Primeiro Emprego

Recentemente o jornal O Estado de São Paulo publicou matéria na qual constata que “a discriminação contra os negros nas contratações, promoções e nos programas de treinamento interno ainda são comuns nas empresas brasileiras(…)”É essa avaliação de consultores e especialistas em questões raciais ouvidos pelo Estado, apesar da crescente preocupação em se adotar políticas inclusivas. A matéria retoma também pesquisa realizada pelo Instituto Ethos de Responsabilidade Social mostrando que, em 94% das empresas ouvidas, as diretorias eram ocupados por brancos.

Por Sueli Carneiro

Em fevereiro último, pesquisa realizada pelo Seade para a região Metropolitana de São Paulo demonstrou que a queda nos rendimentos dos trabalhadores foi generalizada no ano passado, mas bem mais acentuada entre as mulheres negras. Segundo matéria da Folha On line de 23/2, “os diferenciais de raça são mais expressivos do que os de sexo (…)” De 2001 para 2002, a renda das mulheres negras caiu 13,3% e a dos homens negros, 6,8% . O rendimento médio por hora trabalhada do contigente de não – negro, de R$ 5,53, era de 83,7% maior do que dos negros (R$ 3,01). Além disso, considerando por cor e sexo, os homens não negros ganhavam, em média, R$ 6,10 por hora, 81,54% a mais do que os negros (R$ 3,36), que por sua vez recebiam 31,2% mais do que as mulheres negras (R$ 2,56). A renda das mulheres não – negras (R$ 4,82) era 88,28% maior do que das negras.

O Correio Braziliense, por sua vez, publicou há algumas semanas atrás matéria sobre o programa voltado para a inclusão de jovens de baixa renda no mercado de trabalho. Desenvolvido por uma ONG de Brasília, apresenta a perversidade de serem as vagas disponíveis apropriadas, em sua maioria, por jovens de classe média e mesmo alta, graças a relações políticas e sociais de que são beneficiários, em detrimento de jovens oriundos de famílias efetivamente carentes.

No nosso diálogo com as empresas que demonstram disposição para enfrentar a questão da inclusão da diversidade entre as suas responsabilidades sociais, é freqüente a alegação por parte delas que, quando se dispõem a contratar negros, esbarram na dificuldade de não encontrar profissionais com o perfil desejado. Indicamos que a empresa pode, nesse caso, desenvolver uma política de inclusão que tenha a perspectiva, através de estágios e outros mecanismos, de formação de profissionais negros que venham a galgar cargos na empresa.

O que temos concretamente são processos efetivos de discriminação racial no mercado de trabalho, cada vez mais evidenciados por estudos e pesquisas, e crescentemente reconhecidos pelos profissionais de recursos humanos. De outro lado, temos a transferência de recursos e oportunidades de inclusão social, sobretudo no mercado de trabalho, sendo desviados para setores sociais menos vulneráveis, uma distorção presente em projetos sociais e nas políticas públicas .

Nesse quadro de conivência e omissão diante dos mecanismos de reprodução das desigualdades sociais e raciais, é socialmente responsável e corajosa a concepção do programa Primeiro Emprego, do ministro Jacques Wagner, que segundo veiculado pela imprensa, prevê o incentivo às empresas para a contratação de negros, mulheres e deficientes.

Segunda a Folha de São Paulo, “dados do governo mostram que o desemprego juvenil é maior entre esses três segmentos da população . Além disso, a intenção do ministro Jacques Wagner é criar um mecanismo de combate à discriminação de minorias”.

Em consonância com essas preocupações do ministro reverbera pesquisa realizada há poucos anos pelo Dieese/ Inspir que atesta um índice significativamente superior de desemprego entre a população negra em todas as regiões metropolitana do país.

O enfoque dado ao Primeiro Emprego é o tipo de focalização que se espera das políticas públicas : que o seu desenho seja baseado nos dados conhecidos sobre as desigualdades sociais, no reconhecimento das dimensões de gênero e raça que as recorta e na vontade política efetiva de romper com a lógica que as vem governando, que termina por destinar os escassos recursos sociais aos que não são os efetivamente mais excluídos socialmente.

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