Número cresceu quando comparado ao último censo. Em 2006, mulheres eram 13% dos produtores
Por TÁCIO LORRAN, do Metrópoles
Sandra Pereira de Farias, 48 anos, trabalha como produtora rural em um assentamento em Silvânia, município no interior de Goiás. Diariamente, vai ao campo cuidar dos 2 hectares de uva, 1,5 de banana-maçã, além de milho, mandioca, frango e porco. “De tudo um pouco”, como ela diz.
“Eu me identifico como uma agricultora-familiar-raiz. É aquela que trabalha, que pega no pesado dia a dia”, detalha Sandra, ao destacar, com orgulho, que o assentamento São Sebastião, onde mora, foi levantado pela reforma Agrária. Ela está há 19 anos no local e nunca morou na cidade.
Sandra não é a única produtora no país. O número de mulheres responsáveis pelas decisões no uso dos recursos da fazenda, contudo, é relativamente baixo quando comparado ao de homens. Apesar da diferença de gênero, elas têm ganhado cada vez mais reconhecimento dentro da agricultura.
É o que mostra o Censo Agro 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), lançado na última sexta-feira (25/10/2019). De acordo com a pesquisa, existem ao todo pouco mais de 5 milhões de produtores. Desses, 4,1 milhões são homens e 950 mil são mulheres. Ou seja, apenas 18,7% do total são do sexo feminino; 81%, do sexo masculino; e em 0,3% dos casos a responsabilidade pela direção do estabelecimento é do administrador.
Se comparado ao último Censo Agro, contudo, o número de produtoras aumentou sete pontos percentuais. Realizado em 2006, o estudo apontou que, na época, apenas 13% desses profissionais eram do sexo feminino.
“Há uma tendência de as mulheres estarem assumindo o domicílio”, explica Antônio Carlos Florido, gerente técnico do Censo Agropecuário. “Pode ser também o envelhecimento natural do produtor, o aumento da busca por trabalho por fora, pode ser a filha do produtor que cresceu e assumiu a propriedade”, prossegue.
Para o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Aristildes Santos, a evolução é pequena para a realidade. “Está crescendo, mas ainda não no percentual que a gente esperava”, avalia. A organização luta pelos direitos de homens e mulheres do campo.
“Na verdade, a produção pertence aos dois. Têm muitas terras, negócios feitos, que mesmo após o casamento continuam só no nome do homem. Isso é a cultura. Por outro lado, as mulheres já começam a perceber o espaço delas, estão participando cada vez mais”, completa Aristildes.
Discriminação
Antônio Carlos Florido destaca que o Censo Agro 2017 contabilizou, pela primeira vez, se a direção dos trabalhos era compartilhada pelo casal. Nesse caso, 1 milhão das propriedades têm a direção feita em conjunto, o que representa 20% do total. Como sexo do cônjuge, 817 mil são mulheres e 212 mil, homens.
“Podemos concluir, então, que na direção dos trabalhos existem as 946 mil produtoras e mais as 817 mil que participam da direção do estabelecimento de forma compartilhada com o cônjuge”, conclui o relatório.
É o caso de Sandra. A agricultora conta com a ajuda do esposo, filhos e netos. Mas o trabalho mais difícil da produtora acontece fora do campo: a luta pelos direitos das mulheres agricultoras. Ela relata que já se sentiu discriminada várias vezes apenas por ser produtora rural. Mas anda de cabeça erguida.
“Falam que lugar de mulher é ficar atrás de fogão, cozinhando, que mulher não tem que ficar dentro de curral. Aí eu falo: ‘só se for a sua! Porque eu vou para o curral, para a vinha, tiro leite, trabalho de trator, de caminhonete, com ou sem enxada’”, detalha Sandra. “É doído”.
Segundo a produtora, as mulheres trabalham tanto quanto os homens, contudo, não são reconhecidas. “A discriminação vem principalmente das mulheres, dos trabalhadores rurais em si, mas devagarinho a gente vai mostrando que não é realmente isso que acontece”, prossegue.
O presidente da Contag completa ao dizer que o movimento de reconhecimento do trabalho feminino começa na relação com a família. “O nosso maior movimento de massa nos campos são as mulheres. Elas lutam para ter direito de igualdade. E isso começa na relação com a família”, conclui Aristildes.
Educação
O Censo Agro 2017 revela ainda que o número de mulheres analfabetas é maior que o de homens. De acordo com a pesquisa, 22,6% dos homens não sabem ler e escrever; as mulheres são 24,8%. Se comparado ao restante do país, o censo se inverte. Há mais homens analfabetos do que mulheres.
“Me surpreendeu. Há 30 anos, se as pessoas do campo tinham dificuldade em ir à escola, imagina as mulheres. Os pais tinham mais dificuldade de liberar as mulheres na época”, avalia Aristildes Santos.
Sandra concorda, mas destaca que o número de analfabetas tem diminuído graças ao avanço da internet. Durante o trabalho na plantação de uva, por exemplo, a produtora afirma que sempre quando precisa vai buscar informações na internet. “Estou aprendendo”, completa. Ela garante que isso favoreceu as mulheres.
Com relação ao acesso à internet, o crescimento é igualmente relevante. No Censo 2017, 1,4 milhão de produtores declararam ter acesso à internet. Desses, 659 mil através de banda larga, e 909 mil, via internet móvel. Em 2006, o total de estabelecimentos agropecuários que tinham acesso à internet era de apenas 75 mil