Em seu discurso feito nesta sexta para rebater as declarações do ex-ministro Sergio Moro, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) citou Marielle Franco, vereadora assassinada em março de 2018, quando comparou a investigação da morte dela com a da facada que levou durante a campanha eleitoral. Após a fala, a família da parlamentar repudiou o uso do nome dela pelo presidente.
Anielle Franco, irmã de Marielle e à frente de instituto em memória dela, classificou a declaração de Bolsonaro como “revoltante, lastimável e surreal” e afirmou que o uso do nome da vereadora foi uma “cortina de fumaça” na tentativa de tirar o foco dos ataques que recebia.
“Nenhuma vida deve ser ceifada como a da Marielle, ninguém merece levar facada. Não se pode comparar o crime dele com o crime da minha irmã, que perdeu a vida com mais de cinco tiros na cabeça, é inadmissível”, afirmou Anielle em áudio enviado à reportagem.
A declaração foi dada pelo presidente para rebater as acusações de que tentava interferir no trabalho da Polícia Federal.
“Será que é interferir na Polícia Federal quase exigir e implorar a Sergio Moro que apure quem mandou matar Jair Bolsonaro? A PF de Sergio Moro mais se preocupou com Marielle do que com seu chefe supremo. Cobrei muito deles aí. Não interferi”, disse o presidente.
“Acho que todas as pessoas de bem do Brasil querem saber. E entendo, me desculpe, senhor ex-ministro, entre meu caso e o da Marielle, o meu está muito menos difícil de solucionar. Afinal de contas, o autor foi preso em flagrante delito. Mais pessoas testemunharam, telefones foram apreendidos”, continuou.
“Para mim, o pronunciamento nada mais foi do que irresponsável e uma cortina de fumaça. Algo que ele não teve foi ética, caráter e valor. Como familiar e diretora do instituto, temos repúdio a essa fala. Eu acho que ele deveria ali ter concentrado suas forças em responder aos ataques e às denúncias que lhe convêm. E não usar o nome de minha irmã para uma cortina de fumaça de seus possíveis crimes.”
Viúva diz que fala é ofensiva
A viúva de Marielle, Mônica Benício, definiu a fala de Bolsonaro como ofensiva a quem quer justiça para o caso Marielle.
“Ofende porque Bolsonaro mente ao dizer que houve mais interesse da PF neste caso do que no episódio de sua facada. O caso Marielle não é de competência federal. É um enorme desrespeito e desqualificação da figura humana e política que Marielle representa”, disse, em nota enviada para Universa.
“Desde a execução da minha esposa, o então candidato, Jair Bolsonaro, sequer proferiu um pronunciamento sobre o assassinato e assim seguiu ao longo de seu mandato. Pelo contrário, foi omisso, e agora insiste na narrativa de desumanizar Marielle. Ele demonstrou isso mais uma vez em seu pronunciamento quando disse que ‘a vida de um presidente tem um significado’. A de Marielle também [tinha]. Assim como as vidas de todas as Marias e Silvas do nosso país e do mundo todo. Bolsonaro utiliza um dispositivo do racismo ao desumanizar uma mulher negra, negando o valor de sua vida e sua história.”
“Que ele lave a boca”, diz filha
A filha de Marielle, Luyara Santos, também reagiu à fala de Bolsonaro, pelo Twitter. “Que o senhor presidente lave a boca antes de falar da minha mãe”.
O Instituto Marielle Franco, mantido em memória à vereadora pela família, divulgou no Twitter nota em que menciona “total desprezo e revolta” pela fala do presidente em relação à Marielle.
“São 772 dias sem resposta de um crime que assassinou Marielle e até agora nada sobre que mandou matar. Como ousa dizer que existe mais empenho na elucidação do crime contra Marielle do que contra o atentado contra você, senhor presidente?”, diz o comunicado.