Carta aberta da Articulação de Organizações de Mulheres Negras Brasileiras para a sua Excelência Sra. Dilma Rousseff, Presidenta da República

Excelentíssima Senhora Presidenta Dilma Rousseff

A luta das mulheres negras brasileiras tem sido ininterrupta ao longo destes cinco séculos de existência de nosso país. Somos nós as maiores vítimas da profunda desigualdade racial que vigora na sociedade brasileira. É sobre nós que recai todo o peso da herança colonial, onde o sistema patriarcal apoia-se solidamente com a herança do sistema escravista.

A interseccionalidade do racismo, sexismo, das desigualdades econômicas e regionais produz em nossas vidas um quadro de destituição, injustiça e exclusão, aprofundados pela expansão mundial do neoliberalismo e suas formas de ataque à capacidade dos estados democráticos em nos oferecer as condições mínimas de bem estar.

Todo e qualquer avanço ocorrido em nossas vidas deve-se a luta, sem tréguas que conquistamos. É neste cenário de busca do empoderamento de nós, mulheres negras, que surge a AMNB em 2001. Entendendo que todas as denúncias já haviam sido feitas, e que era momento de fazer com que o Brasil passasse a reparar a imensa dívida contraída com a população negra, especialmente com as mulheres negras, que a AMNB participa, de forma protagônica, da construção e da realização da III Conferência Mundial Contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Correlatas de Intolerância em 2001, em Durban, na África do Sul.

É importante destacar que o governo brasileiro é signatário do Relatório e do Plano de Ação produzidos, comprometendo-se, oficialmente com a sua execução. O Brasil, em 2006, no Chile, participa da Conferência que ratificou as decisões da Conferência de Durban. No dia 21 de setembro de 2011, em Nova Iorque, o governo brasileiro, representado pela Ministra Luiza Bairros, esteve presente na Comemoração dos 10 Anos da Conferência de Durban. Fruto da luta do povo negro no mundo, a escravidão foi considerada crime de lesa humanidade, e os países que se nutriram deste regime devem responsabilizar-se pela elaboração e pela implementação de políticas, que visem reparar os danos causados a milhões de pessoas pelo regime escravista.

Embora um tanto aquém de nosso desejo, a criação da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) no ano de 2003, representou e representa um avanço no processo de construção de uma democracia substantiva, pois, significa a concretização de uma das importantes demandas do movimento negro e de mulheres negras junto ao Estado brasileiro, um dos (co) responsáveis pelos séculos de escravismo e manutenção de mecanismos de subalternização da população negra até hoje – inclusive através do racismo institucional .

É a partir deste cenário que nós Mulheres Negras, dirigimo-nos a Vossa Excelência para manifestar nossa apreensão face às notícias de extinção e ou alteração de espaços governamentais importantes para as mulheres negras.

A AMNB manifesta-se publicamente em defesa da manutenção da Secretaria de Políticas Para as Mulheres – SPM -, do Ministério dos Direitos Humanos – MDH – e da Secretaria Especial de Políticas Para Promoção da Igualdade Racial – SEPPIR – a fim de que o Brasil possa cumprir todos os protocolos, todas as decisões, todos os acordos e todos os planos de ações das conferências que o país subscreveu, para efetivamente promover a equidade de gênero, de raça e respeitar os direitos humanos das mulheres negras brasileiras. A AMNB ressalta que somente com a existência de espaços governamentais específicos, com políticas públicas direcionadas aos setores, até aqui, excluídos, é que as mulheres, sobretudo, as mulheres negras terão acesso à cidadania.

Certas do compromisso de seu governo com os direitos das mulheres de nosso país, manifestado por Vossa Excelência, em seu discurso de posse que emocionou de norte a sul do Brasil, as mulheres de diferentes idades, credos, orientações sexuais, identidade de gênero, raças e religiões ao dizer:

(..) “Para assumi-la, tenho comigo a força e o exemplo da mulher brasileira. Abro meu coração para receber, neste momento, uma centelha de sua imensa energia”, e naquele momento todas as mulheres em pensamento, palavras e orações lhes mandaram a desejada energia.

E como primeira mulher a discursar na abertura da Assembleia-Geral das Nações Unidas (ONU), mais uma vez, Vossa Excelência demonstrou o seu compromisso com as mulheres do Brasil e do mundo ao dizer (..) ” Vivo este momento histórico com orgulho de mulher. Tenho certeza que este será o século da mulher.”.

Assim, a AMNB, através de suas organizações filiadas, despede-se reforçando a manifestação e o desejo pela continuidade da SPM, SEPPIR e SDH e, solicitando a Vossa Excelência, um pronunciamento à nação, garantindo a todas brasileiras a permanência dessas Secretarias, garantindo assim, o compromisso com as Mulheres Negras Brasileiras.

Atenciosamente,

ACMUN – Associação Cultural de Mulheres Negras – RS

Bamidelê – Organização de Mulheres Negras da Paraíba – PB

CACES – RJ

Casa da Mulher Catarina – SC

Casa Laudelina de Campos Melo – SP

CEDENPA – Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará – PA

CEERT – Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades, de São Paulo

Coletivo de Mulheres Negras Esperança Garcia – PI

CONAQ – Coordenação Nacional das Comunidades Quilombolas – MG

Criola – RJ

Grupo de Mulheres Felipa de Sousa – BA

Geledés – Instituto da Mulher Negra – SP

Grupo de Mulheres Negras Mãe Andressa – MA

Grupo de Mulheres Negras Malunga – GO

IROHIN – DF

IMENA – Instituto de Mulheres Negras do Amapá – AP

INEGRA – Instituto Negras do Ceará – CE

Instituto AMMA Psique e Negritude – SP

Kuanza – RJ

Kilombo – RN

Maria Mulher – Organização de Mulheres Negras – RS

Mulheres em União – MG

NZINGA – Coletivo de Mulheres Negras de Belo Horizonte – MG

Observatório Negro – PE

Rede de Mulheres Negras do Paraná – PR

Uiala Mukaji – Sociedade das Mulheres Negras de Pernambuco – PE

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