Cinco pessoas foram mortas durante a 16ª operação policial do ano no Conjunto de Favelas da Maré, nesta terça-feira, 11 de junho. Uma das vítimas é um policial militar do Batalhão de Operações Especiais, Bope. Outras quatro pessoas são moradores das favelas da Maré. Entre bravatas pedindo que a morte do PM tenha “uma resposta dura” e a realidade de uma população de 140 mil pessoas amedrontadas pelos intensos e incessantes tiroteios que dominaram a manhã de hoje, o que sobra? Pânico, falta de esperança e um rastro de violência numa desastrosa operação que, além de mortes, deixou feridos e mais uma triste marca na história dos moradores das favelas da Maré.
Os relatos em áudios e vídeos enviados por muitos moradores ao longo do dia para a equipe da Redes da Maré nos mostram a dimensão da gravidade do que estava acontecendo: um cenário desesperador, fora de controle, em que o barulho de tiros, bombas e helicópteros transformaram o cotidiano dos moradores das favelas da Maré em uma roleta russa. Segundo a rede pública municipal de ensino, 44 escolas foram fechadas, sendo 2 unidades estaduais e 42 municipais, impactando em torno de 15 mil estudantes. Mais uma vez, o morador que precisou acessar os serviços de saúde também deu com a cara na porta. Algumas unidades suspenderam completamente o atendimento e outras interromperam as visitas domiciliares, prática importante dentro do protocolo de saúde da família para casos de pessoas com doenças crônicas ou impossibilidade de mobilidade.
Além das mortes e a violação ao acesso à saúde e educação, casas foram invadidas, pertences pessoais revirados e até mesmo roubados. Em um dos vídeos recebidos, uma moradora, aos prantos, grava a situação em que policiais deixaram seu quarto todo remexido, com seus pertences retirados do armário e espalhados pelo chão. “Olha isso aqui. É a maior humilhação que já passei na vida. Como é que pode?”. Uma outra pessoa entra na gravação e pergunta: “Destruíram o quarto?”. A vítima segue chorando sem conseguir dar a óbvia resposta exposta no vídeo.
Em outra situação, um homem de 29 anos foi retirado de sua casa, em Salsa e Merengue, por policiais por volta das 15h, após ser agredido na frente dos filhos. A vítima foi colocada em um veículo blindado que se dirigiu até outra favela, a Nova Holanda, onde está localizado o 22º Batalhão da Polícia Militar. Durante quase três horas, a família ficou sem saber onde o rapaz poderia estar e decidiram ir até a delegacia da região, encontrando o homem bastante machucado.
Segundo a nota oficial da Polícia Militar, o objetivo da operação era combater uma quadrilha de roubo de carros. Ao longo do dia, seja em redes sociais ou através da imprensa, a PM soltava informações sobre apreensão de drogas, armas e de pelo menos duas pessoas presas. Para o governo do estado, esse foi o resultado da operação. Para nós, foram cinco vidas perdidas, sete baleados, milhares de estudantes fora da escola, pessoas que não chegaram ao trabalho, gente sem poder ir ao posto de saúde e outros tantos milhares de moradores em pânico dentro da própria casa.
O impacto desta operação policial se estendeu, ainda, para além dos limites das favelas da Maré. A linha Vermelha, a Linha Amarela e a Avenida Brasil, vias expressas importantes do Rio de Janeiro, que margeiam a região, foram paralisadas criando um caos na cidade. Nas redes sociais circularam imagens de pessoas a caminho do trabalho que tiveram de se deitar nessas vias e se escorar em muretas para se proteger. Um ônibus foi incendiado. Muita correria e medo por quem circulava pela manhã nas redondezas. A gente segue questionando, afinal, por que esse modus operandi violento e ineficiente continua sendo praticado nas favelas, causando tanto horror e falta de respeito?
Por fim, não podemos deixar de mencionar a intimidação sofrida por nós, da Redes da Maré neste dia. Recebemos dois telefonemas no prédio central da Instituição, um pela manhã e outro no início da noite, em tom bastante imperativo, colocando em xeque a nossa honestidade e com teor de ameaças, sugerindo algum tipo de associação com redes ilícitas, inclusive citando nomes de pessoas de referências desses grupos.
Infelizmente, a operação continua em algumas favelas da Maré com a presença de policiais do Bope. Temos relatos de que algumas regiões estão sem internet e sem energia. Moradores ouviram da boca de policiais que esta seria uma operação vingança. A noite chega sem sabermos o que nos espera na madrugada e no dia de amanhã.