Em maio de 1500 Pero Vaz de Caminha, nosso primeiro cronista, escreveu ao rei de Portugal: “Nesta terra se plantando tudo dá.” Hoje sabemos que não é bem assim. Apesar dos esforços de muitos é difícil vicejar jabuticabas do Bem Público, amoras da Igualdade, orquídeas da Não Violência.
Mas temos outras abundâncias. O ritmo que parece brotar em caixinhas de fósforo, a risada rasgada do povo, a piada que já nasce pronta. E a crônica. Para o pessoal que vai prestar o Enem segue a dica: crônica é um gênero da escrita que mora na fronteira entre a literatura e o jornalismo.
Este texto que estou escrevendo é uma crônica. Não é jornalismo, porque não estou relatando fatos. Nem literatura, pois não há personagens e falta novelo. O que a crônica tem? Conversa ao pé do ouvido da leitora e do leitor. Fuxico tecido com palavras.
Rubem Braga (1913-1990) – cronista de caneta cheia, autor da magnífica Ai de ti, Copacabana – disse que escrevia de ouvido. Perfeita definição para os profissionais da crônica. Lembrando que tem gente que toca de ouvido e há até quem viva de ouvido. Traduzindo: sem ler a partitura.
Com as honrosas exceções, o pessoal da Academia e das editoras torce o nariz para a crônica. Supõem que ela é ligeira e desimportante. Café pequeno. Imaginam que o cronista é um romancista ou um poeta frustrado. Ou que a crônica é entradinha antes do prato principal. Custam a acreditar que um escritor pode escolher ser cronista e ponto.
Ligeira a crônica é. Nenhum cronista pretende perscrutar a alma humana, ou escrever um épico. No máximo, a gente consegue flagrar um momento da alma, ou uma manhã da nossa época. Desimportante ela não é, pois faz frases instantâneas de situações do cotidiano. E tira a máscara dos costumes, o que não é pouco. É muito.
Quando escritas com ouvido caprichado, as crônicas alegram. São humildes, e talvez por isso, se aproximam de quem as lê. Não sei se chegam no cérebro, mas no cangote com certeza. É isto, a crônica é um cafuné feito de palavras.
Fonte: Yahoo