Dez romancistas feministas importantes na história da Literatura

Por Maria Fernanda Moraes, do Vermelho 

O livro reproduz a conferência histórica que Virginia ministrou em 1928, em Newham e Girton – duas faculdades frequentadas por mulheres dentro da Universidade de Cambridge, na Inglaterra -, falando sobre mulheres e a ficção.

“Era uma conferência organizada numa universidade que aceitava mulheres, num país e numa época onde as mulheres sequer podiam entrar em bibliotecas que possuíam manuscritos de Shakespeare”, explica Carla Cristina Garcia, professora da PUC, que atua na área de Sociologia de Gênero, Estudos Feministas e Lazer Urbano.

Ela começa a conferência falando da diferença encontrada no próprio prédio da universidade, conta Carla. Na ala onde dormem os estudantes homens, o jantar é maravilhoso, há abundância. Já o jantar servido na ala feminina era uma sopinha sem graça, praticamente uma água com sal.

“E a partir dessa ideia da diferença entre a alimentação das moças e rapazes, ela vai mostrando como as mulheres ainda têm fome de conhecimento, fome de lugar no mundo e, principalmente (que é de onde vem o título do livro), de um teto todo seu. Ela vai defender o quanto é importante que a mulher tenha o dinheiro dela e um teto só dela para poder escrever. Porque o mundo fica requerendo da gente muita coisa, o que impossibilita um momento só nosso, que é o que criatividade precisa”.

Ao falar da sua teoria, Virginia também vai contando a história da Literatura, passando por autoras inglesas do século 19, como Jane Austen, as irmãs Brontë, Emily e Charlotte, além da George Eliot.
Carla desenvolveu uma lista de romancistas que trouxeram grande contribuição ao feminismo. Ela ressalta que é importante lembrar que vai depender muito também do olho de quem lê para entender o que as escritoras estão colocando.

“Elas não estão escrevendo só porque são feministas, mas a maneira como são construídas as personagens femininas vão fazendo com que se tornem heroínas e inspirem gerações futuras de mulheres”.

Margaret Atwood

É uma escritora canadense que cria personagens femininas totalmente fora do padrão que se espera num cânone que tem uma fórmula definida de romances escritos por mulheres. Em A Noiva Ladra (Ed. Rocco), ela cria personagens do mal e trata de assuntos como estratégia militar. No livro A Odisseia da Penélope(Ed. Companhia das Letras), ela reconta o famoso mito subvertendo a narrativa original. Não é a história do marido que viaja e, sim, da mulher que vai tecer e desmanchar, mas renunciando à passividade. Ela faz uma nova leitura da Penélope, personagem emblemática da fidelidade e da obediência feminina, que passa a ocupar o centro da história.

Gioconda Belli

Ela é da Nicarágua e trata não só da questão feminina, como fala do papel da mulher latino-americana. Seu principal romance é O País das Mulheres (Ed. Record), cuja personagem principal é Viviana Sansón – presidenta de Fáguas, um pequeno país latino-americano. Pelas memórias de Viviana, vamos conhecendo a história do Partido da Esquerda Erótica (PEE) e de suas integrantes, todas convictas de que o poder exercido pelas mulheres, com humor e amor, pode conquistar o que em séculos o poder masculino não alcançou.

Angelica Carter

Escritora e jornalista inglesa, também escreveu ensaios, poemas, críticas, contos infantis e colaborou com o cineasta Neil Jordan na criação do roteiro de A Companhia dos Lobos, baseado em O Quarto do Barba-Azul, de sua autoria. No livro 103 contos de fadas (Ed. Companhia das Letras) ela reconta sob o ponto de vista feminista os contos de fadas, colocando o protagonismo das mulheres nas histórias já tão conhecidas por trazerem mocinhas indefesas, o que muda totalmente o sentido das histórias.

Isabel Allende

Escritora chilena que mora nos Estados Unidos há muito tempo e seu livro mais famoso é a Casa dos Espíritos (Ed. Bertrand Brasil). Suas protagonistas nunca são mulheres fracas, não há uma sequer que coloque em cheque a questão da subalternidade feminina ou situações em que você imagine que as mulheres não irão atuar e nem tomar a frente da própria história. Ela também dá muitas palestras hoje em dia sobre o lugar das mulheres tanto no mundo literário quanto político.

Clarice Lispector

Clarice tem que aparecer sempre. Ainda que ela não trate diretamente de questões feministas, não há nada mais feminista do que um livro como A Paixão Segundo G.H. (Ed. Rocco). Ela serve para tudo e ninguém passa impune à sua leitura. Perto do Coração Selvagem, A Hora da Estrela (Ed. Rocco), todos são ótimos romances. Ela enfia o dedo na ferida sem dó, e propõe questões humanas com protagonistas femininas.

Laura Esquiavel

É uma autora mexicana que ficou famosa pelo livro Como Água para Chocolate(Ed. Martins Fontes), em que relaciona a arte de cozinhar aos amores, desamores, risos e prantos. Nos últimos 20 anos ela fez diferença no cenário que se chamou de boom das novelas femininas, exatamente por fazer um questionamento de dentro para fora.

Lygia Fagundes Telles

Entre as escritoras nacionais, a Lygia tem uma história importante no feminismo. Se formou na Faculdade de Direito do Largo São Francisco nos anos 1940, época em que os estudantes do curso eram majoritariamente homens. Seu livro As Meninas (Ed. Companhia das letras) foi escrito e lançado em plena ditadura militar e traz a história de Lorena, Ana Clara e Lia em meio às pressões da época. Já A Disciplina do Amor (Ed. Companhia das Letras), conta episódios da sua vida entremeados com ficção.

Nélida Piñon

Ela é pouco lida no Brasil, mas importantíssima na Literatura Brasileira e mundial. Foi a primeira mulher presidenta da Academia Brasileira de Letras e é muito traduzida lá fora. Não é uma leitura fácil, mas é maravilhosa. Tem crônicas, contos e romances importantes como A Doce Canção de Caetana(Ed. Record), A República dos Sonhos e Vozes do Deserto – neste último ela revela a mulher oculta por trás do mito da mais famosa narradora da literatura oriental, Scherazade.

Isak Dinesen

É o pseudônimo de Karen Blixen. É dinamarquesa e teve uma fazenda na África por muito tempo, no começo do século 20. Quando retorna à Dinamarca, resolve ser escritora e publica A Fazenda Africana(Ed. Cosac Naify) que inspirou o filmeEntre Dois Amores, com Meryl Streep e o Robert Redford. O livro tem como ponto de partida a vida amorosa infeliz de uma baronesa europeia que se recusa a assumir seu papel dominante no mundo colonial. O marido transmite-lhe sífilis logo no primeiro ano de casamento e segue sua vida de playboy, enquanto ela fica sozinha à frente da fazenda de café.

Simone De Beauvoir

As leituras de Simone são praticamente obrigatórias. Não apenas O Segundo Sexo (Ed. Quetzal) que é a Bíblia feminista, mas todos os seus romances como A Convidada (Ed. Nova Fronteira), que aborda questões existencialistas, o amor de diversos ângulos, o ciúme, a decepção, raiva, frustração. Ela vai tratar não só das suas preocupações filosóficas, mas ponderando o papel da mulher nelas.

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