Profissionais de beleza nos EUA recebem treinamento para identificar e combater violência doméstica

Lei pioneira quer aproveitar relacionamento que profissionais de beleza costumam ter com clientes

Em uma iniciativa pioneira nos Estados Unidos, o Estado de Illinois vai começar a exigir que profissionais de beleza sejam treinados para identificar e agir em casos de violência doméstica.

Fonte: BBC Brasil

por, Alessandra Corrêa

A partir do dia 1º de janeiro, o curso que cabeleireiros, manicures, esteticistas, cosmetólogos e outros profissionais do setor devem concluir antes de receber licença para atuar no Estado vai incluir uma hora de educação sobre violência doméstica e agressão sexual.

O treinamento deverá ser repetido a cada dois anos, como exigência para que a licença seja renovada.

A nova lei, sancionada pelo governador republicano Bruce Rauner em agosto, é considerada a primeira do tipo no país.

Há iniciativas semelhantes em outros Estados, a partir de esforços de associações de profissionais de beleza, mas não em forma de lei.

Relacionamento próximo

O objetivo da lei é aproveitar o relacionamento próximo que profissionais de beleza costumam ter com seus clientes (mulheres e homens) e ensinar esses profissionais não apenas a reconhecer sinais de violência, mas também a lidar com a situação e até encaminhar as vítimas a serviços de apoio, quando for necessário.

Mas a lei deixa claro que os profissionais não terão obrigação legal de denunciar casos de abuso, nem serão punidos se optarem por não agir.

Curso que cabeleireiros e outros profissionais do setor fazem incluirá uma hora de educação sobre violência doméstica e agressão sexual

“Muitas pessoas que sofrem abuso vivem isoladas, extremamente controladas e não têm muitas oportunidades de pedir ajuda”, diz à BBC Brasil Megan Duesterhaus-AuBuchon, diretora-executiva da Quanada, organização que oferece abrigos e apoio a vítimas de violência doméstica em Illinois.

“A ida ao cabeleireiro ou manicure é uma das raras vezes em que (as vítimas) estão sozinhas ou longe do agressor. É a oportunidade de pedir ajuda”, ressalta.

Duesterhaus-AuBuchon observa ainda que clientes costumam falar sobre sua vida privada com cabeleireiros e manicures.

“Há algo sobre sentar-se naquela cadeira (que faz as pessoas falarem), e muitas (vítimas) frequentam o mesmo salão há anos, então ficam à vontade para falar sobre isso”, acrescenta.

Cuidados

Especialistas e idealizadores da lei ressaltam que a ideia não é transformar profissionais de beleza em terapeutas, nem esperar que ofereçam aconselhamento, mas simplesmente garantir que tenham as orientações e contatos necessários para saber como proceder.

“É sempre bom ter cuidado, porque certamente não queremos que se cause mais dano às vítimas ao dizer ou fazer algo errado”, afirma à BBC Brasil a diretora-executiva da National Coalition Against Domestic Violence (Coalizão Nacional Contra Violência Doméstica, em tradução livre), Ruth Glenn.

Segundo autores da lei, profissionais não terão obrigação legal de denunciar abusos e não serão punidos se decidirem não agir

Glenn salienta que é importante que o profissional saiba perceber quando o cliente deseja falar sobre o assunto, além de reconhecer sinais de violência física como, por exemplo, marcas de estrangulamento.

“É uma situação muito delicada, porque você não quer desempoderar as vítimas, dizendo o que devem fazer. Queremos simplesmente que saibam que terão apoio se estiverem em apuros”, observa Glenn.

‘Homens e mulheres’

A violência doméstica afeta tanto mulheres quanto homens.

Segundo o Center for Disease Control and Prevention (Centro para o Controle e a Prevenção de Doenças, ou CDC, na sigla em inglês), ligado ao Departamento de Saúde dos EUA, uma em cada quatro mulheres e um em cada sete homens no país já foi vítima de violência física grave por parte do cônjuge.

A National Coalition Against Domestic Violence calcula que 20 pessoas são abusadas pelo cônjuge a cada minuto, em um país onde apenas 34% das vítimas recebem cuidados médicos.

“Sempre que há pelo menos conscientização sobre violência doméstica já é positivo, e me parece que Illinois está fazendo isso da maneira correta”, avalia Glenn.

+ sobre o tema

Mortes de mulheres no Brasil têm raça e classe definidas, dizem pesquisadores

"Violência no Brasil é um fenômeno social articulado a...

Atleticanos e sociedade não podem banalizar o estupro

Um time como o Galo, cujo slogan é "paixão...

Pelo menos sete casos de violência contra mulher são registrados este domingo

Quantidade de ocorrências espantou a PMDF, que lembrou sobre...

Patrícia Mitie, a mais nova vítima de feminicídio no Brasil

Patrícia Mitie Koike, de 20 anos, foi espancada até...

para lembrar

Mãe de adolescente que cometeu suicídio após ser estuprada divulga carta da filha

O caso da adolescente Cassidy Trevan, que cometeu suicídio...

Joanna Maranhão conta como superou trauma do abuso sexual

Depois de duas tentativas de suicídio, nadadora diz que...

Em menos de 24 horas, quatro homens são presos por violência contra a mulher no DF

Somente nesse domingo (7), a Polícia Militar prendeu quatro...
spot_imgspot_img

Coisa de mulherzinha

Uma sensação crescente de indignação sobre o significado de ser mulher num país como o nosso tomou conta de mim ao longo de março. No chamado "mês...

A Justiça tem nome de mulher?

Dez anos. Uma década. Esse foi o tempo que Ana Paula Oliveira esperou para testemunhar o julgamento sobre o assassinato de seu filho, o jovem Johnatha...

Dois terços das mulheres assassinadas com armas de fogo são negras

São negras 68,3% das mulheres assassinadas com armas de fogo no Brasil, segundo a pesquisa O Papel da Arma de Fogo na Violência Contra...
-+=