Em toda a América Latina, mulheres lutam contra violência na política

Atualmente, a América Latina é líder global em cargos locais e parlamentares ocupados por mulheres. Mas a jornada para a participação política está repleta de violência crescente e intimidação. Na era do #MeToo, a ONU Mulheres dá espaço às latino-americanas que estão levantando suas vozes e se candidatando a cargos políticos, contra todas as probabilidades.

Leonida Zurita. (Foto: ONU Mulheres/David Villegas Zambrana)

Atualmente, a América Latina é líder global em cargos locais e parlamentares ocupados por mulheres. Mas a jornada para a participação política está repleta de violência crescente e intimidação. Na era do #MeToo, a ONU Mulheres dá espaço às latino-americanas que estão levantando suas vozes e se candidatando a cargos políticos, contra todas as probabilidades.

Esse é o caso da ativista dos direitos das mulheres indígenas no sul do México, Elisa Zepeda Lagunas. Ela experimentou o tipo de violência que calaria as pessoas. Foi arrastada para a praça da cidade e agredida com uma machete, sua casa foi incendiada e seu irmão, morto.

Elisa Zepeda Lagunas (centro). (Foto: Acervo Pessoal)

“Fomos emboscados para impedir o movimento que eu liderava”, explica Zepeda Lagunas, de 34 anos. “Eles me disseram: ‘isso é o que acontece quando você se envolve em assuntos que não lhe competem’. Me torturaram e fizeram coisas que ainda tenho dificuldade em falar”.

Um estudo de 2016 sobre sexismo, assédio e violência contra mulheres no parlamento de 39 países em cinco regiões e 42 parlamentos concluiu que 81,8% das mulheres sofreram violência psicológica; 46,7% temeram por sua segurança e a de sua família; 44,4% receberam ameaças de morte, estupro, espancamento ou sequestro; e 25,5% sofreram violência física.

Zepeda Lagunas, no entanto, não interrompeu seu ativismo. Ela perseverou e buscou um cargo público, sendo eleita a primeira prefeita do município de Eloxochitlán de Flores Magón, no distrito de Teotitlán, estado mexicano de Oaxaca, em 2016. Em julho de 2018, foi eleita para o Congresso de Oaxaca.

“Apesar de todos os riscos, me candidatei porque é uma ótima oportunidade para elevar minha voz a um nível maior, como legisladora, e temos muito trabalho a fazer”, diz ela. “É essencial que eu ocupe esses espaços e conseguir abri-los para outras pessoas”.

Atualmente, na América Latina, as mulheres ocupam 27,3% dos cargos locais como membros do conselho ou vereadores, um aumento de 6,5% nos últimos 10 anos. Mas a jornada não tem sido fácil, já que o assédio, as ameaças e até a morte fazem desta uma escolha de carreira arriscada. Esse cenário afeta até mesmo a Bolívia, onde as mulheres representam 53,1% do parlamento – o terceiro maior percentual no mundo – e 44,1% dos vereadores locais (em 2014).

“Nossa batalha foi conduzida nas ruas, nas prisões, com golpes. Custou muito sangue e muitas mortes”, explica Leonida Zurita, que iniciou sua carreira política como ativista sindicalista antes de se tornar a primeira mulher a liderar a Assembleia Regional em Cochabamba, na Bolívia, em 2015.

Em 2017, ela foi nomeada presidente da Associação de Mulheres Representantes de Departamentos do Estado Plurinacional da Bolívia (AMADBOL), criada com
apoio técnico e financeiro da ONU Mulheres. Zurita diz que a representação melhorou muito para as mulheres, graças à legislação e a uma nova Constituição, mas o assédio e a violência política permanecem.

O assassinato em 2012 da vereadora boliviana Juana Quispe – que apresentou queixas de assédio e estava defendendo uma lei para proteger as mulheres políticas da violência – e o assassinato do vereador Daguimar Rivera Ortiz, alguns meses depois, alimentou as demandas por uma lei para combater a violência contra as mulheres na política.

A lei marco da Bolívia contra o assédio e a violência política contra as mulheres (Lei 243) foi aprovada em 2012, tornando-se a primeira – e ainda a única –
lei autônoma do seu tipo no mundo.

A ONU Mulheres forneceu assistência técnica e financeira para esta legislação, que prevê sentenças de prisão de dois a cinco anos para quem pressionar, perseguir, assediar ou ameaçar uma mulher que exerce funções públicas, e até oito anos de prisão por cometer agressão física, psicológica ou sexual.

Katia Uriona. (Foto: Órgão Eleitoral Plurinacional da Bolívia)

Mas as reformas legais da Bolívia “não mudaram os sistemas patriarcais ou a cultura do machismo da noite para o dia, e a reação contra as mulheres na política foi rápida e generalizada”, explica Katia Uriona, ex-presidente do Tribunal Eleitoral do Estado Plurinacional da Bolívia.

Uma parceira de longa data da ONU Mulheres, ela participou de uma Reunião do Grupo de Especialistas sobre Terminar com a Violência contra as Mulheres na Política, co-organizada pela ONU Mulheres em março de 2018.

Uriona diz que a Lei 243 tem sido inestimável em trazer visibilidade para a questão, embora os desafios permaneçam em sua implementação, já que nenhum caso resultou em uma condenação.

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