Praça da Matriarca – São Paulo – 8 de Março de 2010 – 10h
Em 2010, ano em que celebramos o centenário do Dia Internacional da Mulher, voltamos a ocupar as ruas de São Paulo para comemorar o já conquistado nesta história de mobilização coletiva, mas também mostrar que a luta por autonomia, igualdade e direitos segue atual e necessária. Bandeiras históricas como a socialização do trabalho doméstico, salário igual para trabalho igual, o combate à violência, a reivindicação de creches para todas as crianças e o direito ao aborto continuam na ordem do dia do nosso movimento. Seguimos batalhando para mostrar, a cada 8 de Março, o quanto nossa sociedade ainda precisa avançar em relação aos direitos das mulheres.
Historicamente, as mulheres saem às ruas não apenas para reivindicar em causa própria. A luta contra as guerras e a militarização; por uma forma mais democrática de fazer política; pela sustentabilidade do planeta e pelo acesso à saúde, educação, moradia e transportes são pautas que não estão descoladas das bandeiras feministas, que por si só são questionamentos ao modelo de sociedade capitalista na qual vivemos.
Neste 8 de março, em particular, denunciamos a violência e a criminalização da pobreza, disseminadas em São Paulo pelos governos do prefeito Gilberto Kassab e do governador José Serra, que não dialogam com os movimentos sociais. A falta de investimentos em infra-estrutura nas grandes cidades e de um programa digno de moradia popular, associada às recentes enchentes, atinge diretamente e com mais gravidade a população das periferias, em sua maioria negra, especialmente a grande parcela de mulheres chefes de família e seus filhos.
Enquanto isso, o oligopólio da mídia colabora com a criminalização dos movimentos sociais, que aumenta com a onda crescente de conservadorismo no Brasil, evidenciada pelas duas tentativas de instalação de uma CPI para investigar o MST. Os grandes jornais e programas de TV omitem as ações dos que lutam para melhorar as condições de vida da população pobre, omitem a participação das mulheres, dos jovens, dos negros, suas formas de ver a vida e a política, ao mesmo tempo em que fazem a propaganda dos valores capitalistas e dos políticos que os defendem.
Nossas lutas também não se restringem ao plano nacional. Nos solidarizamos com as mulheres do Haiti, cujo caso é emblemático. São séculos de colonização, exploração e, nos últimos anos, militarização do país. Após o terremoto que atingiu o Haiti, é necessário que a solidariedade prestada aquele povo seja realmente humanitária, com o envio de profissionais de saúde, de educação, de engenharias, para ajudar a reconstrução do país. Defendemos um Haiti livre de violências, principalmente sobre as mulheres.
Nestes 100 anos de 8 de Março, ainda temos muito por que lutar! Junte-se a nós contra a violência à mulher, em defesa da legalização do aborto, por igualdade no mundo do trabalho e por maior participação nos espaços de poder. Nossa luta por autonomia, igualdade e direitos ainda tem muito a conquistar e sua participação é muito importante!
Combate à Violência
Nós, mulheres, somos alvo dos mais diversos tipos de violência, desde a de guerra, em decorrência de ocupações militares, à violência sexual e doméstica. A Lei Maria da Penha representou um avanço, mas ainda sofre inúmeros obstáculos para ser de fato implementada e legitimada. Em 2010, 9 mulheres foram assassinadas após registrarem denúncia. Fatos como esses evidenciam que ainda vigora a idéia de que as mulheres são propriedade dos homens e reafirmam a urgência de acabar com a violência doméstica, como uma questão que afronta o direito à vida, assegurado na Constituição. Reivindicamos que o Estado assegure abrigos para as vítimas de agressões e seus filhos e garanta a sua integridade física e psicológica.
Legalização do aborto
O aborto é a quarta causa de mortalidade materna no Brasil, onde 25% das gestações são indesejadas e metade delas termina em abortamento provocado. Apesar disso, houve um avanço do conservadorismo em relação a essa bandeira nos últimos anos. Em 2009, foi ensaiada a instauração da CPI do Aborto; a Igreja Católica excomungou família e médicos que realizaram aborto legal em uma menina de 9 anos estuprada pelo padrasto; o Acordo Brasil-Vaticano, que ameaça ao caráter laico do Estado brasileiro, foi ratificado. Além disso, a dona de uma clínica de MS acusada de realizar abortos cometeu suicídio e 4 funcionárias serão levadas a júri. Por fim, tivemos o recuo do governo Lula acerca da diretriz que afirma a autonomia da mulher em decidir sobre seu corpo no Programa Nacional de Direitos Humanos. Não é a Igreja ou o Estado que devem decidir se uma mulher vai ou não ter filhos. Este é um tema de saúde pública, onde o Estado deve garantir acompanhamento médico e psicossocial para quem escolher interromper a gravidez.
Valorização do Trabalho
O reconhecimento do trabalho feminino e a divisão sexual do trabalho estão no centro do debate sobre a autonomia econômica das mulheres. Ainda hoje é desconsiderado economicamente o trabalho na esfera privada, que ocorre nos lares, realizado em maioria por nós. Em média, a mulher trabalha 16 horas por dia; a maior parte não remunerada, a outra, sub-remunerada. Mesmo com maior escolaridade, recebe em média 71% do salário masculino. A dimensão racial aprofunda a desigualdade: segundo o IBGE, em 2003 as negras e pardas recebiam salários 51% menores do que as brancas. Na crise econômica, as mulheres foram as mais atingidas, pois estão inseridas da forma mais precária no mercado de trabalho, predominando em profissões como empregadas domésticas e operadoras de telemarketing. Também foram as principais afetadas pelas reformas trabalhista e previdenciária. Sem mencionar que a dependência econômica da mulher é um dos fatores que dificulta sair de uma situação de violência doméstica. Precisamos superar esta lógica, garantindo igualdade de acesso e remuneração no mercado de trabalho e a valorização do trabalho doméstico.
Participação política
No ranking da ONU em relação aos espaços de poder ocupados por mulheres, o Brasil ocupa a 162ª posição, à frente apenas do Haiti, Colômbia e Belize. Enquanto na Argentina 45% do Parlamento é composto por mulheres, aqui representamos menos de 10%. Nunca uma mulher ocupou sequer um cargo na mesa diretora da Câmara dos Deputados. Isso também acontece na direção dos sindicatos, partidos, organizações e até em movimentos sociais. Defendemos que a participação política da mulher não se restrinja às esferas de poder institucional. Assumir-se como sujeito histórico requer que sejamos autônomas, independentes e livres. E é preciso garantir que as mulheres que nos representem tenham compromisso com a luta feminista e a defesa da igualdade, autonomia e dos direitos das mulheres.
Sobre o 8 de Março
Em 1910, a socialista alemã Clara Zetkin propôs, na 2a Conferência Internacional das Mulheres Socialistas, a criação do Dia Internacional da Mulher, que seguiu sendo celebrado em datas diferentes, de acordo com o calendário de lutas de cada país. A ação das operárias russas no dia 8 de março de 1917, precipitando o início das ações da Revolução Russa, é a razão mais provável para a fixação desta data como o Dia Internacional da Mulher. Com a revolução, muitos direitos foram pioneiramente conquistados, como o voto e elegibilidade feminina e o direito ao aborto. A partir de 1922, a celebração internacional é oficializada neste dia. Essa história se perdeu nos grandes registros históricos, mas faz parte do passado político das mulheres e do movimento feminista de origem socialista no começo do século passado. Numa era de grandes transformações sociais, o Dia Internacional da Mulher transformou-se no símbolo da participação ativa das mulheres para transformarem a sua condição e a sociedade como um todo.
Organização do 8 de Março de 2010 em São Paulo
Articulação Brasileira de Mulheres; Articulação Mulher e Mídia; Associação Nacional de Pós-Graduandos; Campo Barricadas Abrem Caminhos; Campo Contraponto; Campo Romper o Dia; Casa Cidinha Kopkac; Casa Helenira Rezende; CA 22 de Agosto (Direito PUC/SP); C A Benevides Paixão (Comunicação PUC/SP); CAPPF (Pedagogia USP); Centro de Estudantes de Santos; Centro Informação Mulher; Ciranda; Círculo Palmarino; CLADEM; Coletivo Alumiá; Coletivo de Mulheres Ana Montenegro; Coletivo Guerrilha Feminista de Campinas; Coletivo Dandara (Direito USP); Coletivo de Mulheres da Baixada Santista; Confederação de Mulheres do Brasil; Consulta Popular; DCE Unicamp; DCE USP; Educafro; ENECOS; Espaço Cultural Carlos Mariguela; Facesp; FASUBRA; Federação de Mulheres Paulistas; Fórum Centro Vivo; Frente de Luta por Moradia; Gmel; Grupo Mal-Amas de Teatro; Grupo Wendo-SP; Hip Hop Mulher; KALS (Koletivo Anarquista e Libertário de Santos); Intersindical; Intervozes; Instituto Zequinha Barreto; Jovens Feministas de SP; Liga Brasileira de Lésbicas; Marcha Mundial das Mulheres; Movimento de Mulheres Jóia Rara; Movimento de Mulheres do ABC; Movimento pelo Direito a Moradia; Núcleo de Defesa e Convivência da Mulher Viviane dos Santos; Observatório da Mulher; Oposição dos Jornalistas – Sindicato é para Lutar; Oriashé; Promotoras Legais Populares-SP; Secretaria da Mulher Trabalhadora da CUT; Secretaria da Mulher Trabalhadora da CTB; Secretaria da Mulher Trabalhadora da CTB-SP; Secretaria de Mulheres do PCdoB; Secretaria de Mulheres do PT; Secretaria de Mulheres do PsoL; Sindicato dos Bancários de Santos; Sindicato dos Condutores; Sindicato dos Psicólogos; Sindicato dos Químicos Unificados – Campinas e Região; Sindiradialistas; Sintratel; SOF – Sempreviva Organização Feminista; UBES; União Brasileira de Mulheres; UEE; UJS (União da Juventude Socialista); União dos Movimentos de Moradia; UNE; UNEGRO; UPES; União de Mulheres de São Paulo; União da Moradia SP; União Popular de Mulheres do Campo Limpo.
Fonte: EXPRESSÃO FEMINISTA