- Crimes contra pessoas negras em Santa Catarina me levam a falar de ódio
- Fim das cotas étnico-raciais em universidades estaduais de SC contraria dispositivos instituídos para promover equidade racial
Eu pretendia falar de amor, mas a montoeira de crimes contra pessoas negras em Santa Catarina, o “estado mais branco do Brasil”, me levou a falar de ódio.
Vejamos alguns fatos:
Apesar de ter a menor população negra do país, Santa Catarina lidera as estatísticas de denúncias referentes à injúria racial (Anuário da Violência).
A taxa de analfabetismo entre pessoas negras é o dobro da registrada entre pessoas brancas (Tribunal de Contas do Estado).
Trabalhadores brancos têm rendimento médio mensal 25% superior ao de pretos e pardos (IBGE).
A disparidade entre o tamanho da população e a quantidade de grupos neonazistas faz de SC o estado que, proporcionalmente, abriga a maioria dos coletivos dessa natureza no território nacional.
Eu poderia falar da miss discriminada e ofendida por ser negra. Ou do sujeito que ameaçou de morte uma mulher preta por andar na mesma calçada que ele, um branco. Ou da torcedora do Avaí Futebol Clube flagrada proferindo ofensas racistas e xenofóbicas contra torcedores do Remo. Contudo, vou me ater ao absurdo mais recente que se tem notícia: o fim das cotas étnico-raciais para pretos e pardos em universidades estaduais de Santa Catarina.
A decisão da Assembleia Legislativa aplica-se a estudantes e à contratação de docentes, técnicos e outros profissionais. Também impede as cotas nas instituições de ensino superior que recebam verbas públicas estaduais. Quem descumprir a regra fica sujeito a multa de R$ 100 mil por edital publicado, além da perda de verbas públicas estaduais.
Não é necessário notório saber jurídico para constatar que a proposição (que tramitou a toque de caixa, é bom dizer) contraria vários dispositivos instituídos nacionalmente para promover equidade racial. A vigência desse absurdo (que, a meu sentir, é inconstitucional) depende apenas da sanção do governador catarinense, um político que, a julgar pelas declarações públicas recentes, não pode ser classificado como antirracista.
Difícil falar de amor.
Ana Cristina Rosa – Jornalista especializada em comunicação pública e vice-presidente de gestão e parcerias da Associação Brasileira de Comunicação Pública (ABCPública)