Stalker: Perseguir uma mulher durante 10 anos não é crime no Brasil

Denúncia contra Adrilles, participante do BBB15, não dá cadeia no Brasil

Especialistas alertam, no entanto, para a importância de se denunciar casos de perseguição

no R7

A denúncia feita por uma blogueira sobre o participante do BBB15 Adrilles — de que ele teria perseguido uma moça durante dez anos — é alvo de debate jurídico no Brasil. A pessoa que realiza essa prática é conhecida como “stalker”, palavra inglesa que significa perseguidor. A questão é que essa conduta, que pode acontecer tanto no mundo virtual quanto fisicamente, não é considerada crime pelo nosso código penal.

O quadro piora principalmente a situação das vítimas. A advogada Luiza Nagib Eluf, que participou junto com mais 14 juristas da elaboração de um novo projeto do código penal, explica que os senadores excluíram da proposta a tipificação da prática como crime.

— Nós, juristas, colocamos como forma de crime e os senadores tiraram. O stalker não é crime no Brasil. Assim como teve dificuldade para criminar o assédio sexual, estamos tendo muita dificuldade convencer os legisladores desse tipo de crime.

Segundo Luíza, a proposta encaminhada em 2012 ainda continua sendo analisada pela comissão de senadores, com algumas tipificações sendo excluídas. Ela explica que além do stalker, o bullyng também foi retirado.

As denúncias contra o escritor Adrilles foram feitas pela blogueira Lola Aronovich. Ela publicou relatos de supostas vítimas de perseguição do participante do BBB. Em uma das declarações, a mulher conta que teve de largar o emprego. A perseguição, que já durava dez anos, apenas teria terminado quando a Justiça determinou que ele mantenha uma distância de 500 metros dela.

Polícia

Mesmo não sendo considerado crime, a mulher pode e deve denunciar a prática à polícia. O titular da Delegacia de Delitos Cometidos por Meios Eletrônicos do DEIC São Paulo, Ronaldo Toccunian, explica que casos de perseguição podem ser enquadrados em outras tipificações de crime, porém com penas mais brandas.

— Se houve prática de infração penal e chegou a ultrapassar uma relação socialmente aceitável, podíamos estar diante de diversos crimes: perturbação do sossego alheio, crimes contra a honra, ameaça, a pessoa deixou de fazer alguma coisa em razão dessas ameaças.

Porém ele ressalta que todos são considerados “delitos de pequeno potencial ofensivo” e não gera uma prisão.

— O juiz vai definir uma pena restritiva de direito, como pagar cesta básica. Eventualmente, numa reincidência, pode aplicar pena restritiva de liberdade.

Os casos de vítimas de stalker também não se enquadram na Lei Maria da Penha, o que impede uma ação imediata da polícia.

— Não é violência doméstica, a não ser que seja marido dela, namorado. [Mas] em geral é um conduta de um estranho e não do parceiro.

Segundo Luíza, o que pode ajudar muito as vítimas é uma reparação civil.

— Entrar com um pedido na justiça civil, um pedido de indenização por dano moral, e pode entrar com uma ação cautelar pedindo que ele não se aproxime dela.

Como age o stalker

O especialista em crimes digitais Wanderson Castillo explica que o stalker costuma se focar apenas em uma pessoa.

— Ele fica sempre mandando e-mail, visualizando o Facebook, deixando comentários pelas redes sociais. A pessoa que está sendo vítima disso, já começa a identificar na primeira semana.

Wanderson conta que, pessoalmente, já cuidou de um caso de uma jornalista no Rio de Janeiro que foi perseguida por um homem de 44 anos. O stalker chegou a deixar 15 mil comentários no perfil da vítima no twitter.

— Ele começou a fantasiar. A pessoa começou a falar já o bairro que ela morava, os lugares que ela frequentava e ela começou a ficar com medo.

De acordo com Castillo, a jornalista entrou com uma ação preventiva para que ele não chegasse perto dela.  O caso aconteceu há dois anos.

— Nós fizemos toda uma investigação e identificamos que o cara era solteiro, tinha esquizofrenia e criou uma paixão platônica em torno da jornalista.

Tem tratamento?

Esse desejo de perseguição é um problema de saúde e precisa ser tratado, como explica a especialista em psicodrama terapêutico Marina Vasconcellos.

— Stalker pode ser uma variação do toque. Você tem uma compulsão de ir atrás para aliviar sua obsessão.

Marina ressalta que não existe uma explicação muito científica para o desenvolvimento deste comportamento, mas que com certeza um stalker é uma pessoa que sempre está buscando atenção e não sabe ouvir não.

— Tem gente que elege um desconhecido, um ator de TV, os atores são muito vítimas disso. Quer que a outra pessoa goste dele, mas é não é correspondido. O exagero é tanto que a pessoa foge.

Para tratar este comportamento obsessivo, é necessário o seguinte conjunto: medicamento e terapia. “O medicamento ajuda o sintoma, mas o problema continua ali, a terapia trata a causa”, resume Marina.

Prevenção

Apesar de não haver uma explicação para que uma pessoa comece a perseguir outra, Castillo afirma que pensar nas postagens antes de escrever, evitar discussões nas redes sociais e selfies exageradas são formas de se proteger.

— [Se] você colocar informações do local físico onde se encontra, está tendo um risco. A criminalidade usa muito as redes sociais.

É importante também que os perfis sejam fechados aos amigos. Se expor demais, pode tornar a pessoa uma isca. Ignorar os comentários ou até mesmo elogios exagerados frequentes é uma saída.

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