O sistema de monitoramento do prédio onde mora o humorista e músico Eddy Junior, de 28 anos, vítima de um ataque racista de uma vizinha, registrou ao menos duas ocasiões em que a aposentada e um filho dela estiveram na porta do apartamento dele com uma faca e uma garrafa.
As imagens, que foram obtidas pelo g1, são dos dias 1º e 7 de setembro, conforme os registros do prédio, localizado na Barra Funda, Zona Oeste da cidade de São Paulo. O humorista contou que desde abril é alvo de reclamações da vizinha por barulho em seu apartamento na madrugada, em horários que, segundo ele, estava dormindo ou até fora de casa (leia mais abaixo sobre as reclamações).
Em 1º de setembro, por volta das 3h50 da madrugada, o filho da vizinha aparece com uma faca em frente ao apartamento de Eddy. Ele chega a brincar com o objeto, a apontar para a porta e a batê-lo na parede.
O homem vai embora após cerca de 1 minuto. Os funcionários do prédio chegam ao andar por volta das 3h55 e conversam com Eddy, que mostra imagens no celular.
Uma semana depois, novamente durante a madrugada, às 3h03, mãe e filho aparecem nas imagens do quinto andar aparentemente alterados. Os dois permanecem por cerca de 1 minuto, saem e retornam às 3h08. O registro mostra o homem com uma faca presa na bermuda. Eles vão embora em poucos segundos.
Às 3h11, um funcionário do prédio surge, faz anotações e sai. Novamente, por volta das 3h28, a mãe surge com uma garrafa, e o rapaz, com a faca. Os gritos continuam por mais 1 minuto.
O g1 entrou contatou o síndico profissional do prédio para que ele se manifestasse a respeito das gravações, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
Reclamação
Em um processo já extinto que foi movido pela mulher contra o condomínio e o humorista, ela afirmou que se mudou para o imóvel em junho de 2019 com o filho, que, segundo ela, tem deficiência intelectual leve diagnosticada por um perito.
No entanto, desde o fim de 2021, alegou ter sofrido “momentos perturbadores” entre 2h30 e 5h30 com supostos barulhos no apartamento onde morava o youtuber. As reclamações, ainda segundo ela, foram registradas com os administradores.
“Tentei medir o barulho, mas como meu celular foi hackeado, alguém desligou cinco vezes. Também bloquearam nosso computador”, disse ela à Justiça. O condomínio chegou a registrar uma das confusões com um boletim de ocorrência.
Uma certidão da Justiça de 2018 confirma a interdição do filho dela por deficiência intelectual leve e a mãe dele como como responsável. O caso transitou em julgado em 2014.
“É, sob o ponto de vista médico legal, absolutamente incapaz, no momento, de reger sua vida e administrar seus bens e interesses. No momento, essa somatória o torna absolutamente incapaz”, apontou um documento de 2007 anexado pela mãe na Justiça.
Na Justiça, a administração do condomínio afirmou que não existiam reclamações de outros vizinhos contra a unidade do youtuber, que houve multa quando foi constatada uma situação fora do normal, mas que apenas a aposentada reclamava.
O caso
Eddy Junior denunciou na noite de segunda (17), pelas redes sociais, que foi vítima de um ataque racista de uma vizinha do condomínio.
No Instagram, o rapaz afirmou ter sido xingado de “macaco, imundo, feio, urubu e neguinho perigoso” ao tentar usar o elevador do prédio com a vizinha e a cachorra dele, na última madrugada.
Nas imagens, a mulher aparece discutindo com o humorista e se nega a subir no mesmo elevador que o jovem.
“Cai fora. Não quero ficar com ele. Não vou [subir com ele]. Não quero”, afirma a mulher, que é apartada por um funcionário do prédio.
Na sequência do vídeo, ela dispara várias ofensas contra o rapaz como “imundo”, “cai fora, macaco”, “cai fora, bandido”, “cagão, bundão”.
As agressões foram postadas nas redes sociais do humorista, onde ele tem mais de 1,2 milhão de seguidores, e mostram a mulher proferindo várias ofensas contra o rapaz.
“Era 2h da manhã, desci com a minha cachorra para ela fazer as necessidades. Na hora que eu ia subir, encontrei com essa vizinha. Foi uma coincidência muito grande. Eu ia entrar no elevador, e ela disse que não ia entrar no mesmo elevador que eu. Eu poderia usar o elevador do lado, mas não sou obrigado a mudar de lugar só porque uma mulher racista não quer que eu use o mesmo elevador que ela”, disse o humorista ao SP2, da TV Globo.
“Antes de eu começar a gravar, ela falou várias coisas. Ela falou várias vezes: ‘Como você tem dinheiro para morar aqui?’, ‘Não sou obrigada a morar no mesmo lugar com esse tipo de gente igual você’”.
O g1 tentou contato com a mulher que aparece no vídeo, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
Alvo de perseguição
Eddy Júnior afirmou que é alvo da família da agressora desde abril, quando começaram as reclamações e agressões verbais por um suposto barulho vindo do apartamento dele.
“Me mudei para esse apartamento no final de fevereiro. Quando chegou março ou abril, os porteiros começaram a ligar, quando eu estava dormindo, reclamando de barulho. Mas eu estava dormindo. Foi assim durante vários dias na semana. Às vezes, ligava duas vezes na mesma noite. Houve uma reclamação até num dia em que eu não estava em casa”, informou.
“Eu nunca tinha nem visto ela. Aí chegaram duas notificações de multa pra mim por importunação e barulho. A minha advogada pediu para ler o livro de reclamações do prédio e tinha muitas reclamações dessa vizinha sobre mim. Mas eram umas reclamações absurdas. Ela falava que eu desligava a máquina de lavar dela, falou que eu hackeei a internet da casa dela, que eu desligava o fogão dela. Alegou que eu a deixei sem gás. O condomínio até retirou as multas”, afirmou.
Em setembro, o rapaz disse que registrou um boletim de ocorrências por causa de ameaças com faca feitas pelo filho dela.
“Teve uma noite em que eu estava na cama deitado, e a minha campainha tocou. Era umas 3h da manhã. Levantei, e o filho dessa vizinha já começou a gritar, dizendo: ‘Eu vou te matar’. Ele veio com uma faca enorme na mão, chutando a minha porta”, afirmou.
Ao g1, a assessoria de Eddy afirma que ele saiu do prédio em que mora por conta de ameaças de morte feitas pela família da agressora e ainda não fez o registro na delegacia, o que deve acontecer nesta quarta (19).
Depois do episódio, o humorista também declarou que vai deixar o edifício definitivamente, por causa das ameaças de morte. Ele lamentou a atitude racista dos vizinhos e prometeu procurar a Justiça contra as ofensas e ameaças.
“Espero que a Justiça tome a devida atitude que tem que ser tomada. Como eu sofri ameaça, minha advogada me orientou a sair de lá. Mas o mais triste é que estou trabalhando desde 2016 com internet, tentando ganhar dinheiro. Agora que deu certo, que comecei a ajudar a minha família, preciso sair da minha própria casa por causa de pessoas racistas. Isso me deixa muito mal”, declarou.