Denice Santiago é comandante da Operação Ronda Maria da Penha, que completa dois anos de criada nesta quarta
Por Thais Borges, do CORREIO 24 Horas
A major da Polícia Militar da Bahia (PM) Denice Santiago ganhou um apelido, desde que passou a ser a comandante da Operação Ronda Maria da Penha, que completa dois anos nesta quarta (8). É a ‘salvadora de Marias’. Foi uma das mulheres acompanhada pela ronda que deu a alcunha. “Ela diz que nós (da ronda) somos salvadores de todas as Marias que existem por aí. Não somos super-heróis, mas a gente chega com um propósito”, diz.
Atualmente, a major Denice é responsável por proteger 637 mulheres no estado (há três equipes estratégicas em Feira de Santana, Juazeiro e Paulo Afonso). É a ronda que acompanha as mulheres que estão sob medida protetiva concedida pela Justiça – no caso, vítimas de violência doméstica. Diariamente, os 60 policiais – divididos em seis equipes – fazem visitas diárias ‘surpresa’ às mulheres atendidas.
Em Salvador, são 26: 18 homens e oito mulheres. O restante se divide no interior. Para ela, a maior quantidade de homens na ronda não interfere no trabalho. Para as mulheres assistidas, muitas vezes, a chegada da Maria da Penha é um alento. Para os próprios membros da companhia, fica o desafio: como não se envolver com a história daquelas mulheres? Denice diz que é complexo, mas eles têm conseguido lidar.
Além disso, ter uma comandante à frente é uma experiência diferente. “Já ouvi deles (dos PMs homens) que, com o comando feminino, eles experimentaram ter alguém que tocaram neles. Não que os homens sejam insensíveis, mas é que nós (mulheres), culturalmente, somos treinadas para observar a pessoa, o ser humano, não apenas o profissional”.
Além disso, a companhia desenvolve projetos com o Ronda Para Homens, que, esta semana, vai receber um prêmio do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. “A gente entende que a sociedade é machista, mas nós temos casos de homens que estão no terceiro processo por violência doméstica. Então, nesse projeto, nós mobilizamos agentes e reunimos com grupos de homens para apresentar os tipos de violência contra a mulher. Perguntamos quais são os tipos que eles cometiam e não percebiam. Todos respondem que é a violência psicológica”, conta ela. Mais de 220 homens já participaram do Ronda para Homens.
Pioneira na Corporação
Aos 45 anos, Denice é uma das três mulheres com patente de major na Polícia Militar que comandam companhias – além dela, a major Maria Milanezzi e a major Maria Aparecida Freire comandam a 12ª Companhia Independente de Polícia Militar (Rio Vermelho) e a Companhia de Polícia de Proteção Ambiental (Coppa), respectivamente.
Denice, que se formou na primeira turma de policiais militares femininas, há 27 anos, conta que, antes de fazer parte da corporação, sequer percebia o trabalho da PM antes. Acabou parando na polícia porque o pai recomendou que ela fizesse um concurso público para ter estabilidade financeira na vida, depois de concluir o Ensino Médio. “Mas, quando entrei na Polícia Militar, me apaixonei”.
O trabalho com as mulheres começou dentro da própria PM, depois de ter sido uma das criadoras do Centro Maria Filipa. Inicialmente, as policiais mulheres ficavam na Companhia de Polícia Militar Feminina, dissolvida no final dos anos 1990. Como todas foram distribuídas entre as companhias, Denice sentia que as mulheres precisavam de um trabalho direcionado. Insistiu e, na gestão do coronel Antonio Jorge Santana, em 2006, o centro foi criado. O ano, inclusive, foi o mesmo da criação da Lei Maria da Penha.
“Mas a gente encontrou policiais vítimas de violência e eu comecei a conhecer mais a Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) e esse universo. Só que existia um clamor maior para a PM fazer mais contra a violência contra a mulher. Foi quando conhecemos a Patrulha Maria da Penha, do Rio Grande do Sul”. Como, na Bahia, a ‘ronda’ é um termo mais familiar, inclusive, devido à Ronda Escolar, o nome mudou.
A própria major é otimista quanto ao futuro das mulheres dentro da corporação. Fundada há 192 anos, a PM só tem mulheres há 27 anos. “Até mesmo a comunidade se choca (quando veem uma mulher). Eles esperam uma polícia mais masculina. Nós três (que têm patente de major) estamos desbravando um mundo. É fácil? Não é”. Mas ela diz que não vai recuar. Inclusive, já tem uma meta. “Todos os dias eu falo que a tendência é uma mulher chegar à cadeira mais alta no Quartel dos Aflitos e dite os rumos da corporação”, diz Denice, que é graduada em Psicologia e faz mestrado na Ufba, onde pesquisa a discriminação racial pela Polícia Militar.