Confluências astronômicas: reelaborando a Astronomia com Nêgo Bispo

FONTEPor Lara de Souza Bessa, enviado ao Portal Geledés
Nego Bispo (Foto: Murilo Alvesso)

Eu me sentia estranha ao escrever e falar sobre Astronomia, mesmo sendo professora da educação básica de ciências da natureza e ter este tema presente em minhas aulas e por ser um assunto ao qual me debruço a anos (mas de forma amadora e como passatempo através de documentários, filmes e livros), sempre me vinha uma sensação de não pertencimento. É compreensível tal sentimento, pois não tive a oportunidade de ver pessoas próximas enveredando por caminhos astronômicos e não me recordo de ter este assunto abordado na escola quando eu era estudante. Não houve exemplos concretos que materializasse a Astronomia em minha vida e, desta forma, segui como se fosse inalcançável.

Pessoas em quem possamos nos inspirar é fundamental para que tenhamos forças para realizar nossos sonhos e ao ler ‘a terra dá, a terra quer’ de Antônio Bispo dos Santos (2023), mais conhecido como Nêgo Bispo, saltitei que nem faísca e fui pegando fogo ao longo da leitura até chegar ao ápice quando ele discorre sobre a forma como as pessoas de sua comunidade no sertão constroem as casas, orientando-se de acordo com os astros para posicionar cada cômodo, janela e portas e que as moradias são edificadas na terra, mas também nos astros. Foi uma explosão dentro de mim, pois tudo começou a se encaixar e a ocupar lugares, que antes estavam cheios de estranheza, pois eu olhava a Astronomia sob a ótica da colonização.

Na Astronomia não me interessa os cálculos matemáticos ou qualquer tipo de mensuração que envolva raciocínio lógico. Eu busco o delírio, o chão que não se pisa, a poesia emanada do mistério, a beleza do céu estrelado nos locais onde a poluição luminosa não alcançou, o devaneio sobre seres extraterrestres, as histórias envolvendo a Lua Cheia, as variadas formas como as comunidades leem os astros e os significados que dão a eles. O que interessa é a confluência (Santos, 2023) na vida das pessoas, fazendo com que se escolha a fase da Lua mais adequada para cortar os cabelos ou o momento propício para plantar, colher e orar.

Nêgo Bispo me relembrou que a Astronomia sempre esteve dentro de mim, por isso que ela remexia, cutucava, sussurrava e se mobilizava para eu me envolver com ela, num movimento pulsante-cardíaco, como se fosse a própria vida metabolizando a existência e impulsionando na direção do caminho a ser experienciado na sua mais autêntica potência. Não há como fugir da verdade que nos atravessa e arrebata o peito, pois a vida é circularidade: começo, meio e começo, como diz Nêgo Bispo (2023) e sempre voltaremos ao ponto inicial para pegar impulso e seguir com mais inteireza.


Referência

SANTOS, Antônio Bispo dos. A terra dá, a terra quer. São Paulo: Ubu Editora/PISEAGRAMA, 2023.


Mini biografia:

Lara de Souza Bessa (Foto: Arquivo Pessoal)

Licenciada em Ciências Biológicas, Especialista em Educação Científica e Cidadania e Mestranda em Educação Científica, Inclusão e Diversidade, pela Universidade Federal do Recôncavo da Bahia.


** ESTE ARTIGO É DE AUTORIA DE COLABORADORES OU ARTICULISTAS DO PORTAL GELEDÉS E NÃO REPRESENTA IDEIAS OU OPINIÕES DO VEÍCULO. PORTAL GELEDÉS OFERECE ESPAÇO PARA VOZES DIVERSAS DA ESFERA PÚBLICA, GARANTINDO ASSIM A PLURALIDADE DO DEBATE NA SOCIEDADE. 

-+=
Sair da versão mobile