O professor universitário e técnico do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas Carlos Alberto Santos de Paulo, compareceu hoje (15/12), às 14h na sede do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios – MPDFT, para formalizar denuncia contra quatro policiais civis. A acusação leva em conta episódios ocorridos na tarde e noite da última sexta-feira (12/12).
Com 52 anos, Carlos Alberto, que é negro, foi sem motivo algum interceptado por uma viatura da policia civil descaracterizada, quando dirigia seu carro, modelo Tucson, nas imediações da QI 23 do Lago Sul, área nobre do Distrito Federal. Após sofrer revista truculenta, este informou aos policiais que registraria a ocorrência no 30º Distrito Policial de São Sebastião.
Mantendo a calma e já no estacionamento da delegacia, Carlos Alberto que possui mestrado e doutorado (recém concluído na Universidade de Brasília) na área de políticas sociais e é colaborador do Grupo de Trabalho de combate ao racismo da Polícia Militar do DF, GT criado após a revista humilhante e ofensas racistas sofridas pela advogada Josefina Serra, em 7/10 na Esplanada dos Ministérios. Foi imobilizado com um “mata leão” e algemado sendo então impedido de usar seu aparelho celular durante todo o tempo em que esteve preso.
A vítima, que também é militante histórico da pauta racial no Brasil, conta que “ao delegado de plantão, Claudio Rego Pantoja, os policiais o acusaram de direção perigosa. Forjaram um crime que não cometi, inclusive porque a via estava totalmente congestionada naquele final de tarde”. Após todas as situações de humilhação ocorrida no transito e até a chegada do delegado, a vitima nos relatou que “Decidiu levar a denúncia adiante porque este não é um fato isolado; tem sido uma prática freqüente e o Estado precisa tomar atitudes: melhorar a formação de seus quadros e coibir a truculência das forças policiais que prestam um serviço público. O sentimento, de profunda revolta, hoje toma conta dos meus familiares e amigos”, acrescenta.
Abaixo depoimento da Vitima
Bom dia todos(as)
A mensagem deve ser curta e definitiva. Ontem ás 18h15, me dirigia para casa, sentido QI 23 ao Condomínio Belvedere Green, transito totalmente engarrafado, na altura do Mac Donalds, há uma rotatória, estando eu parado no engarrafamento, eis que surge um veículo com 4 jovens brancos dentro, sendo um casal na parte da frente do veículo, pedem passagem, insistentemente, alego não ser possível dar ré no carro para que eles possam passar. E conformo isso é a realidade de Brasília, nisso sigo na direção do acostamento para sair do fluxo emperrado. Após alguns metros o mesmo veículo, me interpela com os jovens com arma em punho e pede que me posicione para ser revistado, mãos entrelaçada na cabeça, pernas afastadas. Pedem em seguida minha habilitação e documento do carro, pergunto qual a alegação, pede para eu ficar calado, e me pergunta quem você pensa que é? Respondo: -Um cidadão.
Em uma última olhada, alegam que minha habilitação está vencida( data de validade 28/11/2014) portanto dentro do prazo administrativo tenho um mês para regularizar. Insisto qual a alegação do procedimento autoritário e pergunto a lotação dos agentes , um deles informa 30 DP, em seguida entram no veículo de placa JHF 9124.
Decidi não deixar essa situação passar impune, me dirijo a 30 DP, em São Sebastião, o que sou acompanhado de perto pelos supostos agentes, ao adentrar o estacionamento eles entram também e o mesmo agente, vem em minha direção e pede que eu estacione direito o carro, faço sem contestação( importante ressaltar que o meu carro estava afastado da faixa amarela algo em torno de 20 a 30 centímetro. ao descer meu objetivo era de registrar uma ocorrência contra o arbítrio da abordagem, o mesmo agente fala para mim que ele não havia me autuado, mas agora ele o faria . . Pergunto qual a alegação, ele pede minha documentação, eu informei que só a apresentaria ao titular da delegacia, ele me aplica uma chave de braço, momento em que me desvencilhei com relativa facilidade, mas dois outros agentes descem as escadas da delegacia já com as armas em punho e o referido agente me aplica um manta leão e diz que usaria a força, sou levado até o local em fica os presos e o mesmo agente pede que me algeme, nesse momento ainda com o telefone, ele me subtrai e peço que me devolva ele alega ser procedimento.
Como havia conseguido falar com o Coronel da PM Marcos de Araujo, ele ligou para o comando local que por sua vez informou que eu fazia parte de um grupo de Trabalho na PMDF, o delegado titular Dr. Wellington, não estava na delegacia, por 1h fiquei algemado, após esse período um outro delegado jovem apareceu Cláudio Rêgo Pantoja, me perguntou por que eu estava algemado, apenas solicitei que ele perguntasse aos seus agentes. No que o mesmo tirou as algemas e pediu que eu sentasse em uma cadeira. Perguntou o que aconteceu informei que havia sido vítima do abuso e despreparo dos agentes, ele disse que eu havia feito manobra perigosa no transito. Em seguida foi conversar com os agentes.
Após mais 1h fui dar meu depoimento, e o delegado foi muito cordial informando que ele muitas vezes é vítima da grosseria das pessoas que vem até a delegacia e que mesmo ele sendo policial delegado quando abordado mantem uma serenidade. Informei para ele que tenho a mesma conduta, mas há agravantes, há o racismo como parâmetro. Ele me perguntou se eu já havia presenciado uma abordagem policial em São Sebastião, disse que não era preciso, o modus operandi é o mesmo, mas naquele caso se tratava do lago sul e não lembro de ter visto algo assim, apesar de morar há muitos anos ali.
Após o depoimento ele me sugeriu ir no IML, para registro, conversei com o Coronel, brevemente por que meu celular estava descarregando, segui algumas orientações, liguei para o Promotor Pierobom, que fez algumas considerações e perguntas como ele entregou a cópia da ocorrência, não, apenas me entregou um termo de compromisso de comparecimento e um memorando para encaminhamento para o IML, que não adiantou muito, lá apenas o agente me perguntou se eu estava com algum hematoma, pedi para que ele fizesse um exame toxicológico e ou bafômetro, ele alegou que se o delegado não pediu ele não poderia fazer nada.
Resolvi fazer por conta própria, fui até o Hospital Pronto Norte, a médica de plantão disse que lá não faria, mas que eu tivesse fé em deus que tudo se resolveria.
Encerro essa narrativa dizendo, não consigo respirar…os avanços jurídicos apesar de pífios no que diz respeito a questão racial e as ações pontuais de políticas de governo, tem suscitado uma contra ofensiva violenta por parte da sociedade que se sente ameaçada com essas pequenas garantias . . .penso que não se trata de mais um caso, mas acima de tudo de uma sucessão de fatores que deveria nos levar a pensar o que queremos fazer ?
Peço que me ajude a pensar estratégias para dar visibilidade nacional e internacional, precisamos conectar essas ações com a realidade do resto do mundo, não dá para o Governo brincar de nos fazer de gente grande por portar um PIN, e usar as prerrogativas de representante do governo federal se não há um real compromisso. Para finalizar me dirijo a vocês apenas para dar ciência do que qualquer um poderá passar . . .seguirei articulando formas de amplificar nosso cotidiano. Enquanto os jovens estiverem preocupados em demarcar posição entre os nossos, os jovens deles estão marcando a ferro e fogo os nossos jovens mais pobres, enquanto estivermos desconfiando que o nosso colega poderá dar uma pernada em nossas aspirações eles tem reiteradamente cortado nossas pernas.
Aguardo manifestação não apenas de apoio, mas sobretudo, ação o que fazer? Como fazer? É possível unidade nessa estratégia?
No mais, estou aos poucos descobrindo . . .que a idade tem uma função . . .ficamos serenos( ou seria endurecidos?) penso que uma coletiva é fundamental Sioney, mas uma, dessa vez é um homem negro . . .pretendo também ir a corregedoria da polícia civil, na segunda irei ao Ministério Público.
Carlos Alberto Santos de Paulo, professor universitário e pesquisador do IPEA, Militante do Movimento Social Negro Brasileiro