria do projeto, que desenhou ao lado de Cazes. “Pixinguinha Como Nunca” se divide em quatro álbuns. O primeiro deles, “Pixinguinha Virtuose”, foi lançado no último dia 3, com obras que deixam evidente a maestria do compositor e seu domínio no terreno do choro.

No dia 17, chega às plataformas “Pixinguinha na Roda”, com peças de apelo mais direto, que Cazes aponta como fortes candidatas a serem abraçadas pelas rodas de choro. Em abril, dia 6, é a vez de “Pixinguinha Internacional”, no qual o maestro se aventura em gêneros estrangeiros como tango e ragtime. Por fim, dia 24, “Pixinguinha Canção” inclui as melodias que ganharam letras de Arnaldo Antunes, Moacyr Luz, Elisa Lucinda, Nei Lopes, Paulinho Moska, Cecília Stanzione, Eduardo Gudin, Salgado Maranhão, Guinga, Paulo César Feital e Osvaldo Simões.

A origem de “Pixinguinha Como Nunca” remonta ao início da parceria de Vianna e Cazes, que há muito tempo desenvolvem projetos em separado sobre a obra do maestro. Em 2015, eles trabalharam juntos pela primeira vez em “Pixinguinha: as Cinco Estações”, espetáculo que passeava pela vida do compositor. Dali para “Pixinguinha Como Nunca”, foi um caminho natural. “Um dia”, conta Vianna, “perguntei a ele: ‘Henrique você sabe que tem inéditas?’. Convidei-o para fazermos algo juntos com isso e ele disse: ‘Estava esperando você me chamar!’”.

Em 2022, “Pixinguinha Como Nunca” estreou nos palcos num circuito de shows no Centro Cultural Banco do Brasil, em quatro cidades. Agora, o projeto ganha sua versão fonográfica.

Vianna e Cazes estão juntos também em outro trabalho que celebra a figura de Pixinguinha nos 50 anos de sua morte. Em dezembro, foi lançado o livro “Pixinguinha, um Perfil Biográfico” (Editora Numa), de André Diniz, reedição ampliada e remodelada de obra lançada há uma década. Nele, Cazes assina uma discografia comentada, e Vianna, um texto sobre como foi crescer como neto de Pixinguinha.

O levantamento das inéditas que aparecem em “Pixinguinha Como Nunca” foi iniciado por Alfredo da Rocha Vianna Neto, pai de Marcelo Vianna e filho de Pixinguinha. Era ele quem organizava o arquivo pessoal do músico antes de a família passar a guarda do acervo para o Instituto Moreira Salles, o IMS, onde está desde 2000. Nos últimos anos, a equipe de pesquisa do IMS trabalhou, entre outras coisas, para confirmar o ineditismo das obras, além de conseguir junto a outros pesquisadores mais material desconhecido.

“Ainda tem muita música dele perdida”, acredita Vianna. “Ele dava música de presente, coisas que compunha na hora”, explica, antes de lembrar um episódio curioso: “Outro dia encontrei George Israel, do Kid Abelha, no avião, que comentou comigo que havia recebido recentemente uma partitura, segundo disseram a ele, de uma inédita do Pixinguinha. Ele ficou de me mandar.”

Para Cazes, a existência de um material inédito tão extenso tem a ver exatamente com a percepção de que Pixinguinha era algo do passado. “Nos seus últimos 20 anos de vida ele praticamente não gravou suas músicas. Se ele tivesse gravado, teria sido maravilhoso. Mas não gravar também foi bom, porque deixou muita coisa para a gente fazer”, brinca o cavaquinista.

Cazes lembra uma história que ilustra como a imagem de “velha guarda” de Pixinguinha, não era fiel à música do maestro, muito mais inovadora do que museológica. O cavaquinista conta que o trombonista Ed Maciel era “um garoto” —tinha pouco mais de 20 anos— quando tocava na Orquestra do Pessoal da Velha Guarda, formação fixa do programa de rádio “O Pessoal da Velha Guarda”, de Almirante. Pixinguinha era o arranjador. “Como Pixinguinha escrevia difícil, os mais velhos saíam fora. Ficava a molecada para segurar o furor inventivo e virtuosístico dele. E AImirante os anunciava como ‘Velha Guarda’”.

O cavaquinista identifica, entre outros elementos, a marca do racismo na compreensão que se criou sobre Pixinguinha: “Só a partir do centenário de Pixinguinha, em 1997, que se começou a ter o acerto de contas e a se entender que, acima do folclore de um mito da velha guarda, cristalizado de pijama na linda foto de Walter Firmo, estava ali um gênio que lançou as bases da música popular brasileira”.

50 ANOS SEM PIXINGUINHA

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