Enquanto não houver interseccionalidade racial e de gênero em todos os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs) da Agenda 2030, não haverá desenvolvimento sustentável, com consequências drásticas para a maioria populacional brasileira que é formada por 56% por pessoas negras. Esta constatação se deu mais uma vez por parte de Geledés – Instituto da Mulher Negra durante a apresentação do 8º Relatório Luz da Sociedade Civil da Agenda 2030, que ocorreu na terça-feira 22 de setembro, em Brasília.
“Essa lacuna tem resultado na incapacidade da aceleração da Agenda 2030 e impacta na dimensão de responsabilidade da abordagem, de forma efetiva, do racismo sistêmico e desigualdades estruturais. Ou seja, essas novas agendas globais precisam se comprometer com o enfrentamento de desigualdades históricas”, afirmou em sua fala no evento a assessora internacional de Geledés, Letícia Leobet.
O Relatório Luz, importante ferramenta de resistência da sociedade civil para monitorar o andamento dos 17 ODSs e suas 169 metas, foi estruturado por 47 organizações e 82 especialistas que compõem o Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para Agenda 2030 (GT Agenda 2030). Geledés integra o grupo de trabalho como a única organização liderada por mulheres negras e acompanha de perto as ações do grupo, apresentando recomendações para que a implementação de políticas públicas ocorra dentro de uma perspectiva de enfrentamento ao racismo e sexismo.
O instituto pressiona, por exemplo, para que o relatório apresente informações desagregadas por raça e gênero em todas as metas e indicadores. A assessora internacional de Geledés sublinhou a dificuldade de acesso a esses dados desagregados por raça e gênero para todos os indicadores dos 17 ODS. Geledés vem contribuindo para envolver as demais organizações do GT para que se comprometam com esse processo, tanto pela busca dessas informações e transversalização com suas agendas prioritárias, quanto para que se somem para pressionar o Estado brasileiro a produzir esses dados. A ausência desse tipo de informação resulta em carência de análises no documento sobre as desigualdades, o racismo, o machismo, o capacitismo, o etarismo, o heterossexismo e outros marcadores que, segundo ela, impedem o cumprimento da agenda.
“É uma denúncia histórica a ausência de metas, objetivos e indicadores específicos que medem o enfrentamento ao racismo, ou seja, que apresente qual é a posição da maioria da população brasileira em relação ao desenvolvimento sustentável, e isso cria barreiras significativas à implementação da Agenda 2030”, disse ela. E complementou, ao cobrar maior transparência nas informações sobre o relatório: “Lélia Gonzales já nos alertava sobre essa articulação entre um desenvolvimento desigual, combinado e a exclusão da população afrodescendente”.
Além da valorização das práticas e dos saberes das comunidades afrodescendentes, quilombolas e indígenas, a assessora internacional voltou a mencionar a urgência da titulação de territórios dessas comunidades, bem como o reconhecimento dos seus saberes e práticas para o avanço do Brasil na Agenda 2030.