Como as desigualdades afetam a decisão das brasileiras em ter filhos

Mulheres com mais condições controlam sua reprodução, já as mais pobres têm mais filhos não programados, mostra relatório do UNFPA

Por Clara Cerioni Do Exame

Grávidas: renda e educação modificam a taxa de reprodução das brasileiras (Ricardo Funari/Getty Images)

No Brasil, a escolha de engravidar ou não, e quantas vezes, ou mesmo de adiar a maternidade para trabalhar é uma questão de privilégio.

No décimo país mais desigual do mundo pelo índice de Gini, mulheres com mais oportunidades financeiras e educacionais durante a vida apresentam menor taxa de fecundidade, enquanto as mais pobres ficam grávidas mais vezes e mais novas, em média.

Essa é a realidade apresentada no relatório “O poder de escolha”, elaborado pelo Fundo de Populações das Nações Unidas (UNFPA) sobre direitos reprodutivos e a transição demográfica, divulgado nesta quarta-feira (17).

A pesquisa revela que desigualdade econômica, falta de acesso à informação, precariedade nos serviços de saúde e má distribuição de renda impactam diretamente nas taxas de fecundidade.

Para comprovar esse cenário, o relatório apresenta dados de dois extremos. De um lado estão as mulheres com mais anos de estudo e com uma progressão maior na carreira profissional. Essas têm menos filhos e, inclusive, o número costuma ser menor do que o desejado.

Na outra ponta, que concentra o maior número de mulheres, estão aquelas com menos anos de estudo que ficam grávidas mais vezes do que queriam. Elas são jovens e, na maioria das vezes, a gravidez não foi planejada.

Para Jaime Nadal, representante do UNFPA no Brasil, essa realidade mostra que apesar dos avanços dos últimos anos, o acesso a serviços de saúde sexual e reprodutiva ainda está longe de ser o ideal.

“O Brasil passou pelo mesmo processo que outros países do mundo, em relação à queda da taxa de natalidade. No entanto, as meninas mais pobres, por falta de escolhas, oportunidades e atenção dos serviços públicos, ficaram à deriva”, explica.

Os números corroboram com esse cenário. A parcela mais rica da população, que corresponde a 20% dos brasileiros, apresentam a menor taxa de fecundidade, com índice médio de 0,77 filho por mulher. Já os 20% mais pobres aparecem como os que mais têm filhos, são 2,9 por mulher.

Mulheres que estudaram entre cinco e oito anos também são as que mais têm filhos, com taxa média de 3 para cada mulher. As com mais de doze anos de estudos têm 1,18.

O que fazer para resolver?

A desigualdade na taxa de fecundidade no Brasil traz inúmeros impactos para a saúde pública — um exemplo são os casos das mulheres que, por não terem controle reprodutivo sobre seus corpos, se submetem a abortos clandestinos. Além disso, são aprofundadas as desigualdades do mercado de trabalho, de renda e de gênero.

Para solucionar o problema, o relatório apresenta quatro possibilidades. As políticas públicas precisam ser universais e de qualidade, os direitos jurídicos legais devem ser respeitados, a educação tanto para meninos quanto para meninas deve ser um direito resguardado e, por último, os homem precisam assumir seus papéis e tomar parte nas decisões.

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