Cotas raciais na USP: uma batalha em prol da universidade verdadeiramente pública

Ocupação do coletivo Opa Negra na aula do prof. Fernando Haddad na USP

A luta pela implantação das cotas raciais na USP cresceu neste ano, na esteira da crise que atinge a maior universidade do país. Coletivos de estudantes negros da universidade tem se organizado e mobilizado e realizado ocupações em salas de aula, colocando o problema. As reações tem sido diversas, desde uma discussão tranquila que fluiu na aula ministrada pelo prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, sobre “Direito a cidade” na pós graduação em Ciência Política, até conflitos mais acirrados, como o que foi registrado em vídeo de uma aula de microeconomia na Faculdade de Economia e Administração – o interessante é que o aluno que se rebelou com a ocupação dos estudantes negros na aula, terminou o vídeo com a frase “fora Dilma”, dando a dimensão do espectro ideológico dos que costumam ser contra as cotas raciais. (clique aqui para ver)

Na paralisação do dia 14 de abril, nas ocupações das reuniões do Conselho Universitário realizadas no final de março e início de abril e no ato de trancamento do portão 1 do campus Butantã, a pauta central da mobilização foi a implantação das cotas raciais. Vários debates tem sido organizados na universidade e a bandeira tende a crescer.

A USP é uma das últimas grandes universidades públicas que não tem sistemas de cotas. Algumas congregações de faculdades, como a da Faculdade de Direito e da Escola de Comunicações e Artes (ECA) tomaram posição favorável ás cotas. Porém, ainda são disseminadas na universidade idéias que, baseadas numa pretensa meritocracia, ainda colocam que as cotas irão rebaixar o nível da universidade, ainda que as experiências das universidades federais que já tem cotas há alguns anos desmintam isto.

Mas o debate é de cunho ideológico, por isto acirrado. O que está sendo discutido não é só universidade para quem, mas para que. A instituição de cotas irá criar um ambiente mais favorável a um reposicionamento da maior universidade do país no sentido de se aproximar mais das demandas da sociedade e das classes populares. Internamente, a presença de mais alunas e alunos negros e trabalhadores forçará investimentos maiores na assistência estudantil (justamente uma área em que se percebe um certo sucateamento, exemplificado pela redução no atendimento na creche, no Hospital Universitário e no restaurante universitário), na rediscussão dos métodos de ensino-aprendizagem, no funcionamento dos serviços como secretaria, biblioteca, entre outros, além dos currículos dos cursos (muitos dos quais ignoram, por exemplo, dispositivos legais como a lei 10639/03 que trata da educação das relações étnicorraciais).

As dificuldades orçamentárias da USP podem levar a instituição a privilegiar as produções científicas e de caráter extensionistas que possibilitam angariar recursos externos por meio de parcerias. Trata-se de uma “privatização disfarçada” que levará a um direcionamento da produção científica da universidade por parte dos segmentos hegemônicos, sejam do capital ou do poder de Estado, ferindo a tão necessária e conquistada autonomia universitária. Por isto, a presença maior de negras, negros, trabalhadores e trabalhadoras incomodaria muito este processo em gestação na universidade.

Cotas raciais na USP é um arranhão no sistema de poder.

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