Na sexta-antes-do-carnaval, se assanha o bloco carioca Concentra mas não sai. Como exatamente o nome diz, ele é animado por gente que aprecia mais o esquenta-esquenta anterior à folia do que a própria folia. Aquele econtrê, abracê, conversê, beberê abundantes.
A alegria do quase lá é sensação dominante em várias situações. Por exemplo, a data que antecede uma grande viagem. Quando a mala ou mochila é fechada. Quando o friozinho na barriga irrompe de trinta e trinta minutos, e a respiração trabalha um tom acima.
Nunca me esqueço da manhã em que me matriculei na faculdade. Fiz um esforço tremendo para passar no vestibular. Estudei todas as horas daquele ano de cursinho preparatório. Fui ao cinema um único dia dos 365.
A delícia experimentada teve pouco a ver foi com o ato burocrático da matrícula, mas com as horas que a antecederam. Amanheci e vi um futuro glorioso abrindo alas para mim. Imaginei novidades e oportunidades aos meus pés.
Novidades e oportunidades que se provaram muito menores do que as desejadas. Coisa comum na vida. Sempre projetamos mais alto e mais bonito do que a realidade. A imaginação se esparrama na cobertura, enquanto o real se espreme na quitinete.
Talvez resida aí o prazer da véspera. A felicidade daquilo que está na iminência de ser, mas ainda não é. O sorriso radiante das noivas se vestindo de branco. O nervoso do noivo esperando que ela chegue para o sim.
Para os casais grávidos, a escolha do nome da filha ou filho. A ânsia de que nasça perfeitinho. Com cinco dedos em cada mão, dois pulmões e dois rins. E como não imaginar, seja por um segundo, que ela ou ele será mais inteligente do que nós?
Também por isso, na Sapucaí, a área mais animada é a da Concentração. Momento em que os sonhos se agitam e os corações batem no ritmo da bateria da escola. A esperança de um desfile campeão eriça os poros da pele. A voz interior grita: Vai dar, vai dar!
Já na Dispersão, tudo se torna passado. Tem gente que ri, gente que chora. Gente que comemora, gente que lamenta. Mas é claro, para os que falharam resta o consolo – concreto como a redondeza da Terra – de que este carnaval é só a véspera do próximo.
Imagem: Régine Ferrandis.