Tolerância zero ao racismo

Brasil avança no combate à discriminação e a punição por racismo

“A sociedade brasileira está vivendo um processo de construção de igualdade e não tolera mais qualquer tipo de discriminação”. A afirmação é do ministro-chefe da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Eloi Ferreira, em referência ao caso da doméstica que foi xingada de “negra safada” e cuspida pelo comerciante André Luiz Soares Nasser, 35 anos, dentro de um ônibus da empresa Viva Brasília, que fazia a linha L2 Norte/Rodoviária do Plano Piloto, na última quinta-feira.

Nesse caso, segundo o ministro, é possível observar dois aspectos: um positivo e outro negativo. “Pelo lado negativo, lamentamos que depois de 122 anos da abolição da escravatura ainda se presencie fatos como esse que diminui e humilha os negros em detrimento da raça. Por outro lado, podemos destacar positivamente, o fato de os agressores não encontrarem mais guarita da população brasileira. Independentemente de ser negro ou branco, os cidadãos brasileiros exigem respeito e igualdade para todos e o cumprimento da lei”, destaca o ministro.

Eloi Ferreira credita o avanço no combate à discriminação racial por parte da maioria dos brasileiros a vários fatores. Um deles é ação dos movimentos negros existentes no Brasil e que lutam pela igualdade entre negros e brancos. “Esses movimentos, além de denunciar os casos de racismo, chamam a atenção da sociedade para o problema do preconceito racial e despertam a consciência das pessoas para lutarem pelo fim da discriminação entre as raças”, relata Ferreira.

Outro elemento que tem contribuído para diminuir os casos de racismo no Brasil, segundo o ministro, é a efetiva participação dos poderes Legislativo e Judiciário, que juntos têm trabalhado para a punição dos culpados com penas mais severas. Ferreira ainda cita a ação do governo brasileiro, que até criou uma secretaria específica (a Seppir) para coibir casos de discriminação racial. “Ainda estamos longe do ideal que é o respeito mútuo entre todos, mas de qualquer maneira houve um avanço singelo no que diz respeito ao crime racial”, avalia.

O professor e coordenador do Núcleo de Estudos Afrobrasileiros da Universidade de Brasília (UnB), Nelson Inocêncio concorda com o pensamento do ministro Elói Oliveira. O docente, que esteve na 5ª Delegacia de Polícia e presenciou o momento em que o agressor da doméstica foi preso, disse concordar com o ministro Elói Ferreira. “Apesar de lamentar o ocorrido, vejo algo de positivo nesse caso. Percebo que está havendo um crescimento da consciência dos negros no Brasil. Até pouco tempo era impossível imaginar, que mesmo um negro fosse capaz de sair em defesa de outro. Essa atitude era típica de militantes de movimentos negros, o que não foi o caso do rapaz que defendeu a agredida. Vejo que a comunidade negra está muito mais participativa”, analisa Inocêncio.

No entanto, o professor observa que é preciso haver punição exemplar, não só para esse caso, mas, para todos aqueles que envolvem discriminação racial. “Essa definitivamente não é a sociedade em que quero conviver. Precisamos buscar todos os meios possíveis para evitar essas diferenças e estreitar, cada vez mais, as relações entre negros e brancos”, defende o professor.

Já o juiz aposentado e professor de Direito Penal da Universidade de Brasília (UnB), Pedro Paulo Castelo Branco, acredita que os crimes de racismo no Brasil são resultados de um preconceito enraizado que precisa ser combatido. Ele aconselha as vítimas a não se intimidarem diante dos agressores e a buscarem sempre a punição dos culpados como forma de mostrar que existe lei para esses delitos.

Na opinião da psicóloga Sueli Guimarães, o crime contra a doméstica foi emocionalmente muito forte e pode trazer para a agredida vários transtornos psicológicos graves como depressão, dificuldade de se aceitar e de conviver com outras pessoas. “Isso sem dúvida afetou a auto-estima dela. É como se ela não pudesse ter o direito de ser quem é, e o fato de ser negra tirasse dela o direito de ser respeitada como qualquer outra pessoa”, avalia a psicóloga.

No caso específico, a especialista avalia que a situação de humilhação pela qual passou a doméstica foi amenizada pela solidariedade dos passageiros, do motorista que conduziu o ônibus até a delegacia e da própria policia que prendeu o agressor. “Esse apoio foi fundamental para a vítima perceber que quem cometeu um crime não foi ela, e sim, o agressor”, enfatiza.
Quanto ao fato de a família do racista ter alegado que ele sofre de problemas psiquiátricos, Sueli Guimarães opina que esse argumento não justifica a agressão e o tamanho da humilhação e constrangimentos impostos a doméstica. “Se ele realmente tiver esse tipo de problema, precisa ser tratado para que haja um controle do comportamento social e iniba outros criminosos a usar esse tipo de desculpa”, pondera Sueli.

 

A diferença entre injúria e racismo

A injúria racial é cometida quando a ofensa de conteúdo discriminatório é empregada à pessoa (ou pessoas) determinada. Exemplo: chamar alguém de negro fedorento, judeu safado, alemão azedo etc. É crime previsto no artigo 140, parágrafo 3º do Código Penal Brasileiro. O réu pode responder em liberdade, desde que ele pague a fiança. Há lesão da honra subjetiva da vítima
Já o de racismo está previsto no artigo 20 da Lei nº 7.716/89. É aplicado quando as ofensas não são direcionadas à pessoa, e sim quando elas menosprezam determinada raça, cor, etnia, religião ou origem. Exemplo: negar emprego a uma pessoa por causa da cor da pele ou por ela seguir uma doutrina. O crime de racismo é imprescritível e inafiançável. Nesse tipo de delito há a lesão do princípio da dignidade.


PENALIDADES

A pena para os dois casos varia de um a três anos de reclusão, além de multa estipulada pelo juiz.

 

COMO DENUNCIAR
Denúncias de racismo podem ser feitas pelo telefone 0800-6441508 ou na ouvidoria da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República pelo número 3411-3695

 

 

Fonte: Tribuna do Brasil

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