Cudjo Lewis morreu há 83 anos, mas sua história foi registrada pela pesquisadora Zora Neale Hurston e será publicada em formato de livro
por Beatriz Sanz no R7
Cudjo Lewis nasceu como Kossula em uma parte da África onde atualmente fica o território de Benin.
Aos 19 anos, sua aldeia foi invadida por aldeias rivais e ele foi levado para um “barracoon”, uma espécie de chiqueiro onde as pessoas ficavam até que os compradores de escravos chegassem. Cada pessoa custava de US$ 50 a US$ 60 — algo em torno de US$ 1.400 atuais, ou R$ 4.400.
O jovem chegou aos Estados Unidos a bordo do Clotilde, o último navio a contrabandear pessoas através do Atlântico, depois que o tráfico de pessoas já era proibido no país há pelo menos 50 anos.
Ele colocou seus pés na América do Norte, já na condição de escravo, em 1860, apenas um ano antes do início da Guerra Civil americana que culminou na libertação de todos os escravos.
Quando um soldado confederado americano avisou que ele estava livre, ele foi até seu antigo dono cobrar um pedaço da terra que ele tinha ajudado a cultivar e recebeu um não como resposta.
Ficou revoltado quando soube que o governo norte-americano não daria nenhum tipo de auxílio para ele ou sua comunidade. Com muito trabalho, ele e seus companheiros conseguiram comprar um pedaço de terra que foi batizado de Africatown. Atualmente, essa terra é Plateau, no estado do Alabama.
Cudjo viveu até os 94 anos, após ser sequestrado, contrabandeado e sofrido todas as humilhações possíveis dentro da escravidão.
Em 1931, quando tinha 90 anos,pouco antes de morrer, ele conheceu Zora Neale Hurston, uma escritora e antropóloga afro-americana que estava disposta a contar sua história de vida.
Hurston transformou a história de Cudjo em um livro entitulado “Barracoon: A história do último cargueiro negro” (em tradução livre) que não foi publicado em 87 anos.
A antropóloga fazia parte de um movimento cultural que aconteceu nas décadas de 1920 e 1930 batizado de “Renascimento do Harlem” que buscava trocar a vergonha pelo orgulho das raízes africanas.
Ela rastreou Cudjo e da primeira vez que se viram, ela o saudou por seu nome verdadeiro: Kossula. Emocionado, ele concedeu para ela diversas entrevistas na comunidade que ele havia ajudado a construir e onde tinha se tornado um líder comunitário.
As conversas foram todas na língua original de Cudjo e assim a autora manteve a história quando lançou o livro.
Porém, sua atitude — que na época não foi bem vista nem por seus colegas — impediu que o livro fosse publicado. Assim como Cudjo, Zora Hurston morreu no esquecimento e na pobreza.
O manuscrito de Barracoon foi encontrado na Howard University e despertou a curiosidade da editora HarperCollins. O livro será lançado na terça-feira (8) nos Estados Unidos. No dialeto de Cudjo, como Hurston queria.