Que país é esse?, por Egon Heck

Soldados com escudos e artefatos contra motim fechavam a porta de entrada da Câmara dos Deputados. No Senado também já haviam sido barrados. Um forte esquema policial se espalhou pelos espaços dos três poderes. Parecia que estaria prestes a acontecer uma perigosa invasão de vândalos. Na pauta das duas casas do Congresso estavam temas vitais para os povos indígenas. Uns 150 indígenas estavam em Brasília para participar desses espaços conforme lhes garante a Constituição e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho

Do: Racismo Ambiental

Egon Heck – Conselho Indigenista Missionário – CIMI

Ao serem barrados, ficaram indignados e revoltados, com essa atitude ditatorial e absurda do Estado Brasileiro. “Isso é um crime…o que vocês soldados estão fazendo ao impedir esses brasileiros nativos entrar no congresso é um crime”, dizia um dos presentes ao ato. Ao tentarem forçar a entrada, foram recebidos com spray de pimenta e rechaçados. A grande mídia qualificou o ato como tentativa de invasão. Porém não registrou que os invasores estavam lá dentro tentando rasgar a Constituição e tirar direitos indígenas.

Que país é esse? Que recebe seus habitantes originários com bombas e baionetas? Exclamou a deputada Erika Kokai. Nessa mesma linha se manifestaram parlamentares e indígenas. Quando os parlamentares, inclusive o presidente da Comissão, deputado Afonso, vieram comunicar aos indígenas sua firme posição de inviabilizar a votação da Comissão Especial da PEC 215, afirmaram “essa PEC está enterrada”. Porém se manifestaram no sentido de que a mobilização indígena foi fundamental para se chegar a essa decisão.

Presos e agredidos

No decorrer do dia seis indígenas foram presos numa clara atitude de prepotência e intimidação do movimento de resistência e afirmação da dignidade de homens, mulheres, guerreiros e guerreiras indígenas. “Queremos ser respeitados”. Essa foi o grito mais ouvido em dezenas de falas dos povos indígenas.

Ao serem barrados de entrar no Congresso os indígenas apontaram para um cartaz que se encontrava na entrada “Bem Vindos, essa casa também é sua”. Que ironia. Os indígenas exigiam seu mais elementar direito de cidadãos e habitantes primeiros dessa terra “Amanhã viremos em mais. Não vamos aceitar ser barrados em nossos direitos. Nos querem massacrar aqui fora e lá dentro. Isso nós não vamos aceitar” dizia uma das lideranças de mais de duas dezenas de povos ali presentes.

Quando a noite já ia encobrindo o cenário da batalha, os indígenas, sentindo mais uma injustiça e brutal negação de seus direitos, estavam inconformados com a prisão dos seis integrantes de sua delegação. Queriam dizer ao Brasil e ao mundo, de que não desistirão de seus direitos “que prendam a todos nós. Mostrem o que de fato estão fazendo ao rasgar a constituição e roubar nossos direitos”.

Porém nada os demove a continuar a batalho por seus direitos. Hoje novamente estão em Brasília, apesar de toda a violência, ameaças e prisões.

Ultima esperança: nós mesmos

Diante de um quadro tão brutal e criminosamente adverso os indígenas presentes nas manifestações em Brasília, pelos seus direitos, dignidade e vida, se mostraram su crença e convicção de que vencerão, com a força de seus guerreiros, do espírito  secular de resistência, sabedoria e espiritualidade. “O índio brasileiro se revolta. E com razão. Querem jogar a gente na beira das estradas ou debaixo de pontes. Mas nós vamos enfrentar a luta com coragem. Eles tem que respeitar nossos direitos. O que deixa a gente revoltado é a prisão e assassinato de nossas lideranças”. E diante de um mundo tão fechado a eles, onde muitas vezes não tem a que recorrer, afirmam convictos “a última esperança somos nós mesmos”.

Virá um novo dia.

+ sobre o tema

Um encontro histórico de camponeses

  Entre os dias 20 e 22 de agosto,...

Conselho Indigenista Missionário esclarece “suicídio coletivo” de índios

O Conselho Indigenista Missionário (Cimi) emitiu nota para esclarecer...

“Não se pode aceitar o higienismo”

O sanitarista e ex-ministro da Saúde José Gomes Temporão...

São Paulo marca ‘beijaço de repúdio’ contra Marco Feliciano

Acusado de homofobia e racismo, deputado é alvo de...

para lembrar

Destino da demarcação de terras indígenas volta à pauta nas mãos dos ruralistas

Depois de oito meses de discussão, o relatório da...

Estudos de delimitação de quatro territórios indígenas são aprovados

Estudos identificaram as Terras Sawré Muybu (PA), Ypoi/Triunfo (MS),...

Lideranças femininas e saberes tradicionais dão força à preservação do Cerrado

Três mulheres líderes de povos indígenas e comunidades tradicionais...
spot_imgspot_img

Inscrições abertas para compor banco de itens do Saeb

As inscrições para credenciamento de colaboradores interessados em compor o Banco de Colaboradores do Banco Nacional de Itens (BC-BNI) do Sistema de Avaliação da...

Cacique denuncia escalada da violência contra indígenas no Paraná após ameaça de policiais: ‘Posso matar vocês aqui e ninguém vai saber’

O cacique Izaias Benitter, da aldeia Taturi, localizada no município de Guaíra, no oeste do Paraná, denunciou a ameaça de policiais contra dois indígenas. O...

Comissão Arns e Conectas Direitos Humanos – Em repúdio ao ataque criminoso contra os Pataxó, no sul da Bahia

A Comissão Arns e a Conectas Direitos Humanos vêm manifestar seu repúdio aos trágicos acontecimentos ocorridos no dia de ontem, na cidade de Potiraguá,...
-+=