A carta extraordinária com que Charlotte Brontë recusou uma proposta de casamento

O texto original, da autoria da jornalista Maria Popova, foi publicado no site Brainpickings.

Do DCM 

“O casamento é o assunto sobre o qual mais tolices perigosas são ditas e pensadas”, afirmou George Bernard Shaw em sua meditação sobre o casamento, escrita em 1902. “Procuramos comunhão, mas não a encontramos”, escreveu Denise Levertov em seu poema “The Ache of Marriage”. No meio do caminho entre a tolice perigosa e a fuga, há a proposta de casamento – e sua possível rejeição.

No último dia de fevereiro de 1839, oito anos antes da publicação de Jane Eyre, Charlotte Brontë foi pedida em casamento pelo jovem pároco Henry Nussey, irmão de sua melhor amiga. A resposta que enviou-lhe, escrita no dia cinco de março, foi brilhante; ao mesmo tempo assertiva e generosa, inequívoca e gentil, pode ser considerada um exemplo de “o problema é comigo, não com você”. Ela realmente explica os motivos pelos quais seria uma péssima companheira de acordo com o padrão da época.

“Meu caro senhor,

Antes de responder sua carta, eu poderia ter passado um longo tempo considerando seu conteúdo; mas como decidi, desde o momento em que a recebi e a li, o caminho pelo qual enveredaria, tal atraso pareceu-me completamente desnecessário.

Você sabe que tenho muitas razões para sentir gratidão por sua família, amar ao menos uma entre as suas irmãs e estimá-lo muito fortemente. Não acuse-me, portanto, de más intenções quando eu disser que a minha resposta para a sua proposta deve ser um determinado não. Minha decisão, que foi baseada nos ditames da consciência e não da inclinação, não foi fundamentada em um desprezo em particular pela ideia de unir-me a você – mas estou certa de que a minha disposição natural não foi calculada para fazer um homem como você feliz.

Tenho o hábito de analisar o caráter daqueles a quem sou apresentada, e acho que o conheço bem o suficiente para imaginar o tipo de mulher que se adequaria à você. Seu caráter não deveria ser acentuado, ardente e original – ela deveria possuir um temperamento manso, uma religiosidade incontestável, um espírito equilibrado e bem disposto e beleza o suficiente para agradar aos seus olhos e gratificar seu orgulho.

Quanto a mim, eu não sou tão séria, solene e serena quanto você pensa – você me consideraria demasiadamente romântica – “excêntrica”, você diria; e pensaria que sou satírica e inflexível. O fato é que eu não pretendo fazê-lo de tolo, e jamais o enganaria a fim de me casar e escapar do estigma de ser uma solteirona, porque desse modo comprometeria o futuro de um bom homem a quem não posso fazer feliz.

Adeus! De sua amiga,

C. Brontë”

Brontë permaneceu solteira até um ano antes de sua morte, quando desposou Arthur Bell Nichols, amigo de seu pai, apaixonado por ela há anos. “Currer Bell”, o pseudônimo masculino que ela havia usado para publicar seus romances, era baseado no nome do meio de Nichols. Resta a pergunta: se Brontë tivesse sucumbido aos opressivos padrões de domesticidade feminina da época, seu célebre romance Jane Eyre teria sido escrito?

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