Se Claudia Leitte fala em respeito, que a artista então respeite as músicas e religiões de matrizes afro-brasileiras…

Enviado por / FonteG1, por Mauro Ferreira

 Claudia Leitte sai de 2024 com a imagem arranhada, acusada de intolerância religiosa. Inquérito instaurado pelo Ministério Público da Bahia neste mês de dezembro vai apurar se a artista tem cometido atos de racismo religioso por vir trocando verso da letra de Caranguejo (Alan Moraes, Durval Luz, Luciano Pinto e Ninho Balla, 2004), música lançada por Claudia quando era vocalista do grupo Babado Novo e ainda mantida no roteiro dos shows da cantora, por intolerância com o credo alheio.

Ultimamente, ao cantar Caranguejo, Claudia tem trocado o nome do orixá Iemanjá por Yeshua, nome de Jesus em hebraico. Na apresentação de Claudia Leitte no Festival da Virada na noite de domingo, 29 de dezembro, a cantora excluiu a música do repertório, certamente por estar em palco de Salvador (BA), cidade de onde partiu a denúncia. Mas consta que Caranguejo esteve no roteiro do show apresentado pela artista no Recife (PE) no sábado, 28 de dezembro, com a letra alterada.

Na entrevista coletiva que deu no festival de Salvador (BA), Claudia Leitte se pronunciou com discurso vago – “Esse é um assunto muito sério. Daqui do meu lugar de privilégio, o racismo é uma pauta que deve ser discutida com a devida seriedade, e não de forma superficial. Prezo muito pelo respeito, pela solidariedade e pela integridade. Não podemos negociar esses valores de jeito nenhum, nem os jogar ao tribunal da internet. É isso” – em que, a rigor, nada diz sobre o X da questão: a alteração na letra da música por suposto incômodo com a saudação ao orixá Iemanjá.

Artista que já declarou publicamente ser cristã neopentecostal, Claudia Leitte tem todo o direito de exercer sua fé e de não cantar mais músicas que louvem orixás se entender que a saudação não se afina com a fé que professa. Mas não tem o direito de alterar um verso de música de autoria alheia para suprimir o nome de um orixá na letra dessa música. Ou de qualquer outra música.

Cadê o respeito de que falou ao se pronunciar sobre o caso? A propósito, esse caso já vinha se arrastando desde fevereiro, mas ganhou proporção maior com a abertura do inquérito pelo MP da Bahia. E as denúncias (como a do Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras) são justas, assim como as críticas feitas a Claudia nas redes sociais, no tal “tribunal da internet”.

Até porque cabe lembrar que Claudia Leitte fez nome dentro do universo da axé music, rótulo dado à música afro-pop-baiana que irrompeu em Salvador (BA) em 1985, e que o gênero tem entre os celeiros blocos afros como Ile Aiyê e Olodum. Saudações a orixás das religiões de matriz afro-brasileira são naturais e recorrentes no repertório da axé music. E isso precisa ser respeitado por Claudia Leitte.

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