DIU de cobre: Os mitos que rondam este contraceptivo injustiçado

Enviado por / FonteECOA, por Júlia Rocha

Eu sou a louca do DIU. Confesso. Como médica de família, não passo um dia sequer sem oferecê-lo a uma das minhas pacientes. Recentemente, me revoltei com a polêmica envolvendo denúncias contra planos de saúde que aparentemente estavam fazendo exigências descabidas de autorização do marido para que mulheres pudessem acessar este método. Isso é inadmissível! Situação degradante e humilhante para mulheres contra a qual devemos nos opor veementemente.

Não bastasse ser este um método super seguro, com pouquíssimos efeitos colaterais para a maior parte das mulheres e que garante contracepção eficiente por até 10 anos, o DIU de cobre ainda tem outras vantagens.

Por ser livre de hormônios, seu uso não interfere na libido, na pele, no risco de trombose, no humor ou na frequência/intensidade de crises de enxaqueca. Por ser um método que proporciona à mulher autonomia e possibilidade de planejamento da sua vida reprodutiva, é especialmente poderoso quando pensamos no impacto social que ele pode trazer para uma comunidade quando é amplamente oferecido na rede pública de saúde.

No mundo, em média de 14% a 15% das mulheres usam DIU. No Reino Unido e em países asiáticos, esta proporção é ainda maior. Já aqui no Brasil, apenas 2% das mulheres usam o método.

Suspeito que a busca seja tão reduzida no nosso país em virtude dos muitos mitos que rondam o DIU de cobre e a sua utilização. O objetivo desta coluna hoje é contrapor cada um destes mitos com informações para que você que se interessa pelo método possa decidir de forma esclarecida sobre seu uso:

Mito 1: A inserção do DIU é muito dolorosa

O procedimento de inserção do DIU provoca na maior parte das pessoas uma dor semelhante à dor de cólica menstrual. Para uma fração das pacientes submetidas ao procedimento, esta dor pode se apresentar com moderada a forte intensidade. Trata-se de um procedimento rápido, com duração de pouco mais de 1 minuto. Medidas anestésicas podem e devem ser usadas para reduzir o desconforto. Anestésicos podem ser aplicados em gel, spray ou através de aplicação com agulha bem pequena e fina no colo do útero. Das três formas, ocorre um alívio significativo da dor, o que torna o procedimento muito tranquilo, e a dor, muito tolerável.

Mito 2: Adolescentes não podem usar DIU

Isso não é verdade. Cada paciente deve ser avaliada individualmente, mas não existe uma contraindicação para o DIU apenas pelo fato de a paciente ser adolescente.

Mito 3: Pacientes sem filhos não podem usar DIU

Pessoas sem filho podem e devem usar DIU! Isso não provoca nenhum prejuízo na fertilidade futura e nem para outros aspectos da saúde. Pelo contrário. O DIU de cobre vai evitar exposição ao uso de hormônios das pílulas e vai proteger de forma até mais eficiente.

Mito 4: Mulheres com miomas não podem usar DIU

Não existe apenas um tipo de mioma. Miomas podem estar localizados dentro da cavidade uterina, na parede do útero e para fora do útero. Além disso, miomas podem ser de vários tamanhos. Veja a figura abaixo:

Foto: Imagem retirada do site ECOA

Os miomas que atrapalham ou impedem o uso do DIU são aqueles que crescem para dentro da cavidade uterina, deformando o seu interior. Miomas pequenos, que não provocam sintomas relevantes e que não deformam a cavidade uterina não são contraindicação para o uso do dispositivo.

Mito 5: O DIU de cobre é abortivo

Isso é falso. O DIU de cobre não é abortivo. Aliás, nenhum DIU é abortivo. É bom que se diga! O mecanismo de ação deste método impede o encontro do óvulo com o espermatozoide. Isso ocorre porque o DIU elimina íons de cobre dentro do útero e toda a região torna-se inóspita tanto para o espermatozoide quanto para o óvulo. Por isso, eles não se encontram e assim não ocorre fecundação. O que pode ocorrer é uma falha do método. Todos os métodos contraceptivos podem falhar. TODOS! Inclusive vasectomia, ligadura cirúrgica das tubas uterinas, pílulas, preservativos e outros.

Quando o DIU falha e permite a fecundação (o que é raríssimo de ocorrer) pode ocorrer perda gestacional em alguns casos. E isso pode acontecer também em outras circunstâncias na ausência do DIU.

Mito 6: O DIU falha muito! Sempre aparece uma história na internet de uma mulher que engravidou usando DIU

Você certamente conhece várias mulheres que engravidaram usando pílula, preservativo e outros métodos, mas isso quase nunca é noticiado. Quando uma falha acontece e uma mulher engravida usando DIU, as redes são inundadas de fotos do bebê segurando o DIU ou com o DIU grudado no cabelo ou em outra parte do corpo. Isso traz para as mulheres a sensação de que o DIU não funciona direito ou que falha muito. Na verdade, o DIU é muito mais seguro que a pílula, que o preservativo ou que as injeções hormonais, por exemplo. Só que a falha desses métodos não vira notícia.

Mito 7: Só se pode colocar o DIU durante a menstruação

Falso. O DIU pode ser colocado em qualquer fase do ciclo, inclusive no período de sangramento menstrual. As mulheres sem filhos ou sem parto vaginal podem sentir menos desconforto na colocação do DIU durante a menstruação pois o colo do útero tende a ficar mais amolecido e entreaberto, o que facilita a inserção do dispositivo, mas na maioria dos casos, é super tranquilo inserir fora da menstruação.

Mito 8: A adaptação é difícil e dolorosa

Pode ocorrer em algumas mulheres dor e incômodo pélvico horas ou dias após a inserção. A maior parte das pacientes se sente bem usando um anti-inflamatório ou algum analgésico que habitualmente usa para aliviar suas cólicas. O repouso pode ajudar também. Contudo, o mal-estar dura de algumas horas a pouquíssimos dias. A maioria das mulheres já se sente sem dor menos de seis horas depois do procedimento. E é raro que alguma delas sinta dor relevante após 48 horas de inserção.

Mito 9: Mulheres com SOP (Síndrome dos Ovários Policísticos) não podem usar DIU

Escuto muito isso no consultório. Este mito nasce de outro mito: o que diz que mulheres com SOP são obrigadas a usar anticoncepcional para tratar esta condição. O tratamento da SOP envolve dieta adequada, atividade física, manutenção do peso, controle da glicose sanguínea e manejo medicamentoso dos sintomas como acne e excesso de pelos (hirsutismo) provocados por hormônios masculinizantes. Isso pode ser feito com ou sem o uso da pílula anticoncepcional, de acordo com a necessidade e preferência de cada paciente. A SOP não é, em si, uma contraindicação para o uso do DIU.

Mito 10: DIU de cobre causa anemia

O DIU de cobre pode provocar aumento temporário do volume do sangramento menstrual. Para algumas pouquíssimas mulheres, este aumento pode chegar e permanecer. Se isto representar um incômodo ou um risco de adoecimento (anemia, por exemplo), sugere-se outro método. Para mulheres com sangramentos mensais muito intensos ou que sentem muita cólica durante este período, o DIU de cobre não é a melhor opção.

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