O babalawô e professor do programa de pós-graduação em história comparada da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ivanir dos Santos, condenou os ataques que religiões de matriz africana vem sofrendo em Goiás em função das investigações e buscas contra o serial killer Lázaro Barbosa, de 32 anos. O pai de santo André Vicente de Souza denunciou que policiais militares entraram no terreiro de candomblé na região e bateram no caseiro, além de quebrar portas e tirar fotos de objetos religiosos para ligar Lázaro à religião, taxando-a como algo “demoníaco”.
Ivanir lembrou que, há seis anos, a região onde ocorrem as buscas pela captura de Lázaro também foi palco de intolerância religiosa. O relato do pai de santo sobre a situação de preconceito foi feito em um vídeo que circula na internet.
“Primeiro, precisamos observar que a região onde está acontecendo as buscas pela captura de Lázaro Barbosa, mais ou menos uns 6 anos atrás, aconteceu violentos e sistemáticos ataques a terreiros de candomblé. Isso gerou, inclusive, a necessidade da retirada de alguns sacerdotes do Estado para que não fossem assassinados. Na época, a Comissão de Combate à Intolerância Religiosa (CCIR) acompanhou o caso para dar as ajudas necessárias”, afirmou.
O babalawô, que também é interlocutor da CCIR, relatou ainda que vem observando o disparo de notícias falsas fake para criar um ambiente hostil às religiões de matriz africanas aos olhos do público médio.
“No caso atual, é muito curioso as tentativas de ligações do criminoso ao cultos de matrizes africanas como justificativa para invadir, violar e perseguir os religiosos da região uma vez que o próprio sacerdote veio a público explicar que o acusado não tem nenhuma ligação com o terreiro”, pontuou.
Criminoso não é religioso
Imagens viralizaram na internet de peças e conchas na casa em que Lázaro estava e foram associadas – de forma racista e preconceituosa – a um assentamento de candomblé.
Ivanir dos Santos explicou que não há como identificar, reconhecer ou ligar peças de rituais africanos a qualquer liturgia, como se pudesse legitimar ou justificar as atitudes do criminoso. Ele explicou que nenhuma religião prega atos como os praticados pelo serial killer. Para o professor, os casos de perseguições e intolerâncias a qual passamos hoje é fruto do desconhecimento das nossas práticas religiosas alimentadas pelo racismo epistêmico e estrutural.
“É um equívoco associar religião a uma pessoa em visível desequilíbrio. O uso de notas e situações inverídicas sobre as religiões de matrizes africanas é, infelizmente, comum no Brasil! Frequentemente associadas ao satanismo, as bruxarias ou construídas de forma negativa no imaginário social coletivo brasileiro, as religiões de matrizes africanas precisam, a todo momento, criar mecanismo de defesa para sobreviverem e resistirem contra séculos de pressões e tentativas de silenciamentos”, finalizou.