Em resposta à Mônica Bergamo, na Folha de S.Paulo deste domingo (21), o bispo Robson Rodovalho, líder da igreja “Sara Nossa Terra”, afirma que acredita ser natural o país ter um evangélico na Presidência da República no futuro.
Se não me falha a memória, o Brasil teve seu primeiro presidente protestante na figura do presbiteriano Café Filho, que assumiu o país por pouco mais de um ano após o suicídio de Getúlio Vargas, não tendo sido eleito para a função. O ditador Ernesto Geisel era luterano, mas também não foi eleito pelo voto popular. A grande novidade seria um governante protestante que fosse evangélico neopentecostal e suas liturgias da prosperidade e da cura.
O número de católicos cai (de 63%, em 2010, para 57%, hoje, segundo o Datafolha) e o de evangélicos não apenas cresce em número (de 24% para 28%), mas também em presença na política partidária. Marina Silva, membro da Assembleia de Deus, hoje está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de votos para a eleição presidencial no ano que vem.
E, se por um lado, há parlamentares evangélicos que vociferam contra a dignidade humana, mas outros que atuam na defesa dos direitos das minorias, mesmo nos casos em que há conflito com sua religião. Da mesma forma que ocorre com muitos católicos.
Além do mais, no fundo, isso não tem importado muito. Uma vez chegando ao poder, independentemente de sua crença, políticos atendem às demandas de grupos religiosos conservadores com vistas à chamada governabilidade ou visando às eleições. Por exemplo, o combate à homofobia através da educação avançou pouco na atual administração federal, menos por conta da pressão de deputados da bancada evangélica e mais por esse cálculo político.
A pesquisa Datafolha, deste domingo, mostra que os católicos podem ser menos conservadores que os evangélicos em alguns temas (como a adoção por casais do mesmo sexo), mas ainda assim, na resultante final, a nossa sociedade não se coloca de forma progressista com relação aos direitos individuais.
Particularmente, ficarei chocado no momento em que o Brasil eleger um presidente declaradamente ateu que não precise esconder isso de seu eleitor com medo que o seu caráter seja, estupidamente, julgado por conta disso.
(Tenho certeza que FHC e Dilma são, no máximo, agnósticos não-praticantes. Mas tiveram que ajoelhar e dizer amém. E o agnóstico Getúlio Vargas, que tomara o poder através de um golpe, instituiu o ensino religioso nas escolas públicas, em 1931, em nome da governabilidade.)
O fato é que o Brasil aceitaria mais facilmente alguém que acredita em Deus mesmo com uma fé diferente da sua do que alguém não acredita ou não tem certeza disso.
No dia em que isso ocorrer, creio que atingiremos a maturidade como democracia. Não porque ateus são melhores, longe disso. Mas pelo fato de que teremos compreendido que, se o governante zelar pela dignidade e igualdade de direitos de todas as crenças, sua fé pessoal é tão importante quanto o time de futebol pelo qual torce.
Texto atualizado para incluir a citação sobre Ernesto Geisel e Getúlio Vargas após lembrete de leitores e amigos historiadores.
Fonte: Blog do Sakamoto