Do racismo à resistência: o lugar da negritude na pauta política – Por Katherine Lages* .

De forma breve, racismo é o pensamento e manifestação de agressão pautada na concepção de superioridade de raça. O conceito não basta! Importa compreender como têm se dado o processo. Das muitas possibilidades de situar o tema, dois retratam bem: a do embraquecimento da cultura e o da subalternidade.

O estupro e abuso dos corpos é até hoje utilizado como tática de guerra, interferindo na perpetuidade de raças e etnias. Foi assim no Brasil. A colonização, escravidão, a miscigenação forçada buscava “embranquecer” a negritude, a memória, a cultura, a religião, marginalizando-os.

No Brasil República, quem praticava capoeira era preso por vadiagem. Até os anos 60, manifestações religiosas e da cultura africana eram “embranquecidas” na Delegacia de Costumes.

A cultura do branco apresenta racismo na língua, na piada, na imagem da mulher negra, no camburão, na pobreza, nos excluídos, na cara do crime, nos padrões de beleza, nos padrões de consumo. Está no BBB quando a voz da branca ensina, em cadeia nacional, como evitar o “cheiro de neguinha”.

Está na imagem enegrecida de Glória Maria entre brancas, seguida da ironia (brincadeira): alguém sabe dizer onde Glória Maria está?

O racismo está no baculejo, no ato popular de amarrar, despir, espancar, linchar. Está em Amarildo, desaparecido. Está na discordância das cotas. Na cantarolada, a carne mais barata do mercado. Está na mão-de-obra explorada. Está em Cláudia Silva Ferreira, arrastada. Arrastada!

A novela das 8 apresenta uma cena de racismo. A vítima chora, inerte. A sua defensora/salvadora é uma branca. A la Princesa Isabel. É defendida na sua dor, na verdade, mais que isso, ela, a branca, a representa em sua dignidade, dor e indignação. A cultura da subalternidade insiste frente aos avanços jurídicos e políticos, especialmente em intenções forjadas, em atos pseudo-políticos.

Alguém sempre vai falar por ela e/ou por ele, a dor não está na voz de quem sofreu, pois o espaço é branco. Por esse mesmo processo, foram amarradas(os), arrastadas(os), buscaram desaparecer com que disse não: os Panteras Negra, Malcon X, Martin Luther King, Mandela, Zumbi dos Palmares, Carolina Maria de Jesus.
A preta e o preto, a negra e o negro vêm conquistando, após mais de 500 anos, notoriedade no debate político e se reconhecendo.

Em 11/03, o jornal El País afirmou que os negros brasileiros estão de pé, em referência ao número de ações judiciais por racismo. Concordamos para além disso.

Antônia Lima Duarte ou Mãe Corajacy é a primeira mulher negra de comunidade e religião de matriz africana a receber o título de cidadã campineira. Solange Pereira da Silva, primeira mulher negra de comunidade e religião de matriz africana a assessorar a pasta de Igualdade racial da Prefeitura de Caruaru.

Foi no dia histórico, Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação Racial, em um momento histórico, a posse do I Conselho de Igualdade Étnico-Racial, que as negras e negros de Caruaru passam a se representar. As negras e os negros de Caruaru estão de pé!
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*Katerine Lages Contasti é feminista, professora, mestra em Ciência da Informação e mestra em Ciências Jurídicas, ambas pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Está como Assessora de fortalecimento sociopolítico da Secretaria da Mulher e Direitos Humanos de Caruaru.

 

 

 

Fonte: JORNAL DE CARUARU

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