Por que tantas jovens amam o método do ‘coito interrompido’

Em muitos aspectos, a época atual é excepcionalmente boa para ser uma mulher em busca de um método contraceptivo. O DIU, que funciona mais de 99% das vezes, está mais popular do que nunca; nos Estados Unidos, o controle de natalidade está protegido sob a lei Affordable Care Act (Lei de Proteção ao Paciente e de Assistência Acessível); e, em alguns estados americanos, os farmacêuticos podem fornecer o equivalente a um ano de pílulas sem necessidade de receita médica.

Por  Catherine Pearson, do The Huffington Post

O acesso das mulheres a uma gama de opções contraceptivas seguras é, sem dúvida, o melhor até agora.

Por que, então, várias mulheres heterossexuais ainda escolhem o coito interrompido — a retirada do pênis de dentro da vagina pouco antes da ejaculação —, o mais antigo e rudimentar método de controle de natalidade?

Estimativas indicam que cerca de 60% das mulheres norte-americanas contaram com seus parceiros para que retirassem o pênis antes da ejaculação em algum momento de suas vidas, enquanto que cerca de 3% delas, entre 15 e 44 anos, estão atualmente utilizando o coito interrompido às vezes — apesar de os pesquisadores acreditarem que o número real provavelmente seja muito mais alto.

Apesar de sua relativa popularidade, os professores de educação sexual tendem a desencorajar o coito interrompido, classificando-o como ultrapassado e irresponsável —não tanto um método contraceptivo como um ato tardio insensato. E, ainda assim, as mulheres que frequentemente usam o “método da retirada” insistem que não é apenas uma boa opção; é a melhor opção para elas.

“Eu definitivamente sinto vergonha dos outros on-line sobre meu método de escolha”, diz Rachel, 26 anos, que tem praticado o coito interrompido com seu parceiro há quatro anos. “As pessoas parecem ser muito críticas em relação a isso.” Rachel sente que as mulheres que utilizam o método são julgadas como irresponsáveis, apáticas e totalmente negligentes.

Mas, talvez surpreendentemente, pesquisas indicam que retirar o pênis antes da ejaculação pode ser tão eficaz quanto os preservativos na prevenção da gravidez — apesar, claro, de não prevenir as infecções sexualmente transmissíveis.

A taxa de falha, seguindo corretamente as instruções, da chamada camisinha fica em torno de 3%; no caso da retirada do pênis, o índice é de cerca de 4%. Uma pesquisa revelou que 18% das mulheres nos EUA que utilizam o coito interrompido no prazo de um ano ficam grávidas, comparadas à taxa de 17% das que utilizam preservativo com o parceiro.

No entanto, a ONG Planned Parenthood indica que as chances de gravidez são maiores, apontando que 27 a cada 100 mulheres cujos parceiros utilizam o método da retirada ficam grávidas.

Obviamente, nenhum método chega perto da eficácia da pílula anticoncepcional ou do DIU, mas os números sugerem que o coito interrompido sofre injustamente uma reputação negativa.

“Ainda existem vários provedores de assistência médica que veem a coisa como ‘Ok, mas não é realmente um método’”, disse Rachel Jones, principal cientista pesquisadora do The Guttmacher Institute, que estuda o sexo e a saúde reprodutiva.

“Mais da metade das mulheres teve um parceiro que utilizou a ‘retirada’, por isso, apenas o simples fato de que a maioria das mulheres vai estar exposta a isso é um motivo para falar sobre o assunto”, acrescentou. “Tanto os prós quanto os contras.”

Jones trabalhou em um estudo realizado em 2014, com mais de 4,6 mil mulheres entre 18 e 39 anos, nos EUA.

Segundo a pesquisa, 33% delas haviam utilizado o coito interrompido pelo menos uma vez no mês anterior, dando credibilidade à alegação de que as estimativas atuais sobre a prática são baixas. (Jones faz uma ressalva, no entanto, de que seu estudo não teve alcance nacional.)

Um dado interessante é que Jones e os coautores da pesquisa descobriram que muitas mulheres utilizaram a “retirada” em conjunto com a pílula ou o DIU (13%) ou preservativos (11%), basicamente como uma forma adicional de contracepção.

O que sugere que muitas mulheres que se identificam como “usuárias da retirada” são, na verdade, mais vigilantes sobre a prevenção da gravidez.

Obviamente, um dos maiores benefícios é que não requer receita médica, dispositivos, e é uma opção que está ali o tempo todo.
Kelly Blanchard, presidente da Ibis Reproductive Health

O método de retirada do pênis é, às vezes, usado em conjunto com métodos de “planejamento familiar natural” ou baseados nos períodos férteis — bem como mudanças no corpo que ocorrem no processo — para determinar quando os níveis de fertilidade sobem. Os métodos que se apoiam no período fértil são decididamente vistos como “naturebas”, mas o surgimento de aplicativos que monitoram a fertilidade nos smartphones também indica que existe um interesse real de uma parte das mulheres.

Porém, mesmo as mulheres que se apoiam especificamente na retirada do pênis antes da ejaculação como principal método contraceptivo discordam da narrativa de que seriam simplesmente mal-informadas ou despreparadas.

“Não sou ingênua”, diz Tamara, 26 anos, que tem uma filha de 7. “Sei que, provavelmente, é um método menos eficaz e, ainda assim, escolho este. Antes eu utilizava a pílula; não tomei por uma semana, e fiquei grávida.”

Por três anos, quando tinha cerca de 20 anos, Tamara utilizou o método de retirar o pênis com o namorado. Ela não tem um parceiro sexual no momento, mas disse que considera utilizar o método novamente.

E não vê nada de irresponsável nisso. Nas poucas ocasiões em que o então namorado de Tamara não retirou o pênis a tempo, ela tomou a pílula do dia seguinte. Ela e o ex-namorado tinham muito claro o que aconteceria caso ela ficasse grávida (ela faria um aborto), e Tamara tinha dinheiro guardado para isso se fosse o caso.

“Acho que existe um equívoco. Não foi por causa de preguiça”, Tamara disse. “Para mim, foi questão de acesso.”

Tamara estava tomando pílula há anos, mas mudou de residência e tinha de dirigir por 45 minutos à clínica local uma vez por mês — uma dor-de-cabeça que lhe custava metade de um dia de trabalho. Ela não usava preservativos devido à uma alergia ao látex, que provocava uma erupção cutânea.

As mulheres têm vários motivos para optar pelo coito interrompido com seus parceiros. A pílula anticoncepcional tem sido amplamente estudada e é muito segura, mas há muitas mulheres que simplesmente preferem não usar hormônios, disse Kelly Blanchard, presidente da Ibis Reproductive Health, uma organização não governamental que conduz pesquisas clinicas e de ciências sociais. Objeções religiosas são outra causa comum, disse.

E, claro, existe a facilidade.

“Obviamente, um dos maiores benefícios é que não requer receita médica, dispositivos, e é uma opção que está ali o tempo todo,” disse Blanchard.

Ao discutir o coito interrompido, Blanchard foi muito clara ao destacar os riscos associados e explicou que não estava defendendo o método. Mas ela também acredita que a discussão deve ser mais relativizada do que simplesmente afirmar que retirar o pênis é sempre uma má escolha.

Em 2008, Blanchard foi coautora de um artigo com Jones argumentando que, devido a todas as falhas do método, as empresas de assistência médica deveriam reconhecer o coito interrompido como uma forma contraceptiva, com o objetivo de orientar seus pacientes e estudar melhor a frequência com a qual o método é usado. O estudo teve muita repercussão, muito mais do que qualquer outra publicação em sua carreira, diz Blanchard.

“Ouvi muitas reações negativas de educadores sexuais e provedoras de assistência médica que trabalham com jovens, dizendo que é perigoso sugerir que [o método] poderia ser usado”, disse, “e ouvi muitos comentários de jovens dizendo que haviam usado”.

Julia, de 22 anos, é um exemplo. Ela tem utilizado o coito interrompido desde que perdeu a virgindade, quando era adolescente, depois de descobrir que tem alergia ao látex, que provoca uma erupção cutânea localizada. Quando tinha 19 anos, colocou o DIU, mas odiou e o removeu seis meses depois.
Julia não possui um relacionamento estável e atualmente tem relações sexuais com poucos homens, a maioria amigos com os quais também transa.

Ela faz exames para detectar doenças sexualmente transmissíveis (DST) a cada três meses e espera o mesmo dos parceiros. Julia geralmente acredita que os homens com os quais tem relações sexuais estão sendo sinceros sobre não possuir nenhuma DST, mas, se fica desconfiada, pede para ver os resultados.

Ela teve alguns parceiros que não se sentiram confortáveis em retirar o pênis antes de ejacular e, neste caso, simplesmente fizeram outras coisas juntos, como sexo oral. Julia prefere que os parceiros ejaculem em seu peito ou traseiro, o que mantém o lado “pervertido” e, ao mesmo tempo, os lençóis limpos.

Julia é uma verdadeira adepta do coito interrompido e, para ela, pelo menos por enquanto, não há desvantagens.

Talvez por umas três vezes, seus parceiros não conseguiram se controlar no momento e, sem querer, ejacularam dentro. Naquelas ocasiões, ela recorreu à pílula do dia seguinte.

“Se eles não se comunicam bem, se não me dizem que vão ejacular, como vou saber?”, diz Julia. “É algo difícil de prever, por isso a comunicação é fundamental.”

“Sei que as mulheres têm reações diferentes a diversos tipos de controle de natalidade”, acrescentou, “mas outras opções não foram uma experiência positiva para mim”.

Os nomes foram trocados para preservar o anonimato.

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