Documentário resgata rebeldia de Itamar Assumpção

São Paulo – Mistura rara a do músico Itamar Assumpção. O rapazinho negro e tímido, que saiu de Tietê (SP) para ser contador no Paraná, mudou de rumo e desembarcou na Pauliceia em 1973 para virar uma referência da chamada Vanguarda Paulistana – que agitou a música brasileira entre os anos 70 e 80, constituindo um dos momentos mais intensos e transformadores da cena musical, ainda sob o sufoco da ditadura militar.

O segundo nome de Itamar era rebeldia. Ele não se conformava com o ritmo fácil, a letra óbvia, a batida simples, o show previsível. Em suas apresentações, a graça estava em nunca se saber exatamente o que ia acontecer. Era uma espécie de happening que ia se desenrolando a partir da energia do momento – não raro com Itamar mexendo, muitas vezes implicando, com alguém da plateia. Fazia parte do seu jogo essa mistura de lucidez e dissidência, de revolta e ternura, de tranco e afago.

Essa pérola rara, afinal, conhecida de não muitos – Itamar era “maldito” e “alternativo” à sua revelia – é recuperada pelo documentário Daquele Instante em Diante, de Rogério Velloso, filme que lança o projeto Iconoclássicos na rede de cinemas Unibanco em todo o país. Ao todo, são cinco documentários, patrocinados pelo Itaú Cultural, e focalizando figuras originais de vários campos das artes.

Os próximos da lista são o poeta Paulo Leminski (Existo, de Cao Guimarães), o artista plástico Nelson Leirner (Assim é se lhe Parece, de Carla Gallo, que participou do É Tudo Verdade 2011), o dramaturgo e diretor teatral José Celso Martinez Corrêa (Evoé! Retrato de um Antropófago, de Tadeu Jungle e Elaine César), e o cineasta Rogério Sganzerla (Mr. Sganzerla – Os Signos da Luz, de Joel Pizzini). Todos os filmes estreiam até o final do ano, um a cada mês.

Intimidade do músico

Voltando a Itamar Assumpção, o documentário acompanha diversas fases de sua carreira, partindo da rebeldia da canção “Nego Dito” – uma das mais veementes discussões das contradições da negritude e do racismo no Brasil. Ouvindo seus parceiros e amigos, como Alice Ruiz, Suzana Salles, Luiz Chagas, Paulinho Lepetit, Marta Amoroso e Vange Miliet, além de sua mulher e filhas, reconstitui-se traços da intimidade do músico, que morava numa casa com quintal e jardim repleto de orquídeas, no bairro paulistano da Penha.

O filme resolve bem o dilema da ausência de Itamar – morto em 2003 – com a exibição de material de arquivo precioso, em parte considerável vindo de bancos de imagens de emissoras de TV. Nessas imagens, há claros sinais do instinto cênico do músico – como num momento em que ele, sua banda e cantores ficam repentinamente em silêncio, confundindo os técnicos da TV, que não sabem se devem continuar filmando – e sua última apresentação pública, em que é evidente sua fragilidade física e sua consciência de que está dando adeus.

Nem por esses momentos o filme é nostálgico. Faz justiça, na medida do possível, ao legado do músico e, como um bom documento de época, renova uma memória que não deve mesmo ser esquecida.

Completando esse resgate da obra do músico paulista, no ano que vem será lançado um livro com suas poesias, letras e desenhos, muitos deles inéditos.

 

Fonte: Rede Brasil

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