‘Coisa de preto’ 2

Torcendo pelo dia em que 'coisa de preto' seja sinônimo de denunciar crime de racismo.

Num país onde há racismo sem racistas, a cassação do mandato do vereador Camilo Cristófaro (Avante) pela Câmara Municipal de SP é uma vitória a ser enaltecida por todos os que se consideram antirracistas.

Não só pelo ineditismo da decisão – é a primeira vez que um político perde o mandato por quebra de decoro parlamentar em decorrência da prática de crime de racismo. Mas também pelo reconhecimento de que o Estado/Poder Público não deve deixar de punir a conduta de quem reconheceu “ter tido uma fala racista”.

Tampouco pode recriminar o denunciante atribuindo-lhe excesso de subjetividade na queixa, muito menos desconsiderar a acusação com base num suposto convívio pacífico e na contratação de pessoas negras pelo acusado. Vale independentemente de qualquer suposto esvaziamento natural do dolo baseado na presunção de ausência de vontade de discriminar.

Camilo Cristófaro no plenário da Câmara durante votação nesta terça-feira (19) – Adriano Vizoni/Folhapress

Como referi em minha coluna “Coisa de preto” (17/7), Cristóforo afirmou “Eles arrumaram e não lavaram a calçada. É coisa de preto, né” para se referir a um serviço mal feito, em 2022. Depois deu desculpas divergentes para se justificar.

Contudo, o fato mais importante a ser destacado talvez seja a reação da população negra, que saiu da passividade e passou a valer-se dos mecanismos legais para exigir respeito à sua dignidade e defender seus direitos.

Como diz um amigo, “ir à Justiça é um processo muito custoso, doloroso, demorado e com resultados nem sempre satisfatórios”. Nesse sentido, exercer a cidadania tem um custo e exige uma energia que nem todos possuem, mas felizmente cada vez mais pretos e pardos se mostram dispostos a dispender.

Apesar de todo ônus que uma queixa de racismo pode acarretar, as pessoas estão denunciando! No caso de Camilo Cristófaro, a denúncia foi feita por outra parlamentar, a vereadora Luana Alves (PSOL), uma mulher negra.

Torcendo pelo dia em que “coisa de preto” será sinônimo de denunciar crime de racismo.

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