A saúde é resultado da forma como as pessoas vivem, e o quanto acessam a educação, meio ambiente equilibrado, lazer, habitação, entre outros. A forma de organização da sociedade brasileira historicamente estabeleceu hierarquias por classe social, gênero e raça, que definiram diferentes formas desses indivíduos terem acesso aos determinantes do processo saúde-doença.
por Vanessa Cardoso no Chuva Ácida
Dessa forma, a raça/cor/etnia é uma categoria importante a ser considerada quando se pensa em saúde no Brasil. Por muitos anos, a ideia de democracia racial difundida no país no período da ditadura militar, não permitiu avanços na relação entre a raça e a saúde, mas ações intensas do movimento negro culminaram na criação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, que define diretrizes para esse cuidado no Brasil.
O Sistema Único de Saúde (SUS) já prevê entre seus princípios a equidade, que significa ofertar mais a quem mais precisa, ou seja, prestar um cuidado igualitário, mas respeitando as desigualdades existentes, portanto, é essencial que os serviços e principalmente os profissionais da saúde conheçam as diferentes formas de viver, adoecer e morrer, para que prestem uma assistência à saúde mais singular.
Um dos fatores essenciais para estabelecer indicadores de saúde com recorte racial é o preenchimento adequado do quesito raça/cor nos instrumentos utilizados nos serviços de saúde. Do Censo do ano 2000 para o de 2010, foi observado um aumento no número de pessoas que se autodeclararam negras (pretos e pardos) no Brasil. É importante que os serviços compreendam e importância e estejam preparados para perguntar, qual a sua cor? E a população empoderada para responder adequadamente. Em Joinville no Censo de 2000 7,19% da população se declarou negra, já no Censo de 2010 aumentou para 13,55%.
Os avanços nos registros acabam revelando uma triste realidade nos indicadores sociais e de saúde, ainda somos maioria entre as vítimas de violência, entre aqueles que vivem com menos de ¼ de salário mínimo e entre os que nunca acessaram o serviço de saúde para coleta de exame preventivo de colo do útero, exame de mamografia ou consulta com o dentista.
Nos indicadores de saúde podemos observar o impacto em agravos geneticamente determinado e naqueles adquiridos, agravados ou de tratamento dificultado pelas condições desfavoráveis de vida da população negra, entre eles a anemia falciforme que é mais prevalente na população negra; a hipertensão arterial (pressão alta) que é mais frequente, inicia mais precocemente e apresenta evolução mais grave na população negra; glaucoma mais prevalente e mais grave nos negros; miomas, 3 vezes mais comum em mulheres negras; o diabetes tipo 2 que é 9% mais comum entre os homens negros que em brancos e 50% em mulheres negras que em brancas; além das doenças do trabalho, mortes violentas, mortalidade materna e mortalidade infantil.
Reconhecendo esta situação o Ministério da Saúde lançou, em 2014, a Campanha de Enfrentamento ao Racismo no SUS, pois ao produzir situações de vida contrárias à promoção de saúde, tornar difícil o acesso da população negra aos diferentes setores e níveis do SUS ou propagar e utilizar preconceitos e estereótipos nos atendimentos são estabelecidos entraves na garantia da saúde da população negra.
Enfim, é importante a produção de conhecimento científico com recorte racial, capacitação dos profissionais de saúde e subsidiar a população com informações adequadas para que possamos construir coletivamente uma atenção à saúde mais justa.
Vanessa Cardoso possui graduação em Enfermagem pelo Instituto Superior e Centro Educacional Luterano Bom Jesus/IELUSC (2003). Mestranda em Saúde e Meio Ambiente. Atualmente é efetiva – Secretaria Municipal da Saúde de Joinville e docente do Curso de Graduação em Enfermagem. Tem experiência na área de Enfermagem, com ênfase em Enfermagem de Saúde Coletiva e Saúde da População Negra. Membro do Conselho Municipal de Promoção de Igualdade Racial.