23 minutos foi o tempo em que tudo aconteceu. Aquele dia estava fadado a azará-lo: fazia 23 anos no dia 23 de março. Pensou em outros meninos-homens da sua idade, teriam eles também esta falta de sorte? Não abria os olhos, mas sabia estar revolto de toda a sua gente, a enfermeira pediu para que esperassem no saguão, 23 visitas não podiam entrar para vê-lo ao mesmo tempo.
Ouvia-os revezando-se na prece, cada vez mais fervorosos. Sentia o calor da vela que os acompanhava como se a tivessem colocado sobre sua testa. Tinha febre. A vela teimava em queimar mais e mais no corpo do menino. Seus pensamentos faziam-se cada vez mais confusos, lembrava-se de ter contado os segundos em meio a tudo o que aconteceu naquele dia: 1, 2, 3, TIRO, 4, 5, 6, TIRO… 22, 23, estava caído no chão.
Queria saber quantos lhe cercaram ao sair da casa do amigo, seu vizinho da zona sul. 23 ou mais. Lhe chamaram atenção por estar caminhando sozinho na rua àquela hora. Não questionaram nada e responderam por si mesmos. E a vela ao seu lado, queimando em corpo e tremulando em chama, levava seu último suspiro.