Racismo ambiental no centro da agenda climática

09/11/25
  • Declaração de Belém destaca que a crise ecológica global é também uma crise de justiça racial
  • Principal desafio agora não é recolher adesões ao documento, mas fazer com que ele não se restrinja à retórica diplomática

“Conclamamos todas as nações a cooperar na tarefa essencial de combater o racismo ambiental, reconhecendo que o desenvolvimento sustentável somente será alcançado quando forem eliminadas as desigualdades que afetam de forma desproporcional pessoas afrodescendentes, povos indígenas, comunidades tradicionais e outros grupos e minorias vulneráveis em todas as regiões do mundo.” A Declaração de Belém sobre o Combate ao Racismo Ambiental foi divulgada no último 7 de novembro, durante a cúpula do clima de Belém.

Aberto a adesões durante a COP30, o documento já foi endossado por Brasil, Colômbia, Uruguai, Equador, China, Camboja, Papua Nova Guiné, República da Guiné, Libéria, Gabão, Moçambique, Sudão do Sul, Marrocos, São Tomé e Príncipe, México, África do Sul, Venezuela, Bolívia e Suriname.

Grupo de 34 líderes e representantes internacionais posam em frente a um painel verde com o texto "BRASIL COP30 AMAZÔNIA BELÉM 2025" durante a Cúpula do Clima em Belém. Eles estão alinhados em duas fileiras, muitos com as mãos dadas ou entrelaçadas, vestidos formalmente, em ambiente externo com vegetação ao fundo.
Líderes mundiais fazem a chamada foto da família da COP30, em Belém – Danilo Verpa – 7.nov.25/Folhapress

A declaração é resultado de um esforço conjunto entre organizações da sociedade civil e governos, protagonizado por movimentos negros brasileiros que tem pautado a urgência de enfrentar o racismo ambiental.

A própria declaração apresenta uma definição para o termo: “(…) racismo ambiental —frequentemente manifestado por políticas e práticas que resultam em exposição desproporcional de pessoas e comunidades, incluindo afrodescendentes, povos indígenas e comunidades locais, a danos ambientais e riscos climáticos”.

O principal argumento é que o racismo ambiental fere os princípios de igualdade e de não discriminação previstos no direito internacional e por isso os Estados precisam combatê-lo.

É sabido que os danos provocados por crises ambientais e climáticas afetam de forma desproporcional comunidades negras, indígenas e tradicionais, tanto na cultura e no patrimônio como na saúde, meios de subsistência e ecossistemas.

Por isso, a declaração conclama os diferentes países a cooperarem no enfrentamento ao racismo ambiental a partir do reconhecimento de que só haverá desenvolvimento sustentável quando forem eliminadas as desigualdades que persistem como legado do colonialismo.

“Reconhecendo que padrões históricos e persistentes de discriminação, o acesso desigual aos processos decisórios nacionais e internacionais e os legados do colonialismo contribuem para exposições diferenciadas à poluição, aos riscos climáticos e à perda da natureza, bem como para desigualdades no acesso à tecnologia e a serviços”.

A Declaração de Belém é um avanço inédito na diplomacia ambiental internacional. Ao afirmar que o combate à crise climática depende do enfrentamento das desigualdades raciais e coloniais, o documento amplia o horizonte das negociações multilaterais e reposiciona o Sul Global como protagonista da agenda climática. O protagonismo brasileiro, impulsionado pela mobilização de mulheres e movimentos negros, projeta a certeza de que não há justiça climática sem justiça racial, nem futuro sustentável sem reparação histórica.

O principal desafio agora não é recolher adesões ao documento, mas fazer com que ele não se restrinja à retórica diplomática. Em um cenário de interesses econômicos que ainda privilegiam a mineração, o agronegócio e a indústria fóssil, o combate ao racismo ambiental exige muito mais que adesões formais.


Bianca Santana – Doutora em ciência da informação, mestra em educação e jornalista. Autora de “Quando me Descobri Negra”

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