De Donga a Diogo Nogueira, 100 anos de samba

Com direção de Gustavo Gasparani, o musical ‘Sambra’ estreia nesta quinta-feira no Vivo Rio para contar e cantar a história do gênero

Por Luiz Felipe Reis Do O Globo

No primeiro dia de ensaio para o musical “Sambra”, nada estava decidido, claro, a não ser as intenções de Diogo Nogueira: “Quero fazer de tudo”, disse ele a Gustavo Gasparani, o autor e diretor da montagem que estreia hoje no Vivo Rio, às 21h30m, e cumpre quatro únicas sessões cariocas até domingo, antes de embarcar para São Paulo, onde terá sessões entre os dias 26 e 29.

Criado para homenagear os 100 anos do nascimento do samba, o musical apresenta Nogueira em seu primeiro trabalho como ator.

— Se ele quisesse só cantar, ok, mas ele queria descobrir o teatro — diz Gasparani, diretor de sucessos que misturam universos como “Otelo da Mangueira” (2005), “Opereta carioca” (2008) e “Samba Futebol Clube” (2014).

No palco, Diogo atua, dança, toca instrumentos de cordas e percussão, sai de cena, contracena com outros 16 atores e funciona menos como um protagonista e mais como um mestre de cerimônias, que apresenta as principais etapas do desenvolvimento do samba e os feitos de seus principais criadores e renovadores — numa obra composta por dois atos e 14 quadros, que abrigam 70 músicas cantadas e 25 recitadas. E entre um verso e outro, o cantor dá corpo e voz a ícones como Francisco Alves, Ataulfo Alves, Mário Reis e João Gilberto, assim como encarna, estilizado com chapéu e terno vermelho, o mítico Zé Pelintra, entidade da umbanda que, no Rio, filia-se principalmente à figura do malandro carioca.

— O Diogo é o grande expoente da nova geração do samba, e além disso surge dentro de uma linhagem marcante. É filho de João Nogueira e afilhado de Clara Nunes. Então é como se ele recebesse essa herança e, na peça, reconstruísse todo o caminho que tornou possível que chegasse até aqui — diz Gasparani.

E a passagem de bastão entre pai e filho é revelada numa mescla de versos falados, de obras como “Espelho” e “Além do espelho” (ambas de João Nogueira e Paulo César Pinheiro), e trechos cantados de “Morte de um poeta” (Totonho e Paulinho Rezende), “Minha missão”, “Súplica” e “Poder da criação” (todas de João Nogueira e Paulo César Pinheiro).

— É emocionante porque é o ponto em que a história do samba se mistura à minha vida — diz o cantor.

Mas antes de Diogo há um rio inteiro. E tudo começa “mais ou menos em 1916”, diz Gasparani, referindo-se ao ano em que Donga registra “Pelo telefone”.

— Existiam outro sambas registrados, mas esse foi o primeiro sucesso — diz.

E a partir daí evoca o terreiro da Tia Ciata, as festas da Penha, os sambas de morro, as praças Onze e Tiradentes, a função do teatro de revista como ponte entre favela e cidade, a chegada do samba a Copacabana e aos EUA, sua transformação em bossa nova, sua politização em shows como Opinião e Rosas de Ouro, a moderna apropriação pela Tropicália, a sofisticada releitura de suas origens via Paulinho da Viola e por aí vai.

— Mostramos como o samba se relacionou como a ditadura e com a contracultura — diz Gasparani. — E depois disso há a sua volta ao lugar de origem, ao terreiro do clube Cacique de Ramos, nos anos 1980, e tudo o que surgiu daí e que o faz continuar vivo.

Serviço — “Sambra”

Onde: Vivo Rio — Avenida Infante Dom Henrique 85, Flamengo (2272-2900)

Quando: De hoje a sáb., 21h30m; dom., às 20h

Quanto: De R$ 50 a R$ 200

 

+ sobre o tema

Gil, 45 anos depois do AI-5 e prisão: ‘foram momentos de agonia’

Neste dezembro de 2013, os 45 anos do AI-5....

Livro “12 Anos de Escravidão” será lançado no Brasil!

A Editora Companhia das Letras divulgou hoje que publicará...

Mano Brown mostra novidades sobre seu primeiro disco solo

por Mandrake Mano Brown apresenta pela primeira vez,...

Árbitros cruzam os braços contra racismo

Durante partidas pelo Campeonato Gaúcho, árbitros cruzam os braços...

para lembrar

Como transformar Carolina Maria de Jesus em quadrinhos

Entrevista com os autores conta a história do projeto...

A primeira mulher negra a escrever um romance no Brasil

No âmbito das comemorações do Mês da Consciência Negra,...

Série de fotos impressionante retrata o balé empoderando crianças no Quênia

Contra a brutalidade da realidade, a leveza e graça...

Serena Williams ganha e fica a três vitórias de voltar ao n.º1

A tenista norte-americana Serena Williams qualificou-se esta segunda-feira para...
spot_imgspot_img

Como as escolas de samba nos ensinam sobre ancestralidade

Desde que foram criadas, escolas de samba têm sido espaços de ensino e aprendizado. Carregam no nome a sua missão: ser escola. Ensinam sobre...

Samba, amor e Hip Hop

A quem nunca viu o samba amanhecer, Geraldo Filme aconselhava que fosse ao Bixiga para ver, ao quilombo da Saracura, à sede da Vai-vai....

Quilombo do Rio de Janeiro usou renda de roda de samba para lutar pelo território

No fim de uma pequena estrada cercada por mata atlântica, um galpão recebe dezenas de pessoas todos os finais de semana. Ali ocorrem as...
-+=