Yasmin Castelo, 11 anos de idade, sente na pele a dificuldade de ser protagonista na sua profissão. Atriz e modelo fotográfica há três anos, já percebeu que ainda vai receber mais vezes a palavra “não” do que “sim” na hora de concorrer a uma vaga para divulgar algum produto. Mesmo com maioria brasileira – segundo o IBGE, 53,6% da população é formada por pessoas que se autodeclaram pretos e pardos – o país ainda reage com preconceito a se ver no espelho em comerciais. Campanha de O Boticário para o Dia dos Pais, estrelada por uma família composta apenas por negros, dividiu opiniões e gerou comentários como: “Me tire uma dúvida. Boticário só fabrica perfumes para afros? Acho que estou usando a marca errada”.
Mas Yasmin, que mora e trabalha em Pernambuco, representa uma nova geração que quer ser mais do que representada. “Não me importo se eu levar um ‘não’ por causa da cor da minha pele ou do meu cabelo. Posso levar vários ‘nãos’, mas eu sei que uma hora vou ganhar um ‘sim’, porque gosto do que faço. Está tudo bem ser assim, é normal sermos diferentes”. Yasmin é negra e seu empoderamento veio desde cedo. Quando tinha 5 anos, disse para a mãe que queria ser modelo.
Conhecendo bem a filha que tem e o talento em potencial da menina, Valdelânia Castelo não teve como dizer não. Com receio dos preconceitos ou discriminações, ela passou a acompanhar os trabalhos e ensinar Yasmin a lidar com qualquer tipo de situação que envolva sua cor ou o seu cabelo. Batom rosa com glitterinado no sorriso largo, a atriz ajeita a trancinha lateral que destaca seus cachos volumosos e comemora por nunca terem pedido em nenhum job que alisasse o cabelo. “Eu amo, é assim que eu sou e me aceito desta forma”.
Indo na contramão da intolerância e batendo de frente contra o preconceito, Yasmin abre caminhos. Na agência em que trabalha há três anos no Recife, a T.C Fashion, apenas 10% do casting é composto por negros. Entre seus colegas de trabalho, Felipe Cândido, hoje com 36 anos, vivenciou uma realidade mais dura quando começou a trabalhar como modelo e ator. A facilidade de comunicação lhe abriu as portas para o mundo fashion, mas ao longo do caminho se deparou com muitas respostas negativas em testes de trabalho. “Até que eu levava numa boa, mas me solidarizava com minhas amigas negras que eram muito rejeitadas nos testes e não conseguiam aceitar”, afirma.
A experiência vivida por Felipe e suas antigas colegas de passarela é comprovada em números. Uma pesquisa divulgada no dia 14 de julho pela Agência Heads revela as cores da propaganda brasileira. Os comerciais ainda representam uma sociedade branca, que não é a maioria do Brasil e as peças divergem da diversidade real dos povos brasileiros. No estudo foi comprovado que as marcas estão em evolução, mas ainda reforçam alguns estereótipos comprovando a sensação de não-pertencimento da população negra ao restante do país. Eles têm voz, são muitos e querem se enxergar nas propagandas e comerciais.
Para a diretora de planejamento da Heads e responsável pelo estudo, Isabel Aquino, o mercado publicitário precisa se reformular. “Considerando que quase 54% da população brasileira se declara negra, percebemos que estamos muito distantes de um ideal de equidade. A publicidade ainda é racista: dentre os coadjuvantes, os negros são maioria. Mas o que se quer é protagonizar. É ter voz”, afirma.
Com pelo menos 15 anos de mercado, Felipe tornou-se uma espécie de guia para os jovens negros que trilham um caminho na propaganda no Recife. Hoje trabalhando como fotógrafo e filmmaker, decidiu ir para atrás das câmeras registrar a diversidade da beleza brasileira. Como a de Yasmin, que não quer ser minoria contrária à realidade nacional. “Meu maior sonho é estrelar como atriz em uma novela que retrata o Brasil como ele verdadeiramente é, ou pelo menos, como ela o enxerga”.
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