Neste domingo, uma vez mais, desencadearam-se os protestos dos setores conservadores, envolvendo especialmente estratos médios da sociedade. Eles têm um quê de hilário e folclórico. Têm refletido apelos políticos e morais inconsistentes, que mal conseguem formular uma frase dotada de sentido racional.
O sentimento de ódio prevalece e embota a capacidade de percepção sobre o País e os seus problemas. Balbucios de críticas e de propósitos políticos predominam, sem um mínimo de consideração à lógica e ao bom senso.
Garantir privilégios, ou pretensos privilégios, de classe ou estratos de classe dão certa tônica aos protestos, associado a uma cosmovisão social, política e econômica despudoradamente excludente. Não raro, protestos que também desconsideram as próprias e boas normas do nosso idioma.
Igualmente, tais protestos expressam uma dimensão trágica. Revelam o poder de influência dos conglomerados de mídia nas sensibilidades e nos comportamentos coletivos. Uma “escola paralela”, como diriam Paulo Freire e Sérgio Magalhães, nos idos dos anos 1980.
Uma “escola” que se sobrepõe, coloca para escanteio a educação formal/escolar e hoje defende estritamente uma agenda negativa para o Brasil. Mira um retrocesso em relação às parcas conquistas alcançadas nas últimas décadas, como a recente eliminação da fome e os direitos sociais garantidos na Constituição de 1988, além de direitos assegurados remotamente, como a legislação trabalhista.
A faceta trágica desses protestos é representada ainda pela reverberação, nas ruas, de visões de mundo incongruentes com o nosso tempo. Um reflexo da força de incidência do passado na modelagem do tempo presente: a herança escravista, colonial, militar.
Não gratuitamente, pulularam, neste domingo, apelos esdrúxulos ao retorno da monarquia e à intervenção das Forças Armadas e dos EUA. Nas tomadas feitas pelas câmeras de televisão, as imagens apresentavam uma nítida prevalência branca entre os manifestantes, abarcando saudações nazi-integralistas e identificações com símbolos estadunidenses.
Após diferentes ensaios de acordos interinstitucionais e partidários, assim como em função dos posicionamentos contra o impeachment advindos de setores empresarias e infocomunicacionais decisivos, como alguns analistas têm destacado, é bastante plausível que a sombra da destituição do governo vá se desfazendo aos poucos.
A incorporação, pelo governo federal, das agendas empresarial/financista e dos adversários de campanha, Marina e Aécio, parece desanuviar o ambiente, em que pesem ruminações fascistóides como a deste domingo.
Nesse sentido, em que pese a hilaridade eventual dos protestos reacionários, não se pode deixar de observar que têm alcançado êxito parcial. Se não obtiveram – e provavelmente não conseguirão – o “fim do PT”, a “destituição” da presidente Dilma Rousseff, estão fazendo retroceder, em décadas, a agenda do País e das forças populares, progressistas e de esquerda.
Praticamente estão congelando o Brasil no tempo, com informal poder de veto sobre mudanças progressistas. Um poder inflado e assegurado por megaempresas de comunicação como a Globo. Fenômeno que está obscurecendo qualquer horizonte de reformas sociais, políticas e econômicas, que permitam compatibilizar, efetivamente, as condições de vida do Povo Brasileiro com a pujança da riqueza natural e material do País. Urge criar um bloco social e político alternativo, à esquerda.
Roberto Bitencourt da Silva – doutor em História (UFF) e professor da FAETERJ-Rio/FAETEC e da SME-Rio.