Artigo publicado na Revista Inglesa When Saturday Comes
A coisa mais notável sobre o titulo nacional que o Flamengo conquistou no ultimo fim de semana não é a espera de 17 anos e nem o inesperado verão ensolarado na outonal carreira do meio-campista sérvio Dejan Petkovic. A grande surpresa é que o clube tem Jorge Luís Andrade, um técnico negro. O gato-mestre da SporTV Telmo Zanini considerou o fato um marco e declarou: Esperamos que seja um dia histórico para o futebol brasileiro e ajude a abrir portas para técnicos negros. Como Andrade foi aclamado como o primeiro técnico negro a vencer o Campeonato Brasileiro alguns torcedores rubro-negros lembraram que Carlinhos, o técnico do último título em 1992 foi o primeiro. Mas Carlinhos é geralmente visto como mestiço.
O tema da identidade racial – e quem é classificado como negro – no Brasil, reflete o preconceito generalizado enfrentado pelos técnicos negros. Esse é a sexta vez em que Andrade comanda o Flamengo, e era a terceira opção do clube. Mas foi a primeira vez que ele foi contratado como técnico titular, e não interino. Eleito o treinador do ano, aplaudido por armar um improvável Flamengo campeão combinando os talentos vagabundos de Adriano, Petkovic and Zé Roberto. Andrade foi criticado quando efetivado, com muitos esperando que o Flamengo contratasse um grande nome. O que significa dizer um salário maior, equipe técnica cara e, quase invariavelmente, um branco. Nenhum dos outros times da Serie A é treinado, o que a mídia brasileira parece reconhecer, por um negro.
O próprio Andrade reconhece o problema. “Muitos pensavam que eu não era capaz de fazer um bom trabalho, e aí está a questão da cor. No Brasil nós temos poucos treinadores negros.” Isso se aplica até em clubes como Flamengo e Vasco que são a linha a de frente na quebra de barreiras para os jogadores negros há mais de 70 anos.
Os clubes do Brasil, afogados em dívidas, parecem mais dispostos a colocar dinheiro na elite branca dos técnicos do que contratar alguém mais barato que seja negro. Jogadores conhecidos que se tornaram treinadores como Lula Pereira e Cláudio Adão tiveram menos oportunidades que jogadores do mesmo nível deles nos últimos 20 anos. Andrade ganhou 4 Brasileiros como jogador do Flamengo, mais do que qualquer outro técnico na Série A. Mas sua modéstia pessoal limitou a sua participação nas atividades fora de campo, como palestras e aparições na mídia, que atraíram muitos dos seus contemporâneos. No Brasil, autopromoção aparece como algo tão importante quanto a preparação do time.
Uma rápida olhada nos times do Brasil na Copa do Mundo reforça a impressão. Nenhum dos jogadores negros da seleção de 70 construiu uma carreira como treinador de ponta, apesar das incursões de capitão do time, Carlos Alberto Torres, como treinador. A barreira para treinadores negros é também um reflexo da esmagadora maioria de dirigentes brancos.
Não surpreende que um dos mais bem sucedidos treinadores negros teve que deixar o país pra desfrutar o sucesso. Didi, estrela do Botafogo e da Seleção Brasileira em 1958 e 1962, levou o Peru até as quartas-de-final da Copa de 1970 como treinador. Na realidade pouca coisa parece ter mudado desde os tempos de Gentil Cardoso, há 50 anos. Além de ser o primeiro técnico negro de um grande clube Gentil Cardoso foi quem contratou Garrincha para o Botafogo. Seu sucesso significou um brilho efêmero no cargo de técnico da Seleção Brasileira.
Cinqüenta anos depois Brasil tem um treinador branco, Dunga, contratado sem nenhum experiencia previa. O brasileiro no comando da África do Sul em 2010 é Carlos Alberto Parreira, da elite dos treinadores brancos.
Apesar do sucesso de Andrade pode levar algum tempo antes que os treinadores negros quebrem o apartheid particular do futebol brasileiro.
Robert Shaw
TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS: Brazilian football’s race problem