13 de Maio – Os Contra a abolição

Palácio dos Arcos

O domingo da vitória no Senado

Proposta foi aprovada ontem, em sessão extraordinária, sem dificuldades

As atenções da Corte se voltaram, no sábado e no domingo, 13 de maio, para o Senado do Império, onde se processava a discussão final do Projeto de Lei nº 1 da Câmara dos Deputados, que baniu de forma imediata e incondicional a escravidão no território brasileiro. A proposta foi aprovada sem dificuldades pela Casa. Apenas dois senadores, os conservadores, João Maurício Wanderley, o Barão de Cotegipe (BA), e Paulino de Sousa (RJ), o Segundo Visconde do Uruguai (RJ), se posicionaram contra a abolição.

Logo após a leitura da proposta na sessão do último dia 11, pelo 1º vice-presidente do Senado, Antônio Cândido da Cruz Machado, que exercia a Presidência da Casa, o líder do liberalismo abolicionista, senador Manuel Pinto de Sousa Dantas (BA), solicitou que fosse nomeada a comissão especial de cinco membros destinada a dar o parecer sobre o projeto.

A solicitação foi acolhida sem debate e Cruz Machado nomeou para compor o colegiado os senadores Sousa Dantas, Affonso Celso (pai), o Visconde de Ouro Preto (MG), Jerônimo José Teixeira Júnior (RJ), José Antônio Correia da Câmara (RS) e Alfredo Escragnolle Taunay (SC).

A comissão apresentou imediatamente o parecer, destacando que a proposta continha “providência urgente, por inspirar-se nos mais justos e imperiosos intuitos” e satisfazia “a mais e mais veemente aspiração nacional”.

 

Aprovação

No sábado dia 12, durante a segunda discussão, Cotegipe fez longo pronunciamento contrário à proposta, que foi aprovada domingo, dia 13, em sessão extraordinária.

Na direção dos trabalhos da Casa, o senador Cruz Machado designou a comissão que levaria o projeto ao Paço e que foi composta pelos membros da comissão que ofereceu o parecer e ainda por outros nove senadores.

O senador e presidente do Conselho de Ministros João Alfredo (PE) comunicou, então, ao Plenário da Casa que Sua Alteza a Princesa Regente receberia às 3 horas da tarde, no Paço da Cidade, a comissão de senadores que levaria o decreto da Assembléia Geral declarando extinta a escravidão no Brasil.

Os pronunciamentos dos contra a abolição:

“A lei reconhece como propriedade e matéria tributável o escravo”

“A verdade é que vai haver uma perturbação enorme no País durante muitos anos, o que não verei talvez, mas aqueles a quem Deus conceder mais vida, ou que forem mais moços, presenciarão.”

A previsão sombria foi feita pelo senador Barão de Cotegipe, ao desferir críticas ao projeto da abolição.

Para o senador, “ninguém acreditará no futuro que se realizasse com tanta precipitação e tão poucos escrúpulos a transformação que vai aparecer”.

A principal crítica de Cotegipe se referia ao fato de que a proposta não previa indenização aos proprietários de escravos.
Afirmando que a propriedade sobre o escravo era uma criação do direito, ele enfatizou que “a Constituição, a lei civil, as leis eleitorais, as leis de fazenda, os impostos etc., tudo reconhece como propriedade e matéria tributável o escravo, assim como a terra”.

Com a abolição, segundo Cotegipe, estaria se decretando que no país “não há propriedade, que tudo pode ser destruído por meio de uma lei sem atenção nem a direitos adquiridos nem a inconvenientes futuros”.

– Entendo que grandes males vão surgir dessa medida, que convém que sejam, o quanto antes, tomadas providências em benefício não só da lavoura, como também dos que vão ser libertados.

“Medida arriscadíssima para a ordem social e econômica da Nação”

Repetindo argumentos do Barão de Cotegipe e do deputado Andrade Figueira contra a abolição, o senador Paulino de Sousa (RJ) afirmou que a proposta era “inconstitucional, antieconômica e desumana”, porque deixaria “expostos à miséria e à morte os inválidos, os  enfermos, os velhos, os órfãos e crianças abandonadas da raça que quer proteger”.

Apontando o projeto da abolição como algo “arriscadíssimo para a ordem social e econômica da Nação”, o senador criticou também o “trânsito pressuroso” da matéria na Casa. Na sua avaliação, o elemento servil era o “único trabalho organizado em quase todo o País, que não podia ser tão rápida e subitamente suprimido”.

Paulino disse que, para a emancipação dos escravos das colônias francesas, a partir de 1848, foi observado um prazo de dois meses, contados da promulgação do ato, e garantido fundo para indenização aos proprietários.

– Devo dizer que iludem-se ou querem iludir-se os que acreditam remover uma grande dificuldade com esta lei da abolição do elemento servil; pelo contrário, é agora que recressem, com a desorganização do trabalho e com a entrada de 700 mil indivíduos não preparados pela educação e pelos hábitos da liberdade anterior para a vida civil, as contingências previstas para a ordem econômica e social.

“Não há perigo algum. Esta lei vale por uma nova Constituição”

Contestanto os senadores Paulino e Cotegipe, o senador Sousa Dantas (BA) afirmou da tribuna que a abolição não marcará no Brasil “uma época de miséria, de sofrimentos e de penúria”.

Dantas manifestou a convicção de que “o desaparecimento de 600 mil criaturas escravas”, em vez de produzir “a nossa ruína”, tornará o Brasil mais próspero, graças ao trabalho livre.

– Não há, portanto, perigo algum, e até onde a minha voz, a minha responsabilidade, a confiança que eu possa inspirar aos meus concidadãos, até onde a minha experiência dos negócios, o meu estudo de todos os dias me puderem dar alguma autoridade, eu direi desta cadeira a todo o Brasil que nós, hoje, vamos constituir uma nova Pátria, que esta lei vale por uma nova Constituição – sustentou.
Sousa Dantas declarou ainda que a votação proposta representava o maior acontecimento da história do País, e, ao concluir, recitou estes três pequenos versos do século 13:

“O’ libertad!

Luz del dia!

Tu me guia”.

Acordo quase unânime garante “força moral e prestígio” à decisão

Em resposta aos argumentos de que a abolição deverá acarretar transtornos, o senador Manuel Francisco Correia (PR) afirmou que “não se extirpa do organismo social um cancro secular sem que perturbações se operem”.

Mas o senador conservador disse acreditar na “cicatriz de uma ferida” que nunca mais será aberta, possibilitando então a “prosperidade da Pátria”.

– É grande fortuna para o Império que a lei possa ser promulgada, revestida de força moral e do prestígio que lhe dá o acordo refletido e quase unânime de ambas as parcialidades políticas – finalizou.

Fonte: Transcrição do documento em PDF chamado “Encarte Abolição” publicado pelo Senado.

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