Após 50 anos, IBGE volta a usar o termo favela no Censo

Instituto vinha usando expressões como 'aglomerados urbanos' ou 'aglomerados subnormais'. A partir de 2022, definição passa a ser 'favelas e comunidades urbanas', após demanda de moradores.

FONTEG1, por Artur Nicoceli, Gabriel Croquer
A favela Sol Nascente, no Distrito Federal — Foto: Jorge William/Agência O Globo

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) anunciou nesta terça-feira (23) que voltará a usar o termo “favelas e comunidades urbanas brasileiras” para se referir a esses locais no Censo.

A mudança ocorre 50 anos após o IBGE começar a usar as expressões “aglomerados urbanos excepcionais”, “setores especiais de aglomerados urbanos” e “aglomerados subnormais” como o termo principal para se referir a esses locais.

A alteração decorre, entre outros fatores, da demanda dos moradores de favelas e comunidades urbanas. Segundo o IBGE, o termo favela está vinculado à reivindicação histórica por reconhecimento e identidade de movimentos populares .

O instituto afirma que o complemento “comunidades urbanas” foi acrescentado porque, em muitos locais, o termo “favela” não é o mais utilizado – há, por exemplo, áreas chamadas de comunidades, quebradas, grotas, baixadas, alagados, vilas, ressacas, mocambos, palafitas, loteamentos informais e vilas de malocas.

O Brasil tem mais de 10 mil favelas e comunidades urbanas, em que vivem 16,6 milhões de pessoas (8% da população brasileira), segundo a prévia do Censo de 2022.

“O reconhecimento das favelas pelo IBGE é um marco histórico para a população brasileira. É um reconhecimento da existência das favelas, da nossa força, da nossa potência”, completa Kalyne Lima, presidente da Central Única das Favelas (CUFA Brasil).

O que são favelas e comunidades urbanas?

Para o IBGE, favelas e comunidades urbanas são regiões em que há:

  • Domicílios com graus diferenciados de insegurança jurídica da posse;
  • Ausência ou oferta incompleta e/ou precária de serviços públicos, como iluminação, água, esgoto, drenagem e coleta de lixo por parte de quem deveria fornecer esses serviços;
  • Predomínio de edificações, arruamento e infraestrutura geralmente feitos pela própria comunidade, seguindo parâmetros diferentes dos definidos pelos órgãos públicos;
  • Localização em áreas com restrição à ocupação, como áreas de rodovias e ferrovias, linhas de transmissão de energia e áreas protegidas, entre outras; ou de risco.

De ‘ocupação irregular’ para ‘insegurança jurídica

As definições acima também são diferentes das que eram utilizadas anteriormente para definir favelas e comunidades urbanas.

Por exemplo, antes, em vez de dizer que as favelas e comunidades urbanas são caracterizadas por locais em que a população não tem segurança jurídica da posse de seus imóveis, o instituto dizia que eram locais com “ocupação irregular de terra em propriedades alheias (pública ou privada)”.

O IBGE destaca que há diversos níveis de insegurança jurídica, e que cabe ao Estado proteger contra despejos arbitrários.

Outro que mudou é o que trata da falta de serviços públicos. Antes, o IBGE a descrevia como “precariedade de serviços públicos essenciais”. Agora, a descrição destaca o papel das instituições competentes na oferta desse serviços de forma adequada.

“[Isso] Evita rotular favelas como intrinsecamente carentes, alertando para a necessidade de focar na oferta precária de serviços públicos essenciais, em vez de qualificar as comunidades como deficientes por si mesmas”, diz o IBGE.

Também foi alterada a forma de se referir aos padrões de construção do que existe nas favelas. Antes, por exemplo, dizia-se que as comunidades eram caracterizadas por calçadas de “largura irregular” por construções não regularizadas pelo poder público. Agora, fala-se na existência majoritária de imóveis, ruas e infraestrutura construídos pela própria população com parâmetros distintos dos estabelecidos pelos órgãos públicos.

“Buscou-se evitar a estigmatização das favelas e comunidades urbanas com essa mudança (…) Essas populações desenvolveram lógicas próprias de organização espacial, que exigem reconhecimento de suas especificidades”, informa o IBGE.

Sol nascente, maior favela do Brasil

A maior favela do Brasil é a Sol Nascente, que fica no Distrito Federal, segundo dados da prévia do Censo 2022. A região ultrapassou a Rocinha, no Rio de Janeiro, em número de domicílios (32 mil ante 31 mil).

Veja, abaixo, a lista das maiores favelas e comunidades urbanas do Brasil, segundo a prévia do Censo do IBGE

  • Sol Nascente, Brasília: 32.081
  • Rocinha, Rio de Janeiro: 30.955
  • Rio das Pedras, Rio de Janeiro: 27.573
  • Beiru, Tancredo Neves: Salvador: 20.210
  • Heliópolis, São Paulo: 20.016
  • Paraisópolis, São Paulo: 18.912
  • Pernambués, Salvador: 18.662
  • Coroadinhoa, São Luís: 18.331
  • Cidade de Deus/Alfredo Nascimento, Manaus: 17.721
  • Comunidade São Lucas, Manaus: 17.666
  • Baixada da Estrada Nova Jurunas, Belém: 15.601
  • Alto Santa Teresina – Morro de Hemeterio – Skylab-Alto Zé Bon, Recife: 13.040
  • Assentamento Sideral, Belém: 12.177
  • Jacarezinho, Rio de Janeiro: 12.136
  • Valéria, Salvador: 12.072
  • Baixadas da Condor, Belém: 11.462
  • Bacia do Una-Pereira, Belém: 11.453
  • Zumbi dos Palmares/Nova Luz, Manaus: 11.326
  • Santa Etelvina, Manaus: 10.460
  • Cidade Olímpica, São Luís: 10.378
  • Colônia Terra Nova, Manaus: 10.036

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