Por que trabalhar com Literatura Negra em sala de aula?

Apesar da implementação da Lei 10.639/2003 que diz respeito à obrigatoriedade da inclusão da História e Cultura Afro-Brasileira no currículo oficial da rede de ensino e sua posterior alteração, através da 11.645/2008, que acrescenta à regulamentação anterior a questão Indígena, a educação formal brasileira ainda precisa ampliar a discussão sobre questões raciais na educação. A legislação vigente evidencia a necessidade de tratar da história e cultura africana e afro-brasileira como elementos importantes e indispensáveis na formação dessa sociedade.

Por Lissandra Ramos, do A Tarde

Nesse sentido, a criação das referidas leis aponta, ao mesmo tempo, para uma necessidade e para uma omissão. Ou seja, se por um lado, o Brasil avança ao reconhecer a importância de tais temáticas no contexto educacional; por outro, essa medida denuncia o apagamento e a negação experimentados ao longo do tempo. Por isso, é válido discutir o ensino da Literatura negra nesse cenário.

Segundo a autora negra Conceição Evaristo, a textualidade afro-brasileira não condiz com a estereotipia e o apagamento dos corpos, sujeitos e heranças culturais africanas verificadas em parte da literatura brasileira. Do mesmo modo, Cuti, escritor negro, pontua que “a Literatura Negra Brasileira traz também o desafio da primeira pessoa do negro” (CUTI, 2002, p.28).

Assim, o trabalho com a literatura negra em sala de aula possibilita o acesso a uma produção literária que rompe com uma tradição canônica na qual predominam autoria e personagens não negros. Além disso, cria novas representações da figura do negro, questiona, revisa e reclama o seu papel e lugar na sociedade brasileira. Para os estudantes, o contato com a literatura negra pode significar a construção de outra imagem de si e da comunidade afro-brasileira, distinta daquelas verificadas em outros espaços de produção.

Há na literatura negra, produções que podem ser trabalhadas desde as séries iniciais até as mais avançadas. Através desses textos, personagens negras, a beleza dos cabelos crespos, a presença da religiosidade de matriz africana e afro-brasileira e relações com a ancestralidade passam a figurar no imaginário infantil, criando para os pequenos novos referenciais. Da mesma forma, os leitores jovens e os adultos experimentam vivências literárias de lutas, desafios e olhares que desconstroem o lugar de subalternidade ao qual sujeitos negros foram e são, em alguma medida, submetidos.

Dentre outros benefícios, o trabalho com a literatura negra possibilita a quebra de silenciamentos historicamente impostos; estimula a discussão sobre questões raciais; é instrumento para o fortalecimento da autoestima negra e combate ao racismo; visibiliza a produção de autores que ainda encontram dificuldades no mercado editorial. Além disso, trazer para o currículo escolar tal produção é uma forma de promover e garantir a diversidade tão necessária para a formação educacional.

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Imagem: Feijão Preto

*LISSANDRA RAMOS é licenciada em Letras Vernáculas, pela Universidade Federal da Bahia; especialista em Estudos Étnicos e Raciais, pelo Instituto Federal da Bahia, com pesquisa sobre o Sarau JACA de Poesia; mestranda em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo, pelo PPGNEIM-UFBA. É membro do Conselho Deliberativo do Quilombo do Orobu, curso popular de pré-vestibular, localizado em Cajazeiras, com atuação voltada para a inserção da juventude negra da periferia no espaço acadêmico, especialmente nas universidades públicas; é educadora na mesma instituição e ministra aulas de Redação e Literatura.

 

 

 

 

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